A juíza federal Aileen Cannon, da Flórida, proibiu temporariamente o Departamento de Justiça dos Estados Unidos de publicar o resultado da investigação contra o presidente eleito Donald Trump no caso do uso indevido de documentos secretos. Sob a responsabilidade do procurador especial Jack Smith, a divulgação da investigação está suspensa até que um tribunal federal analise as apelações de dois outros investigados.
O processo judicial dos documentos secretos foi encerrado em julho do ano passado pela mesma juíza, após ela considerar ilegal a nomeação de Jack Smith para investigar o caso. O relatório de conclusão, entretanto, poderia ser divulgado pelo Departamento de Justiça, sob a liderança do procurador-geral Merrick Garland, se não fosse a decisão desta terça-feira, 7.
Os investigados que pediram a suspensão da divulgação alegaram que essa ação os prejudicaria injustamente. Os dois citaram na apelação à Justiça uma carta dos advogados de Trump, que também argumentaram que a divulgação não era de interesse público e interferiria na transição presidencial e no novo mandato do republicano.
Não está claro se o relatório sobre a investigação de documentos confidenciais seria divulgado antes da posse de Trump no dia 20 de janeiro, mesmo sem a ordem de Cannon. A juíza foi nomeada para o tribunal federal da Flórida durante o 1.º mandato de Trump na Casa Branca.
Segundo o regulamento do Departamento de Justiça, os procuradores especiais devem apresentar um relatório para explicar as decisões legais na conclusão de uma investigação, mas cabe ao procurador-geral decidir se as descobertas serão tornadas públicas.
Durante o mandato de Garland à frente do Departamento de Justiça, ele afirmou que divulgaria qualquer relatório de conselho especial que chegasse à sua mesa. Entretanto, o recurso em andamento no caso de documentos confidenciais significaria que divulgar o relatório de Smith pode ser mais complicado, e o gabinete de Smith disse ao tribunal na terça-feira de manhã que Garland pode não divulgá-lo.
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Trump foi dispensado da apelação no caso de documentos confidenciais depois que foi eleito em novembro, porque a política do Departamento de Justiça proíbe processar presidentes em exercício. Mas os outros dois investigados, Waltine Nauta e Carlos De Oliveira, ainda são partes na apelação.
Cannon disse que a decisão de bloquear a divulgação do relatório permaneceria em vigor até três dias depois de o tribunal de apelações decidir sobre se publicar o relatório afetaria injustamente Nauta e De Oliveira, que trabalharam para Trump durante anos. Ela alertou que sua decisão não deve ser lida como uma decisão sobre nenhum dos argumentos que Trump e seus antigos réus apresentaram para manter o relatório permanentemente em segredo.
Ações para anular processos
A enxurrada de apelações judiciais é o esforço mais recente de Trump e seus aliados para anular os resquícios dos quatro processos criminais que ele enfrentou nos últimos dois anos. Em Manhattam, há pelo menos uma ação semelhante, com relação ao processo de falsificação de registros para encobrir um pagamento de suborno antes das eleições de 2016.
O juiz da Suprema Corte de Nova York, Juan Merchan, agendou a sentença para sexta-feira, 10 dias antes da posse de Trump. O juiz disse que não imporá pena de prisão ou liberdade condicional ao presidente eleito, mas quer concluir o processo de sentença para honrar a seriedade do veredito do júri.
Os advogados de Trump pedem ao tribunal de apelações que suspenda a sentença enquanto analisa a decisão de Merchan de que Trump não estava protegido neste caso pela imunidade presidencial.
Merchan afirmou repetidamente que o caso de dinheiro para silenciar foi baseado em conduta pessoal, não em deveres oficiais de Trump, e que a doutrina de imunidade federal, portanto, não se aplica. Os advogados de Trump argumentam que uma decisão de imunidade expandida, emitida em 1º de julho pela Suprema Corte, significa que o caso de falsificação de registros em Nova York também é ilegal. Eles defendem que os jurados no julgamento ouviram alguns depoimentos e viram algumas evidências que foram geradas durante o primeiro ano de Trump no cargo em 2017.
Nos casos federais, os advogados de Trump escreveram uma carta a Merrick Garland contra a divulgação de qualquer trecho do relatório de Jack Smith. Segundo fontes, o relatório também detalha as descobertas dos promotores durante a investigação sobre os esforços de Trump para anular os resultados da eleição de 2020.
“A divulgação do relatório de Smith obviamente não é do interesse público — principalmente à luz da vitória esmagadora do presidente Trump na eleição e da natureza sensível do processo de transição em andamento”, escreveram os advogados Todd Blanche e John Lauro na carta, que foi incluída na moção de emergência apresentada por Nauta e De Oliveira no tribunal federal da Flórida.
A moção cita a decisão de Cannon de rejeitar a acusação de documentos confidenciais depois que ela decidiu que Smith foi nomeado ilegalmente. Essa decisão rompeu com décadas de precedentes legais envolvendo conselheiros especiais ou independentes, e é o assunto do recurso em andamento.
“Esses réus sofrerão danos irreparáveis como vítimas civis da utilização inadmissível e contumaz de guerra política pelo governo, incluindo a divulgação do relatório não autorizado”, diz a moção.
O gabinete de Jack Smith disse em seu processo que sua equipe estava trabalhando para finalizar o relatório. O promotor especial assistente James Pearce afirmou que quando Nauta e De Oliveira entraram com a moção para impedir a divulgação do relatório, o procurador-geral “ainda não havia determinado como lidar com o volume do relatório referente a este caso”.
Smith foi nomeado em novembro de 2022 para supervisionar as duas investigações federais contra Trump, depois que o agora presidente eleito anunciou que concorreria novamente à Casa Branca. Um promotor especial tem mais independência do que um promotor comum, embora ainda se reporte ao procurador-geral.
Ambos os casos foram adiados nos tribunais de apelação e estavam longe de ir a julgamento quando Trump venceu a eleição do ano passado. Embora muitas das evidências contra Trump nos dois casos tenham sido reveladas nas acusações e nos procedimentos pré-julgamento, um relatório de advogado especial poderia expor a estratégia que o governo teria empregado contra Trump no julgamento e o escopo completo das evidências nos casos.
Antes de Trump assumir o cargo, o Departamento de Justiça também deve divulgar um relatório do conselheiro especial David Weiss detalhando a investigação contra o filho do presidente Joe Biden, Hunter Biden.
Um júri federal em Delaware condenou Hunter Biden por acusações de porte de arma como resultado dessa investigação, e ele se declarou culpado separadamente de acusações de impostos federais em Los Angeles no ano passado. O presidente perdoou seu filho no mês passado.
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