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É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais. Escreve uma vez por semana.

Opinião | Signalgate expõe amadorismo e irresponsabilidade do governo Trump

Os EUA nunca se colocaram, por iniciativa própria, numa condição tão vulnerável

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Foto do author Lourival Sant'Anna

O episódio do compartilhamento de planos de ataques contra o Iêmen em um grupo na plataforma de mensagens Signal, no qual um jornalista foi acidentalmente incluído pelo conselheiro de Segurança Nacional, com as principais autoridades de defesa, inteligência e política externa, é mais uma prova do amadorismo e irresponsabilidade do governo de Donald Trump.

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Duas horas antes dos ataques contra a milícia pró-iraniana Houthis, o secretário da Defesa, Pete Hegseth, compartilhou no grupo de 19 pessoas os detalhes da operação: caças F-18 Super Hornet decolariam, mísseis Tomahawk seriam disparados do mar, drones seriam empregados. A identidade de um agente secreto da CIA foi revelada.

Os houthis sabem que os F-18 decolam do porta-aviões Harry S. Truman, no Mar Vermelho, onde já atacaram navios americanos. O grupo dispõe de sofisticados sistemas antiaéreos, que já lhe permitiram por exemplo abater grandes drones MQ-9 Reaper. Se essas informações tivessem chegado aos inimigos, eles poderiam ter derrubado os aviões, atingido os navios e escondido os alvos visados pelo ataque.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, acena para apoiadores em Palm Beach, Flórida  Foto: Manuel Balce Ceneta/AP

Hackers chineses já invadiram celulares de autoridades americanas, incluindo o do vice-presidente JD Vance, que participava do grupo. Agentes russos também têm essa capacidade, e já compartilharam inteligência com os houthis. A China e a Rússia são aliadas do Irã, que patrocina a milícia xiita do Iêmen.

Um dos integrantes do grupo, Steve Witkoff, enviado de Trump para o conflito Rússia-Ucrânia, estava em Moscou. De acordo com as normas americanas, funcionários com acesso a informações sensíveis só podem se comunicar de uma sala protegida da embaixada dos EUA em Moscou, por causa da rotina de interceptações russas.

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O secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, participa de uma coletiva de imprensa em Quezon City, Filipinas  Foto: Gerard Carreon/AP

Vulnerabilidade

Os EUA nunca se colocaram, por iniciativa própria, numa condição tão vulnerável. A abrupta degradação é a consequência esperada da falta de qualificação do presidente e de seus principais auxiliares, de seu desprezo pela expertise profissional e por regras alicerçadas na experiência.

Como escrevi na minha coluna de 17 de novembro, Tulsi Gabbard, a diretora de Inteligência Nacional, reuniu-se em 2017, quando era deputada democrata, com o então ditador sírio Bashar Assad, inimigo dos EUA, e defende as teorias da Rússia contra a Ucrânia.

Hegseth foi escolhido porque Trump gostava de seu desempenho como comentarista da Fox News. Em entrevista a esse canal, Witkoff não conseguiu lembrar o nome de nenhuma das quatro regiões ucranianas que Putin quer anexar: Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhia e Kherson, e ainda as confundiu com a Crimeia.

Os inimigos do Ocidente mal podem acreditar na sua sorte.

Opinião por Lourival Sant'Anna

É colunista do 'Estadão' e analista de assuntos internacionais

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