ENVIADO ESPECIAL A NOVA DÉLHI - Minutos antes de um avião de carreira da Air India tocar o solo numa tarde de domingo, em setembro, os passageiros do voo AI-522 entre Nova Délhi e Hyderabad ouviram um recado pouco usual no sistema de som da aeronave. Além dos avisos protocolares de afivelar os cintos e do tempo faltando para aterrissagem, o chefe de cabine transmitiu uma mensagem especial do líder político do país. O primeiro-ministro Narendra Modi apelava para que adotassem um “estilo de vida mais consciente com o meio ambiente” e pedia que mudassem seus hábitos e poupassem água. O recado faz todo o sentido.
Considerada desde abril a nação mais populosa do mundo, com 1,428 bilhão de pessoas, a Índia está em vias de se tornar a terceira maior economia do planeta, mas já ocupa essa posição no ranking que qualquer país optaria por não figurar: o dos maiores poluidores do mundo. A Índia está atrás apenas da China, o maior emissor de gases de efeito estufa, e dos Estados Unidos.
Nas próximas cinco décadas, o país vai permanecer na vitrine e será ainda mais pressionado nas discussões da mudança climática por causa de uma conjunção de fatores que, governantes e especialistas concordam, levará à necessidade de usar mais recursos naturais e prover alimentos, energia e infraestrutura, entre outros.
Até 2064, o crescimento populacional da Índia deverá atingir o pico de 1,7 bilhão de pessoas, conforme as Nações Unidas. A ocupação do território também passará por alterações. A Índia ainda é eminentemente rural. Cerca de 65% dos habitantes, 908 milhões de pessoas, vivem no interior. Mas a população morando nas cidades vai atingir 675 milhões de pessoas em 2035, segundo a ONU.
Além disso, projeções de diferentes instituições financeiras apontam que a Índia poderá passar de quinta para terceira maior economia do planeta, até 2030, com PIB de US$ 7,3 trilhões, estima a S&P. Já o Fundo Monetário Internacional (FMI) aponta um crescimento médio de 6% ao ano, até 2028. Indo mais adiante, o Goldman Sachs prevê que a economia indiana será a segunda maior do mundo, atrás apenas da China, em 2075.
Há dois anos, o primeiro-ministro Narendra Modi comprometeu-se na Cúpula do Clima (COP 26) das Nações Unidas a zerar a emissão de gases estufa até 2070, um prazo vinte anos mais longo que o ambicionado. Ainda, afirmou que trabalharia para atingir 50% da capacidade instalada de geração de energia elétrica, não dependente de combustíveis fósseis, em 2030.
O Acordo de Paris, assinado em 2015, prevê que as nações se comprometam, a partir de metas autodeterminadas, com a redução da emissão de gases. O objetivo é restringir o aumento da temperatura global a menos de 2ºC acima do nível pré-industrial, sendo preferencialmente não mais do que 1,5ºC.
O desempenho da Índia no cumprimento de seus compromissos pode definir se o objetivo será ou não alcançado. O país é considerado fundamental para evitar o aquecimento global e os eventos climáticos extremos, com os quais vem sofrendo, como a onda de calor que matou mais de 100 pessoas em junho.
“Embora a contribuição histórica da Índia para emissão de gases de efeito de estufa na atmosfera seja pequena, o país é atualmente um grande emissor, com uma demanda crescente de energia. Se esta energia continuar a ser fornecida a partir de combustíveis fósseis, a meta de 2ºC se tornará inatingível. O progresso da Índia na redução das emissões é tão crítico como o de outros grandes emissores, como a China, os EUA e a União Europeia”, afirmou ao Estadão Ashish Fernandes, CEO da Climate Risk Horizons, uma consultoria sediada em Bengaluru e especializada na análise de efeitos da crise climática.
“A Índia já é duramente atingida por secas, inundações e ondas de calor, que afetam mais as zonas mais pobres. Portanto, é do interesse indiano que as mudanças climáticas sejam controladas. O país procura desempenhar o seu papel, ao mesmo tempo que exige que outros grandes emissores façam a sua parte, proporcionalmente à sua responsabilidade histórico. É impossível dizer se a meta para 2070 será alcançada hoje. No entanto, existem certas tendências que não vão na direção certa.”
