BASE AÉREA KEFLAVIK, Islândia — O general mais graduado do Pentágono caminhou até um avião de vigilância P-8 Poseidon aqui na manhã de quinta feira, embarcando pouco antes de uma chuva fria virar neve. A aeronave rugiu e decolou sobrevoando campos escarpados de lava preta antes de seguir sobre o Oceano Atlântico Norte. As forças americanas a bordo o guiaram por sua missão: inspecionar as águas geladas em busca de submarinos russos.
A rara visita do presidente do Estado-Maior Conjunto, general Charles Q. Brown Jr., ocorre em um momento em que as forças dos Estados Unidos observaram um aumento na atividade dos submarinos russos no Atlântico. O general Christopher Cavoli, chefe do Comando Europeu dos EUA, disse à Comissão de Serviços Armados da Câmara no ano passado que as patrulhas russas estão “em um nível mais alto do que o visto em anos”.
Autoridades dos EUA e da Islândia estavam reticentes em discutir a recente atividade dos submarinos russos, mas a visita de Brown ressaltou que as operações dos EUA aqui evoluíram por causa da guerra na Ucrânia, a milhares de quilômetros de distância, disseram autoridades dos EUA e da Islândia.
Embora a Islândia tenha uma tradição pacifista e nenhuma força militar, ela é membro da Otan desde a fundação da aliança após a 2.ª Guerra e tem feito cada vez mais parcerias com os EUA desde a invasão russa em larga escala em fevereiro de 2022, hospedando um esquadrão P-8 em uma base rotativa e recebendo visitas de caças e bombardeiros furtivos B-2 invisíveis ao radar.
A Islândia prometeu gastar anualmente 4 bilhões em coroas islandesas, ou cerca de US$ 30 milhões, até 2028 para fornecer à Ucrânia uma mistura de apoio militar e humanitário, e também assinou um esforço liderado pela República Tcheca para comprar munição para as forças ucranianas.
Brown, falando com o pessoal da Marinha reunido em um hangar pouco antes de seu voo, disse que estava examinando o comportamento da Rússia não apenas na Ucrânia, mas em lugares tão distantes quanto a América do Sul.
“A ideia é sermos tão bons no que fazemos que, todos os dias, nosso adversário acorde e diga: ‘Hoje, não’”, disse Brown. “E se um dia eles disserem que chegou a hora, a ideia é sermos o pior pesadelo deles.”
A ministra das Relações Exteriores da Islândia, Thordis Kolbrun Reykfjord Gylfadottir, disse em uma entrevista que seu país está pronto para assumir “mais responsabilidade” na aliança. Ter forças dos EUA na Islândia “não tem sido fácil, politicamente, ao longo das décadas”, disse ela, mas o governo precisa “ficar firme” e explicar aos seus cidadãos o que significa ser um aliado confiável.
Leia também
“Mesmo que não tenhamos um exército permanente, definitivamente temos um papel a desempenhar”, disse ela. “Eu não diria que há um limite em algum lugar no futuro em relação a até onde iremos. Depende apenas dos desenvolvimentos ao nosso redor.”
Gylfadottir disse que, apesar do foco de Moscou na guerra na Ucrânia, a Rússia mantém capacidades submarinas significativas no Ártico: “Temos que estar vigilantes”.
A ministra deixou a porta aberta para a transferência de um número maior de forças dos EUA para a Islândia no futuro. “O que nos perguntamos não é apenas se isso torna a Islândia mais segura e o público islandês mais seguro, mas também qual é a nossa responsabilidade enquanto ilha entre a Europa e a América do Norte?”, ela disse.
As forças dos EUA foram mobilizadas na Islândia pela primeira vez em 1941, substituindo as tropas britânicas que desembarcaram um ano antes em um esforço para evitar que o país caísse nas mãos dos nazistas. Dez anos depois, quando a Guerra Fria começou, Washington e Reykjavik assinaram um acordo bilateral que exigia que as tropas dos EUA fossem mantidas em Keflavik principalmente para realizar defesa aérea e vigilância marítima no Atlântico Norte.
O acordo se manteve em grande parte até 2006, quando o governo do presidente George W. Bush, citando ameaças em outras partes do mundo, decidiu retirar todas as forças dos EUA da Islândia. Na época, havia cerca de 1.200 soldados dos EUA, quatro caças e um punhado de helicópteros baseados lá, informou o Washington Post na época. A medida foi criticada pelo embaixador da Islândia nos Estados Unidos, Helgi Agustsson, que disse que a Islândia estava “profundamente decepcionada”.
Em 2016, o governo Obama assinou um novo acordo com a Islândia que permitiu “aumento de forças rotativas conforme necessário, incluindo capacidades de combate a submarinos, mas sem se limitar a elas”. A Islândia também concordou em permitir que o governo dos EUA fizesse atualizações na base aérea, no canto sudoeste da ilha. A Força Aérea dos EUA anunciou vários projetos de construção de aeródromos no valor coletivo de US$ 38 milhões em 2020, incluindo uma expansão dos pátios de estacionamento e melhorias em uma plataforma de carga para manuseio de explosivos.
Uma autoridade de defesa islandesa, falando sob condição de anonimato por causa da sensibilidade do assunto, observou um lado positivo na saída abrupta das forças dos EUA em 2006.
“Tivemos que assumir muitas das responsabilidades muito rapidamente, mas acho que aprendemos muito durante esse processo a respeito do papel que podemos desempenhar”, disse a autoridade de defesa. “Fizemos mudanças muito significativas nas últimas duas décadas desde que eles partiram.” Talvez o mais significativo seja o sistema de defesa aérea da Islândia, um conjunto de quatro poderosas instalações de radar que examinam centenas de quilômetros quadrados de espaço aéreo.
As capacidades dos submarinos russos não mudaram, disse a autoridade de defesa islandesa, mas a disposição da Rússia de desafiar as normas da guerra aumentou. A fonte citou como exemplo o bombardeio regular de civis ucranianos. “É o mesmo governo”, disse ele, “que está fazendo isso e operando os submarinos e aviões” no Atlântico Norte./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.