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Israelenses elogiam visita de Biden mas temem freios americanos à ação

Biden manifestou apoio a Israel, mas também alertou que o país não deve exagerar a ponto de prejudicar sua posição na região — e, implicitamente, prejudicar os interesses dos Estados Unidos

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Por Steve Erlanger

THE NEW YORK TIMES — Após a visita do presidente Joe Biden, os israelenses elogiaram nesta quinta-feira, 19, sua coragem por viajar ao país em um tempo guerra e por seu apoio pleno, conforme ele prometeu “que nós nunca os deixaremos sozinhos” após os ataques do Hamas que mataram pelo menos 1,4 mil israelenses.

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Mais ainda que as palavras tenham sido bem recebidas, surgiu também uma preocupação com a possibilidade de o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, com a imagem seriamente prejudicada por seu fracasso em proteger os israelenses, ter dado a Biden influência demais na decisão de como Israel deve travar sua guerra em Gaza contra o Hamas, o grupo que controla o enclave.

Biden manifestou apoio a Israel, mas também alertou que o país não deve exagerar a ponto de prejudicar sua posição na região — e, implicitamente, prejudicar os interesses dos Estados Unidos. O presidente americano compareceu até a um gabinete de guerra para ser informado a respeito dos planos de Israel, assim como o secretário de Estado Antony Blinken antes dele.

U.S. President Joe Biden pauses during a meeting with Israeli Prime Minister Benjamin Netanyahu to discuss the war between Israel and Hamas, in Tel Aviv, Israel, Wednesday, Oct. 18, 2023. Foto: Miriam Alster / AP

Este grau de consulta é raro, mas não sem precedentes, mesmo nesta relação tão próxima, afirmaram analistas israelenses. E mesmo que implique em possíveis benefícios para Netanyahu, também engendra riscos. Pode lhe dar cobertura política para uma guerra prolongada, mas também pode conter a maneira que ele a conduz.

Alternativamente, Washington poderia ser visto como colaborador se Israel for culpado por ir longe demais.

“O falecido Ariel Sharon tinha o hábito de dizer, ‘Nos defenderemos com nossos próprios recursos’”, escreveu o analista israelense Nadav Eyal no jornal Yedioth Ahronoth. “Não são esses os valores que Netanyahu tem projetado nos dias recentes. Ele parece ansiar tornar-se o 51.º Estado americano. Isso tem um preço, tanto simbólico quanto prático.”

Sua preocupação foi enfatizada por Nahum Barnea, um dos comentaristas mais respeitados de Israel. Biden deixou claro que os EUA não abandonarão Israel, mas também não permitirão que os israelenses ajam como considerem mais adequado, escreveu ele no Yedioth. As regras do jogo têm sido que “Israel não compartilha seus planos militares com os EUA. Aviso antecipado, sim; consideração, sim; pedir permissão, não”, escreveu ele.

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Netanyahu, em vez disso, “trouxe os americanos para dentro do processo de tomada de decisão no gabinete de segurança”, escreveu Barnea. “Isso significa que Biden será responsabilizado por qualquer coisa que Israel faça em Gaza — o que sujeita ele tanto quanto a nós.”

Essa crítica foi expressada ainda mais contundentemente por analistas mais à direita, que apoiaram o governo no passado. Nechama Duek, escrevendo no Israel Hayom, afirmou que Biden falou suavemente e enfaticamente, “mas, em suas palavras, ele prendeu e algemou Netanyahu e seu governo”.

Netanyahu, escreveu ela, “tem medo” dos resultados desta guerra “e está feliz em ter Biden ao lado como parceiro. Por isso ele não rejeitou a assistência como seus antecessores, mas entregou-se para um abraço que pode ser um abraço de urso”.

Voluntários e funcionários de ONGs ficam perto de tendas que montaram ao longo do lado egípcio da passagem de fronteira de Rafah, exigindo autorização para um comboio de ajuda entrar na Faixa de Gaza, em 19 de outubro de 2023.  Foto: KEROLOS SALAH / AFP
O presidente Joe Biden se reúne com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em Tel Aviv, na quarta-feira, 18 de outubro de 2023.  Foto: Kenny Holston / NYT

Gadi Taub, antigo apoiador de Netanyahu e palestrante da Escola de Políticas Públicas e do Departamento de Comunicações da Universidade Hebraica de Jerusalém, foi mais duro, argumentando que Biden limitou a capacidade de Israel combater uma guerra até uma conclusão necessária.

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“Biden bloqueou qualquer caminho para um quadro de vitória inequívoca de Israel, o que deixará claro para nossos inimigos que nós somos fracos e dependemos de outros”, afirmou Taub numa mensagem na plataforma X. Apesar da promessa de solidariedade e ajuda, Biden “fez uma importante contribuição para fazer pender o equilíbrio do poder na região em nosso desfavor”.

Mas outros consideraram a supervisão americana vital, já que Netanyahu é tão desacreditado. Einat Wilf, ex-integrante da Knesset, a assembleia parlamentar de Israel, de esquerda, elogiou Biden por reconhecer que Netanyahu perdeu autoridade e que o país atravessa um tipo de vácuo de poder e precisa tanto de apoio quanto de orientação. “Não existe governo”, escreveu ela na rede social X. “Os EUA entenderam isso imediatamente e estão respondendo à altura.”

A visita de Biden foi importante por dois motivos, afirmou o respeitado analista israelense Akiva Eldar, notando que Biden não tem nenhum carinho particular por Netanyahu, conhecido popularmente como Bibi. “Para o povo israelense, ele está apoiando Israel e a democracia israelense apesar de desprezar Bibi”, afirmou ele.

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Mas a visita de Biden “também conterá os fanáticos da direita”, que estão pedindo até novos assentamentos coloniais de Israel em Gaza, afirmou Eldar, e pressiona Netanyahu a pensar em um novo compromisso com uma solução de dois Estados após a guerra.

Isso poderia ajudar os políticos de centro, afirmou Eldar, que apoia o estabelecimento de um “governo de paz” de unidade nacional para administrar os desdobramentos depois que os combates cessarem. Com o apoio americano, afirmou ele, “Será difícil para Bibi deslegitimá-los depois da guerra”. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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