A Índia se mantém, desde 2019, como o terceiro maior emissor de gases estufa do mundo. Foram 3.38 Gt de CO2e (dióxido de carbono equivalente), atrás da China (12.09 Gt de CO2e) e dos Estados Unidos (5.82 Gt CO2e), considerando volume total, naquele ano. O país costuma cair em rankings quando as emissões são calculadas per capita, por ter a maior população do mundo. Nesse caso, a Índia seria a décima colocada, tendo emitido 2.47t de CO2e por pessoa. Os EUA lideram essa forma de cálculo, com 17.72t de CO2e por pessoa. Os dados são da plataforma de monitoramento Climate Watch.
Carvão
Nos últimos anos, a diplomacia indiana trabalhou para frear, na Cúpula do Clima das Nações Unidas, a ambição de “eliminar” gradualmente o uso de combustíveis fósseis, ao lado da China. Os dois governos aceitam falar somente em “reduzir” o uso do carvão, o que gerou uma série de críticas internacionais.
A Índia depende da queima de carvão para geração de eletricidade e tem planos de expandir suas térmicas até 2030. A intenção do Ministério de Energia é agregar mais 56 GW por meio de térmicas a carvão. A Índia tem 285 delas ativas. O país é atualmente também o terceiro maior produtor e consumidor de energia elétrica do mundo.
O país é o segundo maior produtor de carvão, atrás somente da China, e à frente da Indonésia. A China responde por 53% da produção mundial, enquanto a Índia tem 9%. No ano passado a produção global de carvão bateu recorde de 8,6 bilhões de toneladas.
A estatal Coal India Ltd aumentou em 2022 sua produção em cerca de 12%. A empresa responde por cerca de 80% da produção nacional. Em março, os indianos produziram pela primeira vez mais de 100 milhões de toneladas num único mês. O governo quer chegar a 1 bilhão de toneladas ao longo de 2023. O objetivo é reduzir a dependência da importação e evitar o desabastecimento, enquanto a demanda cresce.
Metade da energia elétrica gerada na Índia vem da queima do carvão. Um estudo recente da Agência Internacional de Energia prevê que os dois gigantes asiáticos serão responsáveis, neste ano, por 70% do consumo de energia obtida pela queima do carvão em todo o mundo.
Para Ashish Fernandes, a Índia não consegue ainda abandonar os combustíveis fósseis, sobretudo o carvão, mas começa a evoluir em setores como o transporte e a eletricidade. “O primeiro passo é começar a reduzir gradualmente os combustíveis fósseis em áreas onde existem alternativas comprovadas - notadamente eletricidade e transportes. Isto poderá ser feito na próxima década, à medida que as tecnologias amadurecerem para setores mais difíceis de reduzir, como a indústria pesada e os fertilizantes”, opina o especialista.
‘Telhado Solar’
O governo Narendra Modi também se notabilizou por uma rápida implementação de fontes de energia renováveis, reconhecida por especialistas e diplomatas. Em especial a solar, que é a principal fonte alternativa na Índia, e chamou a atenção pelos enormes campos de painéis fotovoltaicos, em áreas desérticas e zonas urbanas.
O ritmo de expansão, no entanto, pode não ser o suficiente para que o governo alcance a meta de produzir 500 GW de energia renovável em 2030. O patamar é considerado um “enorme desafio”. Especialistas dizem que a Índia teria de duplicar o ritmo de adição de energias renováveis para chegar lá.
Por meio de um programa específico, o Telhado Solar (Rooftop Solar, em inglês), o governo Modi subsidia a instalação de placas nos telhados de residências em todo o país. O mecanismo de financiamento foi criado em 2015 e ganhou uma segunda fase, em 2019. O orçamento é de U$ 1,6 bilhão.
O dinheiro cai direto na conta das pessoas para instalação de painéis residenciais. O benefício de R$ 850 por kW pode ser pleiteado por meio de um site oficial.
O programa tinha o objetivo de atingir 40 GW de energia solar ao fim de 2022, mas ficou longe de alcançar a meta. Um comitê de monitoramento parlamentar apontou, entre outras causas, falta de informações claras para massificar o programa e incertezas sobre os custos para as pessoas.
O programa foi então postergado até 2026, embora sem mais verba prevista. Neste ano, o país conseguiu alcançar capacidade acumulada de geração de 9,6 GW nos telhados, segundo relatório da consultoria Mercom India.
“O programa solar em grande escala vem progredindo bem, mas precisa fazer ainda melhor. A Índia precisa instalar cerca de 45 GW de energia renovável todos os anos para cumprir a sua meta para 2030. No ano passado conseguiu cerca de 15 GW, este ano vai conseguir um pouco mais que isso. No entanto, a energia solar distribuída e de pequena escala nos telhados não está indo tão bem e precisamos urgentemente que esse programa decole”, diz Fernandes.
