O casal ucraniano Viktor Úrin e Svitlana Úrina mora na cidade de Dnipro e ficou sabendo que a guerra havia começado após um telefonema da filha, Olga, 37 anos, que vive no Brasil desde 2018, com o marido, brasileiro, e o filho de dois anos. A ligação ocorreu após um ataque russo ao aeroporto da cidade. “Quase morri de desespero quando vi a notícia, pois o aeroporto fica a 15 minutos do condomínio dos meus pais. Liguei para eles e lhes acordei. Assim eles descobriram que a guerra havia começado”, conta a ucraniana.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ZXLDTGEA55KKRKDY7LAUJ2BCQ4.jpg?quality=80&auth=58b8e8d2ecf659e0e2c516a6908ecb58bd56f047593dc8a9a310e5bb968d75f0&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ZXLDTGEA55KKRKDY7LAUJ2BCQ4.jpg?quality=80&auth=58b8e8d2ecf659e0e2c516a6908ecb58bd56f047593dc8a9a310e5bb968d75f0&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ZXLDTGEA55KKRKDY7LAUJ2BCQ4.jpg?quality=80&auth=58b8e8d2ecf659e0e2c516a6908ecb58bd56f047593dc8a9a310e5bb968d75f0&width=1200 1322w)
Os pais e o avô de Olga continuam na Ucrânia, assim como primos de segunda grau e amigos. Todos decidiram ficar no país e lutar contra a invasão da Rússia.
“Durante os primeiros 3 dias, eu dormi no máximo 3 horas porque ficava esperando a manhã chegar e ler que Dnipro estava ok e Kiev continuava lutando. Fiquei com as mãos tremendo o tempo todo e tomei susto toda vez que ouvia um avião passando. Ficava pensando nos meus pais e amigos, nunca vivi isso em minha vida”, diz Olga, que consegue se comunicar todos os dias com os parentes e amigos por aplicativos de mensagens e redes sociais.
A conversa sobre deixar a Ucrânia existiu, mas os pais da ucraniana afirmaram que ficarão e isso só mudará caso a Rússia tome o controle do país europeu. “Eles querem ficar em casa, rezando e apoiando o nosso Exército. Tenho o vovô bem velho em Lutsk, ele não vai conseguir sair. No caso dos meus pais, a vida deles, os amigos, tudo está em Dnipro. A minha mãe é professora de música para crianças, teve tantos alunos durante a vida profissional. ‘Como vou deixar eles e fugir?’, ela me perguntou. Estou com o coração apertado toda hora desde quinta-feira passada, mas entendo e respeito a posição deles. É como a maioria dos ucranianos pensam”, afirma Olga.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/SZIWBK6FPFIZXM5LFOVDHI53DA.jpg?quality=80&auth=f94e90d3933194fc90e6516b32f2ba6eb887923735eb5b3b8f52de2297ef6a94&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/SZIWBK6FPFIZXM5LFOVDHI53DA.jpg?quality=80&auth=f94e90d3933194fc90e6516b32f2ba6eb887923735eb5b3b8f52de2297ef6a94&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/SZIWBK6FPFIZXM5LFOVDHI53DA.jpg?quality=80&auth=f94e90d3933194fc90e6516b32f2ba6eb887923735eb5b3b8f52de2297ef6a94&width=1200 1322w)
Em casa, cozinhando
Viktor Úrin, 60 anos, e Svitlana Úrina, 58 anos, passam os dias monitorando a situação militar pela internet e preparando marmitas para auxiliar o Exército e os voluntários. Eles moram no 25.º andar em um condomínio na cidade de Dnipro, que foi alvo dos ataques russos logo no primeiro dia da guerra.
Quando começam a tocar as sirenes, os dois precisam pegar as bolsinhas com os documentos, dinheiro e celular e correr para um lugar mais seguro. “É bem perigoso porque pode faltar tempo para eles se esconderem em caso de um ataque grave”, explica Olga, a única que fala português de sua família.
