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É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião | Ofensiva de Israel contra Hezbollah eleva risco de guerra em escala mundial

Estratégias de permanência no poder de governantes, combinadas com a rede de alianças de contestadores da ordem mundial, causam sombria constatação

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Foto do author Lourival Sant'Anna
Atualização:

A ofensiva de Israel contra o Hezbollah eleva o risco não só da expansão do conflito no Oriente Médio, mas de uma possível guerra em escala mundial. As estratégias de permanência no poder de governantes de países-chave, combinadas com a rede de alinhamentos e a interdependência entre contestadores da ordem mundial, levam a essa sombria constatação.

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O Hezbollah intensificou os ataques em resposta à campanha de Israel contra a Faixa de Gaza, por sua vez uma reação aos atentados terroristas do Hamas de 7 de outubro. A milícia xiita afirma que não voltará ao status quo anterior de guerra de atrito enquanto não houver um cessar-fogo no território palestino.

O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, não pode firmar um cessar-fogo com o Hamas. Seus ministros das Finanças, Bezalel Smotrich, e da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir, ambos líderes dos colonos judeus na Cisjordânia ocupada, rejeitam qualquer acordo com o Hamas e defendem a expulsão dos palestinos e anexação dos dois territórios.

Ataque de Israel contra o Hezbollah, que enterrou dois líderes, pode resultar em guerra global Foto: Diego Ibarra Sanchez/NYT

O impopular Netanyahu depende do apoio desses dois ministros. Seus partidos reúnem 13 das 64 cadeiras que apoiam o governo no Parlamento, do total de 120. Sem esse apoio, Netanyahu não só iria para a oposição, mas potencialmente para a prisão. Tramitam na Corte Suprema processos contra ele por corrupção, razão pela qual o primeiro-ministro tentava antes da guerra aprovar uma reforma que retirava a autonomia do tribunal.

Essa reforma provocou os maiores protestos da história de Israel, só comparáveis aos que ocorreram há duas semanas, contra a prioridade que Netanyahu tem dado à destruição do Hamas, em detrimento de um acordo para libertar os cerca de 100 reféns israelenses. Outra fonte de frustração é o deslocamento de mais de 60 mil israelenses do norte de Israel, por causa dos ataques do Hezbollah com mísseis e foguetes.

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A ofensiva contra a milícia xiita atende a dois objetivos de Netanyahu: recuperar o apoio da população e prolongar o conflito que, enquanto durar, protegerá o primeiro-ministro de um movimento parlamentar ou judicial para retirá-lo do cargo.

A igualmente impopular teocracia iraniana também depende das tensões com Israel para justificar sua manutenção no poder, aparato repressivo e programa nuclear. O Irã demonstra que uma guerra total com Israel não lhe interessa neste momento. O país não cumpriu as ameaças de retaliar Israel de forma contundente por humilhações recentes, como o ataque ao seu consulado em Damasco e o assassinato do líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, no dia da posse do presidente iraniano em Teerã.

O Hezbollah, com seus estimados 150 mil mísseis e foguetes e 100 mil combatentes, também não. O assassinato de Fuad Shukri, comandante militar do grupo, em Beirute, no dia 30 de julho, parece não ter provocado uma reação à altura.

Com as 36 mortes nos últimos dias causadas pelas explosões de pagers e walkie-talkies, e o assassinato de Ibrahim Akil, comandante das forças especiais do Hezbollah, junto com mais 13 pessoas, as humilhações vão se acumulando. Humilhações têm limite no Oriente Médio, cuja cultura associa poder e violência.

Uma eventual escalada envolvendo o Irã arrastaria de forma direta ou indireta a Rússia, que depende dos mísseis e drones iranianos para conduzir sua guerra contra a Ucrânia. Assim como depende de mísseis e munição de artilharia da Coreia do Norte, que também contesta a ordem internacional.

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Vladimir Putin também está sob pressão e tem sofrido humilhações, com os ataques ucranianos com drones contra cidades russas e a ocupação de território do país. O poder de Putin se baseia em sua capacidade de proteger a Rússia da suposta opressão e cobiça do Ocidente.

Outro regime autoritário abalado é o da Venezuela, ponta de lança da Rússia na América do Sul. Armado com arsenal adquirido da Rússia, e com apoio de navios de guerra russos que lhe dão cobertura, o regime bolivariano ameaça invadir a Guiana.

A Venezuela também é aliada da China e do Irã. Os Estados Unidos sinalizaram que não aceitariam essa invasão. Como não aceitariam a anexação de Taiwan pela China, outro regime sob pressão.

Xi Jinping adotou nos últimos anos medidas para impedir aberturas de capital e reduzir drasticamente fatias de mercado das grandes empresas de tecnologia, que na visão dele competiam com o Partido Comunista em poder econômico e informações sobre os cidadãos chineses.

Essa estratégia causou desaceleração econômica, perda de dinamismo e de inovação. Para a China também não interessa uma guerra, mas um ditador fragilizado tende a recorrer ao conflito armado para impor seus desejos de perpetuação.

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Diante de todo esse cenário, o risco de uma conflagração em escala mundial é crescente.

Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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