Além dos telhados, a Índia vem instalando parques com painéis solares sobre desertos, criando enormes estruturas, como o Bhadla, no Rajastão. A intenção do governo é espalhar 50 grandes parques de ao menos 500 MW para aproveitar a alta incidência solar.
A meta é agregar ao país a capacidade de gerar 38 GW até 2026. Até agora, 11 parques foram concluídos e 7 parcialmente entregues. Em cada Estado indiano, ao menos uma cidade está sendo preparada para ser totalmente abastecida por energias renováveis, sobretudo a solar.
Segundo o governo, a capacidade de geração de energia solar da Índia passou, em cinco anos, de 21,6 GW para 70 GW e pode ser considerada hoje a quarta potência solar global.
Para Fernandes, a plena implementação das fontes renováveis enfrentará dificuldades enquanto os recursos públicos continuarem a ser investidos em carvão, um combustível sujo cujo mercado é controlado por uma estatal.
“A Índia não precisa de novas centrais a carvão - a crescente demanda de energia pode ser mais bem satisfeita através de renováveis. O carvão já não é financeiramente competitivo com as energias renováveis. A construção destas centrais irá atrelar os consumidores indianos a uma eletricidade de custo mais elevado e irá afetar o desenvolvimento da indústria das energias renováveis, porque as novas centrais a carvão operam dentro de um sistema regulamentado e não estão sujeitas ao mercado. O impulso renovado para construir mais centrais a carvão é uma séria ameaça, não apenas para o clima global, mas também para as próprias metas da Índia em matéria de energias renováveis. "
Poluição do ar
Em 2019, o governo decidiu fechar de vez a central termoelétrica de Rajghat e instalar no lugar um parque de placas fotovoltaicas, com objetivo de gerar energia solar. A usina começou a ser montada na década de 1950 e chegou ao seu auge no fim dos anos 1980. Em 2015, o governo decidiu parar a geração de energia por causa do impacto da queima do carvão em Délhi. Hoje a central é um grande esqueleto de metal, conhecido como fábrica mal assombrada, à margem do rio Yamuna.
O ranking das cidades das 100 cidades mais poluídas do mundo, elaborado pela empresa suíça IQAir com base na qualidade do ar, tem nada menos do que 65 metrópoles indianas. Délhi costuma figurar no topo das listas anualmente.
Na semana passada, cidades metropolitanas sofreram com um nevoeiro cinza tóxico. A capital indiana registou concentrações de partículas PM 2,5, de até 416 microgramas por metro cúbico de ar, nível de poluição mais de trinta vezes superior ao limite estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
No Sudeste Asiático, diversas cidades costumam ser afetadas pelos efeitos da queima da palha após a colheita do arroz. A prática é considerada um vilão para a qualidade do ar.
Em Délhi, o problema se agrava pela concentração de atividades industriais e pelo tráfego congestionado de veículos antigos e movidos a combustão, adulteração de combustível. A situação piorou com o festival das luzes, o Diwali, quando ocorre intensa a queima de fogos de artifício.
Autoridades de Délhi restringiram desde o início de novembro a circulação de ônibus de transporte público na capital, afetando a frota dos Estados vizinhos com permissão para rodar.
Na capital indiana, o transporte público já é feito principalmente com veículos movidos por gás natural - sejam taxis, ônibus ou tuk tuks - e também elétricos. Autoridades públicas pressionam agora por uma transição nos Estados vizinhos, como Haryana e Uttar Pradesh, que ainda têm frotas a diesel.
Por causa da péssima qualidade do ar, comitês de controle da poluição estabeleceram um plano de ação com 11 tópicos, que incluem incentivo ao uso de gás natural e eletrificação do transporte público coletivo, aumento no preço de estacionamentos para desencentivar o uso de automóveis privados, limpeza e aspiração diária de estradas, mobilizar pessoal para facilitar o fluxo e evitar congestionamentos, e distribuição de aquecedores elétricos no inverno evitar o uso de fogueiras improvisadas com a queixa de lixo.
Etanol
Ainda no transporte, o governo Narendra Modi lançou durante o G-20 uma aliança global para fomentar o uso de biocombustíveis, com destaque para o etanol. O Brasil participa da iniciativa, por dominar a produção e a tecnologia dos veículos flex. A ideia é criar um mercado global, e transformar o produto realmente em uma commodity.
