BUENOS AIRES - Um juiz argentino ordenou nesta segunda-feira, 30, a captura internacional do ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, e de sua esposa, Rosario Murillo, por “violação sistemática de direitos humanos”, informou nesta segunda-feira, 30, o advogado que apresentou a denúncia. A base jurídica para o pedido é a mesma usada pelo juiz espanhol Baltazar Garzón nos anos 90 para prender o ditador chileno Augusto Pinochet.
“O juiz federal Ariel Lijo resolveu a intimação para prestar depoimento investigativo e a ordem de detenção com um pedido de prisão internacional de Daniel Ortega e Rosario Murillo”, disse o advogado Darío Richarte, detalhando que o caso se baseia no princípio da jurisdição universal que permite que países processem crimes contra a humanidade, independentemente de onde foram cometidos.
O governo de Ortega e sua esposa “é talvez a ditadura mais sangrenta que já existiu no continente”, acrescentou Richarte.
Os crimes de que são acusados incluem “homicídio, privação grave de liberdade, desaparecimento forçado de pessoas, tortura, deportação ou transferência forçada de população e perseguição de um grupo ou coletividade”.
A ordem de captura também inclui “cada um dos responsáveis pela estrutura estatal, policial, militar e paramilitar, por crimes contra a humanidade”, acrescentou.
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A denúncia detalha o contexto social e político vivido na Nicarágua desde abril de 2018, identificando etapas que compõem o que é descrito como um “plano criminoso de repressão” e conta com testemunhos de vítimas mantidos em sigilo.
A ação foi apresentada aos tribunais federais da capital argentina em 26 de agosto de 2022 por um grupo de professores da Universidade de Buenos Aires, liderado por Richarte e com apoio de estudantes de Direito.
Desde então, foi ampliada sete vezes para incluir as supostas cumplicidades de da Polícia Nacional e do Poder Judiciário, os ataques à liberdade de expressão com o fechamento de meios de comunicação e ONGs opositoras, além da “migração intencional e organizada”, entre outras acusações.
“A ação judicial foi sendo ampliada à medida que a ditadura cometia novas violações de direitos humanos”, comentou Richarte.
Jurisdição Universal
O Congresso da Nicarágua, totalmente alinhado com o governo, aprovou em 22 de novembro uma reforma constitucional que concedeu a Ortega e Murillo controle absoluto sobre os poderes do Estado.
A reforma ampliou o mandato presidencial de cinco para seis anos e confirmou o poder já exercido por Murillo, que passou de vice-presidente para “copresidente”.
O texto também concede poder total ao Executivo, ao determinar que os copresidentes coordenarão “os órgãos legislativo, judicial, eleitoral, de controle e fiscalização, regionais e municipais”, antes reconhecidos pela Constituição como independentes.
Entre fevereiro de 2023 e setembro de 2024, o Judiciário da Nicarágua retirou a nacionalidade de mais de 400 opositores ao governo Ortega, muitos deles presos políticos posteriormente deportados, enquanto outros já estavam exilados.
Entre os afetados estão a escritora Gioconda Belli e o escritor e vencedor do Prêmio Cervantes Sergio Ramírez, que foi vice-presidente do governo sandinista (1985-1990) e hoje é crítico do regime.
Ortega, ex-guerrilheiro de 79 anos que governou a Nicarágua nos anos 1980 após a vitória da revolução sandinista, voltou ao poder em 2007. Desde então, segundo seus críticos, instaurou uma ditadura e um nepotismo em parceria com a sua esposa, seis anos mais jovem.
O exemplo Pinochet
A Justiça argentina aplicou recentemente o princípio de jurisdição universal ao emitir, em setembro, uma ordem de captura contra o presidente venezuelano Nicolás Maduro e seu vice, Diosdado Cabello, por crimes contra a humanidade.
Esse princípio também foi invocado em 2010, em um caso sobre crimes contra a humanidade cometidos na Espanha durante o regime de Francisco Franco, e em 2021, em uma investigação sobre acusações contra militares birmaneses pelos crimes contra a minoria muçulmana.
Outro caso célebre do uso desse princípio ocorreu em 1998, quando o ex-ditador chileno Augusto Pinochet foi detido em Londres por ordem do juiz espanhol Baltasar Garzón. / AFP
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