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É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião | A guerra na Ucrânia e o verdadeiro sentido do liberalismo

Quando extrapola suas funções, o Estado passa a ser o veículo da opressão de um grupo sobre os demais

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Foto do author Lourival Sant'Anna

A semana foi marcada pelo esforço da União Europeia de cortar na carne mais uma vez, definindo um cronograma para encerrar a compra do petróleo russo; pela espantosa entrevista do ex-presidente Lula à revista Time, culpando a Ucrânia por ter sido invadida pela Rússia; e pelo esboço de voto dos conservadores na Suprema Corte americana, que atropela 50 anos de direito das mulheres de decidirem se querem levar adiante uma gravidez.

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Escrevo de Londres, berço do liberalismo. Que hoje a escolha política aqui esteja entre um partido liderado por um farsante, o premiê Boris Johnson, e uma esquerda estatizante, que domina o Partido Trabalhista, diz muito sobre a precariedade intelectual e ética que assola o mundo. Ainda assim, o Reino Unido também sacrifica sua economia pela Ucrânia.

Ao contrário do que muitos pensam na América Latina, o liberalismo não é uma manifestação do egoísmo, da opressão dos pobres pelos ricos. Ser liberal, no sentido original da palavra, é acreditar que o ser humano deve ter a chance de realizar o próprio potencial, de decidir seu destino, e de contar para isso com justiça e solidariedade.

Parlamento ucraniano, com o presidente Volodmir Zelenski, aplaudem Boris Johnson após discurso ao país  Foto: Ukrainian Presidential Press Office via AP

A partir dessa ideia abstrata, há diferentes graus de atuação aceitável do Estado, como materialização do esforço coletivo. Quando extrapola suas funções, o Estado passa a ser o veículo da opressão de um grupo sobre os demais. O Estado é formado por pessoas que, se não forem contidas, capturam as estruturas do governo para impor seus desejos.

Quando serve ao bem comum, o Estado é um agente do liberalismo, ainda que rotulado de social-democracia. Quando protege empresas, corporações de funcionários públicos, estatais, sindicatos e outras elites, é agente da exclusão.

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Esse foi o Estado que sempre imperou no Brasil. As elites brasileiras aproveitam o sentimento de fragilidade dos pobres e ignorantes para proteger os seus privilégios e ditar o que é melhor para o País e as pessoas. Isso se estende ao domínio patriarcal sobre o corpo das mulheres.

Duas semanas antes da invasão, Jair Bolsonaro foi a Moscou dizer que “somos solidários” a Vladimir Putin e louvar sua defesa da família formada por heterossexuais. Os dois principais líderes políticos do Brasil admiram o ditador, que para se perpetuar no poder impede a Ucrânia de se tornar um país democrático e próspero, que serviria de exemplo para os russos.

Em dois meses de guerra, os US$ 50 bilhões que a Europa pagou pelo petróleo, gás e carvão da Rússia representam quatro vezes o gasto militar russo. Apesar do aumento de 40% no barril este ano, os europeus não desejam financiar mais a carnificina na Ucrânia. O Brasil de Bolsonaro e de Lula não entende isso. Sua visão de poder está associada ao direito de uma elite de capturar o Estado, não de um indivíduo ou de uma nação de escolher o seu destino.


*É COLUNISTA DO ESTADÃO E ANALISTA DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS

Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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