Os EUA respondem por 55% da produção mundial de etanol, segundo a RFA (Associação de Combustíveis Renováveis). Na vice-liderança do ranking, o Brasil produz o equivalente a 27%. A Índia é a quinta colocada, com 3%, atrás da UE, com 4,8% e da China, com 3,1%.
A ideia de investir nesse combustível alternativo é mais uma baseada na busca de Modi pela autossuficiência energética, e pelo fato de o etanol ser menos poluente do que a gasolina.
Rios sagrados, mas poluídos
A Índia possui somente 4% dos recursos hídricos mundiais. Boa parte da população urbana e rural vive sem água potável e encanada. O saneamento básico é deficitário.
Uma recomendação básica a qualquer turista no país é beber somente água engarrafada - em geral, é muito mais fácil encontrar garrafas de água tratada do que mineral.
A escassez de água na região está na raiz dos conflitos pelo controle da Caxemira, que opõe a Índia e o Paquistão. Nas montanhas do Himalaia nascem os principais rios que abastecem os dois países.
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Cerca de 600 milhões de indianos enfrentam grave escassez de água. A estimativa é que a falta de água, de saneamento básico e de hábitos de higiene provoquem a morte de 400 mil pessoas por ano, na Índia, sendo quase 200 mil por causa da água poluída.
Somente um terço dos resíduos líquidos gerados na Índia passa por tratamento em estações urbanas, o que resulta no escoamento de esgoto in natura para rios, lagos e lagoas, além da contaminação de lençóis freáticos. O governo reconhece que 70% das águas no país estão contaminadas.
Isso gera custos para a saúde estimados entre 6 e 8 bilhões de dólares por ano. A cada quatro indianos, três sofrem consequências da poluição da água, o que favorece a proliferação de doenças como diarreia e o cólera.
Os rios e lençóis freáticos, além do próprio solo, são contaminados ainda pelos dejetos humanos. Dos 418 milhões de pessoas que ainda defecam a céu aberto, em todo o mundo, 157 milhões vivem na Índia, o equivalente a 37,5% do total. Os dados são do painel Wash, das Nações Unidas, que monitoram acesso a água potável, higiene e saneamento básico.
Os indicadores já foram piores no país. Em 2014, o governo lançou a missão Índia Limpa, para prover sanitários comunitários ou privativos nas casas das pessoas e tentar erradicar o hábito de defecar a céu aberto.
Desde 2019, o governo Modi alega que o país acabou com o problema. Mais de 100 milhões de sanitários foram construídos, beneficiando 600 milhões de pessoas. Mas a questão persiste, como mostrou o Estadão, seja por razões culturais, pela falta de manutenção dos banheiros ou mesmo pela escassez em áreas pobres urbanas e no interior. Tanto que, em 2020, o governo iniciou uma segunda fase do programa, voltada para mudar os costumes e instalar equipamentos para o tratamento adequado dos resíduos sólidos e líquidos.
Além disso, alguns dos principais rios do país sofrem com despejo de esgoto e são contaminados até por razões religiosas. É o caso do famoso Ganges, que viu corpos serem enterrados nas suas margens na pandemia da covid-19, e do Yamuna, seu maior afluente. Os dois cursos d’água são considerados sagrados no hinduísmo.
As águas turvas e poluídas do rio atraem pessoas para rituais funerais e cerimônias religiosas de purificação. As evidências ficam jogadas por todos os lados, com imagens de deidades, de animais e mensagens espalhadas na mata ciliar degradada e no espelho d’água.
A Autoridade de Desenvolvimento de Délhi criou um projeto de recuperação da vegetação no rio, um parque de 197 hectares, que se espalha na margem do Yamuna, mas acaba alagado de tempos em tempos. Todo o material religioso depositado na margem, assim como restos mortais, pode ser carregado para o curso do rio na época das cheias e, especialmente, com as enchentes provocadas pelas monções.
O governo indiano convidou diplomatas de 11 países a visitarem o projeto Asita East, com objetivo de mostrar os esforços para recuperar a várzea do rio, a biodiversidade e a flora.
Lixo
Ao lado do rio Yamuna, funciona uma central informal de reciclagem, com instalações improvisadas e uma comunidade morando no local. Cerca de 20 catadores coletam lixo pela cidade, de forma autônoma, e levam para separar o material com valor econômico, como latas de alumínio e garrafas de plástico ou vidro.
O catador Mohamed Bashir, de 44 anos, disse que eles não recebem nenhum tipo de apoio oficial e que a cobrança de impostos sobre bens e serviços, o GST, dificultou seu trabalho. Ele relatou que ganha por dia de trabalho 350 rúpias - cerca de R$ 20.
