ENVIADO ESPECIAL A NOVA DÉLHI - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma espécie de ultimato nesta segunda-feira, dia 11, a líderes da União Europeia, com quem negocia um acordo comercial em nome do Mercosul. “Temos que chegar nos próximos meses a um acordo. Ou ‘sim’ ou ‘não’. Ou faz acordo ou para de discutir acordo, porque 22 anos, ninguém acredita mais”, afirmou Lula, em Nova Délhi, na Índia, onde participou da Cúpula do G-20.
Durante a reunião internacional, Lula conversou reservadamente com três lideranças da União Europeia. Ele tratou do assunto com o presidente da França, Emmanuel Macron, com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. O presidente exigiu que as negociações do acordo comercial sejam elevadas do nível técnico para o político. Ele quer discutir diretamente com os chefes de Estado e de governo dos 27 países europeus.
“Temos que fazer uma reunião em que os presidentes estejam presentes para decidir e dizer se quer ou não quer. Já faz 22 anos que estamos negociando”, propôs o presidente. “Quando a gente quer encontrar solução a gente não manda emissário, a gente vai pessoalmente. A UE tem suas comissões que negociam, mas a nossa quem negocia são os governos. Quero sentar com o Macron, com o Olaf Scholz (Alemanha), para decidir as coisas. Quero saber o seguinte: onde está pegando esse acordo?”.
Segundo Lula, quando não se chega a acordo entre os negociadores comercias “tem que entrar a política”.
Lula disse que seu prazo político para conclusão da negociação é até o fim do ano, enquanto o Brasil estiver à frente da presidência temporária do Mercosul. O presidente reiterou que o País é favorável à assinatura do acordo, mas exige igualdade de tratamento e equilíbrio nas negociações.
“Eu disse para os dois e disse para o Macron: ‘Estou com vontade de fazer o acordo enquanto sou presidente do Mercosul’”, relatou Lula.
Reuniões sobre side letter
O presidente reiterou que o Brasil não aceita “ameaças de sanções” por descumprir exigências ambientais, tampouco ceder na reserva de mercado das compras governamentais. O governo federal argumenta que as aquisições serão usadas para fomentar a indústria nacional, portanto, não serão abertas à concorrência de produtores estrangeiros. “É o mínimo que se espera de um governo que quer reindustrializar o País”, argumentou Lula.
Essas duas posições constituem o cerne da contraproposta enviada recentemente pelo Mercosul, sob coordenação do Brasil, à União Europeia. Em março, Bruxelas havia remetido ao Mercosul uma carta adicional ao conteúdo originalmente fechado, em 2019. O texto foi considerado “ofensivo” por Lula e “inadmissível”.
Os negociadores dos dois lados já fizeram uma reunião virtual para tratar da contraproposta enviada pelo Mercosul. No dia 21 de setembro, eles devem se reunir presencialmente, em Brasília.
O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse ser indispensável classificar os países do Mercosul como de “baixo risco” - uma espécie de referência na lei europeia, que impõe mais cuidados e certificações dos exportadores para o ingresso dos produtos no mercado europeu.
O documento europeu, conhecido como side letter, apresentava uma série de exigências, sobretudo compromissos climáticos, para dar continuidade à negociação. E, conforme o governo brasileiro, poderia provocar o fechamento de mercados e retaliações ao agronegócio.
Embora Mercosul e UE tenham anunciado, quatro anos atrás, que chegaram a um consenso sobre os capítulos do acordo, ele jamais foi assinado, nem ratificado pelos países sul-americanos e europeus. As tratativas começaram em 2000 e se arrastam desde então.
Pesquisa de petróleo na Amazônia
O presidente defendeu, novamente, a pesquisa por petróleo na Bacia da Foz do Rio Amazonas. A questão opõe alas do governo. De um lado Petrobras e Ministério de Minas e Energia. De outro, o Ibama e o Ministério de Minas e Energia. O Ibama já negou um pedido de perfuração da Petrobras, para prospecção. A empresa apresentou nova requisição e estima que o potencial de exploração alcance 14 bilhões de barris de petróleo.
“O Brasil não vai deixar de pesquisar a Margem Equatorial. Se encontrar a riqueza que se pressupõe que exista lá, ái é uma decisão de Estado se vai explorar ou não. É um exploração a 575 quilômetros. Não é algo vizinho do Amazonas. Não se pode ser proibido de pesquisar. Mas pesquisar nós vamos pesquisar”, defendeu Lula.
França na OTCA
O presidente francês, Emmanuel Macron, pediu a inclusão do país na Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), por causa da Guiana Francesa. Mas a adesão não está garantida. O ministro das Realções Exteriores disse que o Brasil vai ter de “examinar como fazer evitando a reforma do tratado”. Assinado originalmente em 1978, ele não permite adesão de novos membros. “Vamos encontrar fórmulas para tratar desse assunto”, disse Vieira.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.