OTTAWA - O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, confirmou nesta segunda-feira, 6, que renunciará à liderança do Partido Liberal e, consequentemente, ao cargo de primeiro ministro. Isso só deve acontecer, contudo, quando o partido apontar o seu sucessor, processo que pode levar semanas ou até meses.
“Pretendo renunciar como líder do partido e como primeiro-ministro depois que o partido selecionar um novo líder”, disse Trudeau em pronunciamento, acrescentando que refletiu sobre a decisão ao longo do feriado, em conversas com a família.
Descrevendo a si mesmo com um lutador, ele reconheceu que não conseguiu superar a paralisia que atinge o Parlamento e defendeu a necessidade de um recomeço. “Esse país merece uma escolha real na próxima eleição e ficou claro para mim que, se eu tiver que lutar batalhas internas, não posso ser a melhor opção nessa eleição”.
Trudeau sinalizou que seu sucessor será selecionado após um processo “nacional”. Isso significa que o Partido Liberal tomará o caminho mais longo para escolher um novo líder, por meio de um processo de base que pode levar várias semanas. Ele pediu aos canadenses que apoiem quem quer os liberais apontem porque, do outro lado, os conservadores liderados por Pierre Poilievre teriam uma “visão muito pequena” para o Canadá.
“A visão de Pierre Poilievre para este país não é a correta para os canadenses. Parar a luta contra a mudança climática não faz sentido. Recuar em relação aos valores e à força da diversidade que o Canadá sempre trabalhou para se destacar não é o caminho certo para o país. Atacar jornalistas, a (rede de televisão) CBC, instituições, não é o que os canadenses precisam neste momento. Precisamos de uma visão ambiciosa e otimista de futuro e Pierre Poilievre não está oferecendo isso”, declarou.
Em mensagem de vídeo publicada nas redes sociais, Poilievre disse que “os canadenses desesperados para virar a página desse capítulo sombrio da nossa história podem ficar aliviados hoje que Justin Trudeau está finalmente saindo”. E mirou no Partido Liberal, alegando que os deputados e possíveis candidatos à liderança do partido teriam ajudado Trudeau a “destruir o país”.
A renúncia de Trudeau deve levar o Partido Liberal a uma batalha pela sucessão, depois de mais de uma década sob o seu comando. A pressão aumentou depois que a vice-primeira-ministra e então ministra das Finanças, Chrystia Freeland, renunciou abruptamente em dezembro.
A saída de Trudeau no cargo ocorre em um ano eleitoral para os canadenses. Novas eleições precisam ser convocadas até outubro, segundo as regras eleitorais. Atualmente, o Partido Liberal está atrás do Partido Conservador nas pesquisas e a popularidade de Trudeau despencou nos últimos meses em meio a problemas relacionados ao alto custo de vida, inflação e imigração no Canadá.
O político de 52 anos tem apenas 33% de aprovação, de acordo com o Instituto Ipsos. Muito diferente de quando foi eleito pela primeira vez, em 2015, quando chegou a ter 70%. O seu partido não tem maioria na chamada Câmara dos Comuns do Canadá e Trudeau precisou sobreviver a constantes votos de desconfiança do Parlamento para seguir no cargo.
Inflação e custo de vida
A maior dor de cabeça de Trudeau é a economia. Canadenses relatam problemas com a inflação, preços mais altos de casas, aluguéis e também para compras de rotina. De acordo com uma pesquisa do governo do Canadá, 45% dos cidadãos do país relataram em setembro que o aumento dos preços estava afetando a sua capacidade de arcar com os custos do dia a dia.
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O sistema de imigração no Canadá também preocupa a população. O país permitiu a entrada de mais estrangeiros do que poderia suportar nos últimos anos. O erro foi reconhecido pelo primeiro-ministro, que anunciou uma mudança no sistema em outubro.
Pierre Poilievre
O principal adversário de Trudeau é o líder do Partido Conservador, Pierre Poilievre. O político de 45 anos é considerado pouco convencional para o Canadá por conta de sua retórica agressiva e fortes críticas ao atual primeiro-ministro. Poilievre repete constantemente que o “Canadá está quebrado” e que ele irá botar o país “em primeiro lugar” caso se torne primeiro-ministro, em uma retórica similar a do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.
O político tenta se colocar como um líder prático que irá resolver os problemas do Canadá. Ele amplifica sua plataforma com slogans simples em que promete a volta do “bom senso”. Poilievre também se destaca pelo uso das redes sociais para se conectar com o público e explicar os principais problemas do Canadá.
O político usa a sua trajetória para se conectar com eleitores que tradicionalmente não são do Partido Conservador, como a classe trabalhadora e latinos. Ele nasceu em Calgary e foi adotado por um casal de professores. O opositor é casado com Ananda Poilievre, venezuelana que se mudou para o Canadá com 8 anos, e tem dois filhos.
A estratégia parece estar dando certo. O Partido Conservador lidera todas as pesquisas de opinião para as próximas eleições e Poilievre pode ter uma grande maioria na Câmara dos Comuns no Canadá./com NYT e informações de Daniel Gateno
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