“A administração entregou a coleta de lixo para grandes empresas. Mas eles não têm nem um grão aqui. Somos nós que trazemos o lixo diariamente, separamos e entregamos para reciclagem, então somos os únicos. Temos pessoas que vão aos shoppings, passam nas estradas e nos bairros de porta em porta coletando o lixo”, disse Bashir, queixando-se do governo. “Não temos nenhuma ajuda do governo, nada nesse sentido. O governo fecha os olhos para os muçulmanos. Os muçulmanos são considerados pessoas de segunda categoria, por isso nem dão emprego a eles. Temos que fazer alguma coisa para ganhar a vida, então ganhamos a vida catando lixo na estrada.”
O governo indiano estima que o país gere 62 milhões de toneladas de lixo anualmente e que o volume cresça, a cada ano, 4%. Resíduos sólidos domésticos, plástico e eletrônicos são os principais componentes.
Diariamente, são 145 mil toneladas de lixo sólido urbano. A coleta de porta a porta chega a 67% das zonas urbanas. Somente 23% do total do lixo é processado e tratado, enquanto os 72% restantes vão para aterros sanitários.
Em 2016, o governo mudou a legislação sobre a gestão de resíduos sólidos. Também lançou a versão urbana da Missão Índia Limpa e pretende mudar comportamentos para introduzir a cultura da reciclagem, compostagem e aproveitamento de resíduos na geração de energia e riqueza, além de atrair empresas privadas para atuar no setor.
Diplomacia do Tigre
Se enfrenta problemas ambientais em zonas urbanas, a Índia também sofre com a perda florestas naturais. Elas continuam a ser derrubadas, segundo ambientalistas, por causa da pressão por mais cultivo agrícola. Grandes projetos de infraestrutura, que o país também carece, levaram ao enfraquecimento da legislação ambiental, segundo especialistas.
O governo tem, porém, algumas iniciativas de sucesso na conservação da natureza, em parceria com organizações não governamentais, como WWF e ZSL. Uma delas protege um ícone de biodiversidade, o tigre-de-bengala, e virou instrumento da diplomacia para Modi. As iniciativas têm mais de 50 anos.
Na última cúpula do Brics, o primeiro-ministro indiano projetou seu programa de preservação dos tigres ameaçados e sugeriu que, como os outros quatro países do bloco (Brasil, Rússia, China e África do Sul) possuem ao menos uma espécie nativa de grande felino (onça, tigre, leopardo e leão) deveriam estabelecer um programa conjunto de cooperação.
“Um grande número de grandes felinos de diferentes espécies é encontrado em todos os cinco países do Brics. No âmbito da Aliança Internacional dos Grandes Felinos, podemos fazer esforços conjuntos para a sua proteção”, sugeriu Modi.
Neste ano, o país celebrou um aumento recorde na população de tigres. Segundo dados da Autoridade Nacional de Conservação dos Tigres (NTCA), a estimativa oficial é que a Índia tenha 3.682 tigres em suas reservas naturais, por todo o país. Em 2006, eram 1.411.
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Os animais são monitorados em 53 reservas florestais com auxílio de câmeras e rastreadores, numa área de 75 mil quilômetros quadrados. A taxa anual de crescimento da população é de 6% entre 2006 e 2022.
Apesar dos números positivos, o órgão alerta que a população tem se comportado de maneira distinta e não está uniformemente espalhada pela Índia. Em Odisha, por exemplo, a caça ameaça a extinção dos tigres. Isso pode ocorrer porque a maioria dos animais vive em pequenas áreas isoladas umas das outras.
“Um dos principais desafios é alinhar as aspirações do desenvolvimento econômico em grande escala e ao mesmo tempo salvaguardar as florestas e a sua vida selvagem e mitigar o conflito entre humanos e tigres. Outra ameaça silenciosa são os impactos das alterações climáticas nos habitats e a perda da qualidade de vida nas florestas”, observa a NTCA, em relatório. “Outro desafio significativo é o comércio ilegal de vida selvagem. Até embora a caça seja ilegal, a procura por produtos de tigre continua elevada, e os caçadores continuam a matar tigres para obter lucro. O aumento da população de tigres é um sinal positivo, mas não devemos ser complacentes e prosseguir os nossos esforços para garantir a sobrevivência deste magnífico animal e salvaguardar os nossos ecossistemas florestais na sua totalidade.”
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