Imprensa turca afirma que jornalista saudita foi torturado e decapitado; Pompeo chega a Ancara

Segundo fonte, médico legista começou a cortar o corpo de Khashoggi ainda vivo; jornal afirma que assassinato durou sete minutos

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Atualização:

ANCARA - O jornalista saudita Jamal Khashoggi foi torturado antes de ser "decapitado" no consulado de seu país em Istambul, afirma o jornal Yeni Safak, que cita uma gravação de áudio dos fatos. Khashoggi, crítico do regime saudita, compareceu ao consulado no dia 2 para cumprir os trâmites burocráticos para seu casamento. Desde então não há notícias sobre o seu paradeiro.

Imagem de arquivodo jornalista Jamal Khashoggi Foto: MOHAMMED AL-SHAIKH / AFP

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O jornal Yeni Safak afirma que teve acesso a gravações de áudio e informa que Khashoggi foi torturado durante um interrogatório: os agentes sauditas cortaram os dedos da vítima. Ele foi "decapitado", afirma o jornal, ligado ao governo turco, que não revela como teve acesso às gravações. As autoridades turcas acusam Riad de ter ordenado o assassinato do jornalista a uma equipe enviada ao consulado. O governo saudita nega. 

A publicação da imprensa turca coincide com a chegada do secretário de Estado americano, Mike Pompeo, a Ancara, onde se reuniu com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, para abordar o desaparecimento do jornalista. Ele ofereceu ajuda americana à investigação turca. 

Nesta quarta-feira, 17, o presidente dos EUA, Donald Trump, pediu à Turquia que entregue as gravações que poderiam revelar detalhes do que aconteceu com o jornalista Jamal Khashoggi em sua visita ao Consulado da Arábia Saudita em Istambul. 

Nos últimos dias, alguns meios de comunicação, como o jornal Washington Post, para o qual Khashoggi escrevia, informaram sobre a existência de gravações de áudio e vídeo que provam que o jornalista foi "interrogado, torturado e assassinado" dentro do consulado. O seu corpo teria sido esquartejado.

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Esta é a primeira vez que uma publicação turca afirma que teve acesso às gravações. O jornal divulga com frequência vazamentos destinados a apoiar a linha do governo turco, mas também foram documentados vários artigos manipulados ou fabricados, incluindo gravações de áudio falsas.

De acordo com o Yeni Safak, o cônsul saudita Mohammad Al Otaibi afirma em uma das gravações: "Façam isto lá fora. Vocês vão me provocar problemas". Um homem não identificado responde: "Se você quiser continuar vivo quando voltar à Arábia Saudita, fica quieto". Al Otaibi deixou Istambul na terça-feira.

O portal digital Middle East Eye afirma, com base em uma fonte que teve acesso à gravação de áudio dos últimos momentos do jornalista, que Khashoggi foi levado para o escritório do cônsul. De acordo com a fonte, "não houve uma tentativa de interrogatório. Vieram para matá-lo" e o próprio cônsul foi retirado do local.

Um médico legista, identificado como Salah al-Tubaigy e que integrava a equipe de 15 sauditas enviados por Riad a Istambul no mesmo dia, de acordo com a imprensa, começou a cortar o corpo de Khashoggi ainda vivo, segundo a fonte do Middle East Eye.

Enquanto esquartejava o jornalista, Tubaigy começou a ouvir música com fones de ouvido. "Quando faço este trabalho, escuto música. Vocês também deveriam fazer isto" afirma na gravação, segundo a fonte. O assassinato durou sete minutos, informa o Middle East Eye.

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Uma fonte ouvida pelo Middle East Eye, site especializado em Oriente Médio, disse que Khashoggi apenas foi capturado na presença do diplomata, que teria saído da sala. A tortura teria durado 7 minutos. Ao perceber que seria morto, Khashoggi teria gritado em desespero, a ponto de ser ouvido por testemunhas no andar inferior. 

Durante o interrogatório, seus dedos foram decepados, disse um funcionário turco ouvido pelo New York Times. Os urros só teriam parado após uma substância desconhecida ser injetada no jornalista. O corpo de Khashoggi começou a ser cortado quando ele ainda estava vivo, segundo os turcos. 

A imprensa americana informou que a Arábia Saudita cogitava reconhecer a morte do jornalista durante um interrogatório no consulado e atribuir o fato a "agentes fora de controle". 

As autoridades turcas revistaram na segunda-feira à noite o consulado e a polícia afirma ter encontrado evidências de que o jornalista foi assassinado no local, segundo fontes do governo.

A residência do cônsul deveria ter sido inspecionada na terça-feira, mas a operação foi adiada para esta quarta-feira, depois que as autoridades sauditas alegaram a presença de sua família no edifício, de acordo com o chanceler turco, Mevlut Cavusoglu. O cônsul viajou de Istambul para Riad na terça-feira.

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Um dos assassinos do grupo de 15 sauditas enviados a Istambul para eliminar Khashoggi seria o doutor Salah al-Tubaigy, especialista em autópsias. A fonte turca afirmou que, enquanto conduzia o desmembramento, Tubaigy teria posto fones de ouvido. “Quando faço este trabalho, escuto música. Vocês também deveriam”, teria dito o médico no áudio gravado.

Tubaigy é um dos 9 suspeitos já reconhecidos, dentre os 15 do grupo, por uma investigação independente realizada pelo New York Times. O jornal mostrou que os suspeitos têm ligação direta com o príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman (conhecido pelas iniciais MBS), o que afasta a possibilidade de ser um grupo de insubordinados, agindo por conta própria, como foi cogitado por Trump.

Um dos suspeitos é uma companhia frequente de MBS e já foi visto em desembarques ao lado dele em Paris e Madri, além de ter sido fotografado fazendo sua segurança em visitas a Houston, Boston e à ONU. Todos os identificados trabalham para o serviço de segurança, as Forças Armadas ou outros órgãos do governo saudita. 

Essas evidências enfraquecem a versão de que Khashoggi morreu em uma operação não autorizada pelo príncipe herdeiro. Elas também tornam mais difícil para a Casa Branca e o Congresso americano aceitarem tal explicação. A Arábia Saudita é, ao lado de Israel, o principal aliado americano no Oriente Médio.

Inicialmente, o príncipe herdeiro e seu pai, o rei Salman, negaram envolvimento no caso, afirmando que Khashoggi deixara o consulado por conta própria. Trump, que ameaçou punir a Arábia Saudita quando surgiu a notícia, há duas semanas, tem agora comprado a versão dos sauditas e insiste que o governo americano deve conhecer os fatos antes de tomar qualquer atitude contra o aliado. / NYT, W.POST, AFP e EFE

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