O casal deixa sua casa para comprar comida no mercado, prepara os pratos e coloca tudo em caixas que são entregues para as equipes de voluntários que vão entregar aos locais necessários.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/2S3YO3OLQNKA7KENBCJMCFWFDA.jpg?quality=80&auth=79ccbec2eab4047e427dfd2e36c9ae4e16343f6e9ac162e891507896de665493&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/2S3YO3OLQNKA7KENBCJMCFWFDA.jpg?quality=80&auth=79ccbec2eab4047e427dfd2e36c9ae4e16343f6e9ac162e891507896de665493&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/2S3YO3OLQNKA7KENBCJMCFWFDA.jpg?quality=80&auth=79ccbec2eab4047e427dfd2e36c9ae4e16343f6e9ac162e891507896de665493&width=1200 1322w)
Preparando coquetéis molotov
Anastasia Chernenko, 36 anos, é uma das melhores amigas de Olga e vive em Kiev. Desde o início da invasão russa, ela tem passado os dias fabricando coquetéis molotov em sua casa.
Com a ajuda de amigos, a gerente de comunicação e Relações Públicas sai para comprar a cerveja, jogam o líquido fora e usam as garrafas. Os homens levam gasolina e outras substâncias químicas necessárias para a preparação dos explosivos e as mulheres levam roupas velhas cortadas em pedaços. “Pronto, já temos tudo o que é necessário”.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/XOY6MOWNSNIN7KU7JCWQYP6NI4.jpg?quality=80&auth=1c489e62df2d6ef947a53bbf710323055b4cabc3ac91eb9cdd7eb840d13d9e8e&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/XOY6MOWNSNIN7KU7JCWQYP6NI4.jpg?quality=80&auth=1c489e62df2d6ef947a53bbf710323055b4cabc3ac91eb9cdd7eb840d13d9e8e&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/XOY6MOWNSNIN7KU7JCWQYP6NI4.jpg?quality=80&auth=1c489e62df2d6ef947a53bbf710323055b4cabc3ac91eb9cdd7eb840d13d9e8e&width=1200 1322w)
Nos primeiros dias da guerra, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, pediu que apopulação saísse em defesa do país, pegando em armas ou fazendo coquetéis molotov.
Ievgen Klopotenko é um famoso chef de cozinha ucraniano e responsável pela criação do projeto social Nova Nutrição Escolar. Agora, ele transformou seu restaurante em um abrigo anti-bombas e local para alimentar soldados e voluntários que combatem o Exército russo. Com 704 mil seguidores em seu Instagram, Klopotenko também postou um passo a passo de como fazer os coquetéis molotov.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/CRKEXACA5BLVLHT2BV3BXU5IRA.jpg?quality=80&auth=3d03f75d1c2835e1ccdb2fc344852d4a10638d64b849f910d730ba102ed28a70&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/CRKEXACA5BLVLHT2BV3BXU5IRA.jpg?quality=80&auth=3d03f75d1c2835e1ccdb2fc344852d4a10638d64b849f910d730ba102ed28a70&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/CRKEXACA5BLVLHT2BV3BXU5IRA.jpg?quality=80&auth=3d03f75d1c2835e1ccdb2fc344852d4a10638d64b849f910d730ba102ed28a70&width=1200 1322w)
Luta armada
Alguns amigos de Olga resolveram defender o país na linha de frente da guerra. O governo ucraniano aprovou uma lei que permite a formação de equipes de defesa territorial, das quais os civis podem fazer parte.
