BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva formalizou um novo gesto de reaproximação com a ditadura de Cuba. Lula despachou uma comitiva liderada pelo assessor especial e ex-chanceler Celso Amorim a Havana.
A intenção de Lula é reatar relações mais amplas com Cuba, a exemplo do que o petista fez com o regime de Nicolás Maduro, na Venezuela. Nos dois casos, o governo voltou a nomear embaixadores, elevando a representação diplomática brasileira em Havana e Caracas ao nível mais alto.
Em contrapartida, Brasília também recebeu embaixadores enviados pelos regimes comunista e chavista, a partir da posse do petista. Desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, houve congelamento de relações com os dois países iniciado no governo Michel Temer e amplificado por Jair Bolsonaro.
O novo embaixador brasileiro em Havana, Christian Vargas, foi aprovado em maio pelo Senado, dando fim a um hiato que durava sete anos, durante o qual a embaixada era chefiada por um encarregado de negócios. Segundo ele, o Brasil tem potencial para se tornar o principal exportador de alimentos para Cuba - posição hoje ocupada pelos Estados Unidos e poderia explorar melhor a zona franca do Porto de Mariel, cuja construção envolveu capital brasileiro.
Amorim desembarcou em Havana na esteira das celebrações do aniversário do ex-líder revolucionário e ditador Fidel Castro, que completaria 97 anos em 13 de agosto. Ele deve ficar três dias no país.
Além da missão em Havana, Amorim fez uma visita similar a Caracas no início do ano e já foi enviado por Lula a Moscou e Kiev, para tratar de negociações para o fim da guerra na Ucrânia, e a conferências multilaterais relacionadas ao confronto bélico. Amorim também tem recebido em Brasília diplomatas enviados por potências como Estados Unidos, União Europeia, entre outros.
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Dívida
Assim como fez com Caracas, o governo Lula pode também iniciar um processo de levantamento e revisão da dívida de Cuba com o Brasil, principalmente por operações de financiamento de construtoras, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Casos de corrupção relacionados a obras no exterior financiadas com recursos do banco foram devassados pela Operação Lava Jato.
No caso da Venezuela, o Palácio do Planalto acertou com Maduro a criação de uma mesa de negociação para repactuar os pagamentos e ouvir o que o regime chavista contesta. O valor foi estimado por autoridades do governo brasileiro em U$ 1,2 bilhão.
Em junho, Lula reuniu-se pela segunda vez neste ano com o ditador cubano Miguel Díaz-Canel. Fontes que acompanharam a conversa afirmaram que o governo brasileiro vai revisar a dívida da ditadura castrista com o Brasil, para calcular o exato valor devido por obras de infraestrutura financiadas em governos passados, como o Porto de Mariel.
As primeiras conversas entre Lula e Díaz-Canel ocorreram em janeiro, por telefone, e presencialmente, na Argentina. Lula é um crítico das sanções impostas pelos Estados Unidos que atrapalham o desenvolvimento econômico cubano, mas costuma esquivar-se de comentar perseguições a opositores na ilha e a falta de liberdade política.
O governo brasileiro já indicou que não discutirá novos projetos, tampouco a concessão de créditos enquanto o pagamento da dívida não for equacionado. Diplomatas brasileiros dizem que o governo cubano já sinalizou intenção de quitar os débitos.
Cuba é o segundo maior devedor, depois da Venezuela, conforme dados do BNDES. O banco já desembolsou U$ 656 milhões em financiamentos na ilha caribenha. O país deve U$ 386 milhões, em parcelas a vencer, e deixou de pagar U$ 261 milhões.
Em 2015, o banco cancelou um contrato de modernização e ampliação de aeroportos em Havana e outras cidades, por causa dos casos de corrupção envolvendo empreiteiras brasileiras.
A Apex-Brasil, a agência nacional de promoção de exportações e investimentos, prepara uma missão empresarial na ilha comunista. Ela deve ocorrer durante o principal evento cultural de Cuba, a Feira do Livro de Havana. em fevereiro de 2024, na qual o Brasil será homenageado.
O chanceler Mauro Vieira tem defendido que o País não pode virar as costas para a região em que está inserido e representa o maior peso político, econômico e diplomático. Segundo ele, a ação externa deve operar sempre “acima de efervescências ideológicas”.
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