O Irã e os Estados Unidos realizaram uma troca de prisioneiros nesta segunda-feira, 18, depois que quase US$ 6 bilhões em ativos iranianos que estavam congelados na Coreia do Sul chegaram ao Catar, um fator importante para o acordo, segundo disseram autoridades.
Os americanos que estavam detidos no Irã decolaram em um avião de Teerã momento em que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden e Ebrahim Raisi, o presidente do Irã, devem participar da reunião anual de líderes mundiais da Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York, na terça-feira, 19. Os cinco americanos voaram para Doha, capital do Catar.
Apesar do acordo, é quase certo que as tensões permanecerão elevadas entre os EUA e o Irã, que estão envolvidos em várias disputas, incluindo sobre o programa nuclear de Teerã. O país persa diz que o programa é pacífico, mas agora enriquece urânio em níveis elevados.
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Nasser Kanaani, reconheceu que a troca ocorreria na segunda-feira. Ele disse que os ativos congelados que estavam em poder da Coreia do Sul haviam sido transferidos para o Qatar.
Declarações
Em um comunicado, Biden disse que “cinco americanos inocentes que foram presos no Irã estão finalmente voltando para casa”.
Ele acrescentou que os prisioneiros “em breve se reunirão com seus entes queridos – depois de suportar anos de agonia, incerteza e sofrimento. Estou grato aos nossos parceiros nacionais e estrangeiros pelos seus esforços incansáveis para nos ajudar a alcançar este resultado, incluindo os governos do Qatar, Omã, Suíça e Coreia do Sul.”
Siamak Namazi, um dos cinco americanos libertados, afirmou em um comunicado que sonhava com a liberdade há quase oito anos, enquanto experimentava “tormento” durante 2.898 dias de prisão.
“Minha sincera gratidão ao presidente Biden e sua administração, que tiveram que tomar algumas decisões incrivelmente difíceis para nos resgatar”, disse ele no comunicado. “Obrigado, presidente Biden, por colocar a vida dos cidadãos americanos acima da política. Obrigado por acabar com este pesadelo. Obrigado por nos trazer para casa.”
Os americanos farão um breve exame médico em Doha antes de embarcar em um avião do governo dos EUA de volta a Washington, disseram autoridades.
Já Kanaani, porta-voz do ministério das Relações Exteriores do Irã, fez seus comentários durante uma entrevista coletiva transmitida pela televisão estatal, mas a transmissão foi cortada imediatamente após as suas declarações.
“Felizmente, os ativos congelados do Irã na Coreia do Sul foram liberados e, se Deus quiser, hoje os ativos começarão a ser totalmente controlados pelo governo e pela nação”, disse Kanaani.
Mohammad Reza Farzin, chefe do Banco Central do Irão, apareceu mais tarde na televisão estatal para reconhecer o recebimento de mais de 5,5 mil milhões de euros – 5,9 mil milhões de dólares – em contas no Catar. Meses atrás, o Irã previa receber até 7 mil milhões de dólares.
A troca planeada desenrolou-se no meio de uma grande escalada militar americana no Golfo Pérsico, com a possibilidade de tropas norte-americanas embarcarem e protegerem navios comerciais no Estreito de Ormuz, por onde passam 20% de todas as remessas de petróleo.
“Esta ação foi tomada estritamente para atender a uma necessidade humanitária”, disse o presidente iraniano a jornalistas em Nova York na segunda-feira. Ele acrescentou: “Esses eram fundos que pertenciam ao povo do Irã”.
Críticas
O acordo também já expôs Biden a novas críticas de republicanos e outros que dizem que a administração está contribuindo para uma melhora da economia iraniana num momento em que o Irã representa uma ameaça crescente às tropas americanas e aos aliados do Oriente Médio. Isso também poderia ter implicações em sua campanha de reeleição.
Washington afirmou que a troca incluiu Siamak Namazi, que foi detido em 2015 e posteriormente condenado a 10 anos de prisão por acusações de espionagem; Emad Sharghi, um empresário condenado a 10 anos; e Morad Tahbaz, um britânico-americano de ascendência iraniana que foi preso em 2018 e também recebeu uma sentença de 10 anos.
Até agora, as autoridades norte-americanas recusaram-se a identificar o quarto e o quinto prisioneiros.
O dinheiro que o país persa irá receber representa um pagamento que a Coreia do Sul devia ao Irã, mas não pagou, pelo petróleo adquirido antes dos Estados Unidos aplicarem sanções as transações, em 2019.
Os EUA sustentam que, uma vez no Catar, o dinheiro será mantido em contas restritas e só poderá ser utilizado para bens humanitários, como medicamentos e alimentos. Essas transações são atualmente permitidas pelas sanções americanas que visam o Irã devido ao seu programa nuclear.
Histórico
O Irã e os EUA têm um histórico de trocas de prisioneiros que remonta à tomada do poder da Embaixada dos EUA em 1979. O seu mais recente grande debate aconteceu em 2016, quando o Irã chegou a um acordo com as potências mundiais para restringir o seu programa nuclear em troca de um alívio das sanções.
Quatro prisioneiros americanos, incluindo o jornalista do Washington Post Jason Rezaian, regressaram do Irã, e vários iranianos nos EUA obtiveram a liberdade. Nesse mesmo dia, a administração do então presidente americano Barack Obama transportou por via aérea 400 milhões de dólares em dinheiro para Teerã.
O Ocidente acusa o Irã de utilizar prisioneiros estrangeiros – incluindo aqueles com dupla nacionalidade – como moeda de troca, uma alegação que Teerã rejeita.
Outras negociações para a troca de prisioneiros não foram concluídas depois que o então presidente Donald Trump retirou unilateralmente os Estados Unidos do acordo nuclear em 2018.
Saiba mais sobre o Irã
Programa nuclear
O chefe do órgão de vigilância nuclear das Nações Unidas tem alertado que o Irã possui agora urânio enriquecido suficiente para produzir “várias” bombas, e que provavelmente seriam necessários alguns meses para construir uma arma.
O país persa afirma que o seu programa nuclear é pacífico e a comunidade de inteligência dos EUA manteve a sua avaliação de que o Irã não está desenvolvendo uma bomba atómica.
O Irã realizou medidas nos últimos meses para resolver algumas questões com a Agência Internacional de Energia Atómica. Mas os avanços no seu programa levaram a receios de uma conflagração regional mais ampla, uma vez que Israel, também uma potência nuclear, disse que não permitiria que Teerã desenvolvesse uma bomba./AP e NY Times
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