Os desafios que a crescente desordem internacional impõem à liderança dos Estados Unidos — ou de qualquer país que tente exercê-la — se apresentaram de forma condensada ao longo da última semana: a violência desenfreada de Israel na Faixa de Gaza, a vulnerabilidade da Ucrânia frente à Rússia, de Taiwan frente à China e da Guiana frente à Venezuela.
O presidente Joe Biden comunicou ao primeiro-ministro Binyamin Netanyahu que sua política em relação à Faixa de Gaza depende da adoção de medidas por parte de Israel para frear a punição coletiva de civis. Traduzindo: o governo americano poderá suspender a ajuda militar anual de US$ 3,8 bilhões se Israel continuar atacando alvos civis e bloqueando a entrada de ajuda humanitária.
A conversa se seguiu ao assassinato de sete membros da organização World Center Kitchen, que distribuíam alimentos na noite de segunda-feira na Faixa de Gaza, quando seu comboio foi bombardeado pela Força Aérea israelense. Eles se somaram a 194 agentes humanitários e 32 mil palestinos mortos por Israel desde as atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro.
A campanha israelense viola não só o direito internacional, mas a lei americana, que proíbe o emprego de armas fornecidas pelos EUA em castigos coletivos contra civis. Biden reiterou o compromisso americano com a defesa de Israel frente ao Irã. No dia do massacre dos voluntários, o presidente assinou a transferência de mais de 2 mil bombas a Israel, já aprovada anteriormente pelo Congresso.
Netanyahu luta pela própria sobrevivência política. Um dos líderes da oposição, o general Benny Gantz, propôs a realização de eleições em setembro. Pelas pesquisas, o bloco do governo sairia derrotado. Netanyahu tem o apoio de 64 dos 120 deputados da Knesset. Basta que quatro se retirem para seu governo cair. O efeito da pressão americana depende da reação dos deputados mais moderados, suscetíveis aos danos à reputação e às relações de Israel com os EUA.
A influência de Biden é ainda menor no flagelo dos ucranianos. O ex-presidente Donald Trump orientou a bancada republicana, majoritária na Câmara, a não votar um pacote de ajuda de US$ 60 bilhões para a Ucrânia, que inclui também US$ 14,1 bilhões para Israel, US$ 9,2 bilhões em assistência humanitária e US$ 4,8 bilhões para aliados no Indo-Pacífico, especialmente Taiwan.
Na celebração do 75.º aniversário da Otan, na quinta-feira em Bruxelas, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou que a Ucrânia acabará se tornando membro da aliança de defesa ocidental. A promessa pareceu mais vazia do que nunca. O chanceler ucraniano, Dmytro Kuleba, falou da necessidade urgente de munição de artilharia e defesa antiaérea, para proteção contra os ataques diários da Rússia.
A Ucrânia não sabe se seguirá sendo um Estado soberano nos próximos anos. Se isso não for garantido agora, com armas e munições, não há um futuro sobre o qual sonhar. Os membros da Otan prometeram vasculhar seus arsenais em busca de antimísseis Patriot, projetados para interceptar mísseis russos. Mais uma prova da improvisação e voluntarismo na contenção do expansionismo russo.
O terremoto de quarta-feira levou à suspensão temporária de parte da produção de chips em Taiwan. A ilha responde por 90% da fundição dos mais avançados semicondutores do mundo. São eles que fazem funcionar tudo o que é eletrônico, civil ou militar.
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A pausa, logo superada, foi mais um lembrete da dependência do mundo em relação a essa ilha ameaçada de invasão pela China. Biden lançou em 2022 um programa de US$ 280 bilhões para deslocar a produção de chips para os EUA e parceiros próximos. Mas isso leva tempo, e as transferências estão atrasadas.
Taiwan obviamente não tem interesse: seu status de maior produtor de chips é um principais motivos para o Ocidente proteger a ilha das ameaças chinesas. O pacote de leis de Biden incluiu o banimento do acesso da China a chips de alta performance, criando mais um incentivo para a anexação de Taiwan.
O impopular regime venezuelano voltou a ameaçar com uma guerra na Guiana. O Essequibo, que representa 70% do território guianês, foi anexado, exatamente como Vladimir Putin, aliado de Nicolás Maduro, fez com 15% da Ucrânia.
Em 14 de dezembro, em acordo mediado pelo presidente Lula, Maduro havia se comprometido a retirar essa ameaça. Em troca, Lula deu aval à sua farsa eleitoral. Com a retirada desse aval, diante da explícita exclusão da oposição, Maduro volta à carga contra a Guiana. O único sinal de liderança do Brasil na América do Sul se perdeu.
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