Um deles estudou com Olga no colégio, é um amigo de infância. Oleksandr, de 36 anos, é gerente de logística em Dnipro. E agora treina para poder lutar. Outro é Petro, de 45 anos, amigo dos pais de Olga. Cada um deles tem dois filhos e todos continuam na Ucrânia
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ITXB4CO2UROYTN45TS4IEGKF7Y.jpg?quality=80&auth=fb2cc3faa13b11233b49cb84f2e8f5d2bf5457bcb0ab1a01ca15c448e8913db8&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ITXB4CO2UROYTN45TS4IEGKF7Y.jpg?quality=80&auth=fb2cc3faa13b11233b49cb84f2e8f5d2bf5457bcb0ab1a01ca15c448e8913db8&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/ITXB4CO2UROYTN45TS4IEGKF7Y.jpg?quality=80&auth=fb2cc3faa13b11233b49cb84f2e8f5d2bf5457bcb0ab1a01ca15c448e8913db8&width=1200 1322w)
É preciso se cadastrar num escritório local do Exército ucraniano, passar por uma entrevista mínima e receber as instruções e treinamento básico, então recebem as armas. Olga explica que a forma de ajudar vai além. “Alguns voluntários são médicos ajudando. Outros doam os carros deles ao Exército. Outros compram as roupas e coletes a prova de balas.”
As crianças e a guerra
A maior parte dos mais de 800 mil refugiados da guerra da Ucrânia são mulheres e crianças. Mas explicar o que está acontecendo para aquelas crianças que continuam nas cidades ucranianas é uma tarefa difícil.
As crianças são levadas com brinquedos para os bunkers e os pais tentam tornar alguns momentos lúdicos para evitar sustos maiores. É o caso de Diana, de 6 anos, filha de Ihor, primo de segundo grau de Olga. Quando a menina deixa o bunker na cidade de Lutsk, a primeira reação é de alegria. A família deixou Kiev e está morando em Lutsk por ser mais seguro para as crianças (Diana e seu irmão de 1 ano de idade).
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/MQ5PJ7YXRNKADKGAVGBVNQMVGU.jpg?quality=80&auth=043f8a59c8169e2cad68f42e2cbff35f7278c2f9a327955a0bdf6ab44f1fad9c&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/MQ5PJ7YXRNKADKGAVGBVNQMVGU.jpg?quality=80&auth=043f8a59c8169e2cad68f42e2cbff35f7278c2f9a327955a0bdf6ab44f1fad9c&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/MQ5PJ7YXRNKADKGAVGBVNQMVGU.jpg?quality=80&auth=043f8a59c8169e2cad68f42e2cbff35f7278c2f9a327955a0bdf6ab44f1fad9c&width=1200 1322w)
“A conversa com as menores, começou como uma brincadeira. Mas as bombas caindo não permitiram que isso durasse muito. Os maiores já entendem tudo. ‘Mamãe, você falou que a sua vovó sobreviveu à 2.ª Guerra. Então a gente vai conseguir sobreviver também’, foi a conversa que a filha de um dos meus amigos teve com a mãe dela”, diz Olga.
Refugiados
Entre uma refeição e outra para os soldados ucranianos, Viktor e Svitlana também recebem em sua casa deslocados da cidade de Kharkiv e ajudam no que é preciso.
Segundo o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), o número de deslocados deve crescer, assim como o de refugiados é preciso garantir a proteção deles. “As pessoas deslocadas internamente devem ser protegidas e seu acesso a um lugar seguro garantido”.
![](https://www.estadao.com.br/resizer/v2/VP3ZPLON2FNGFGBAXIKPZTYATY.jpg?quality=80&auth=9b0d12171b0495dbb71df2f8323e3df44b95b8a172ffb0425e908f5d81476295&width=380 768w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/VP3ZPLON2FNGFGBAXIKPZTYATY.jpg?quality=80&auth=9b0d12171b0495dbb71df2f8323e3df44b95b8a172ffb0425e908f5d81476295&width=768 1024w, https://www.estadao.com.br/resizer/v2/VP3ZPLON2FNGFGBAXIKPZTYATY.jpg?quality=80&auth=9b0d12171b0495dbb71df2f8323e3df44b95b8a172ffb0425e908f5d81476295&width=1200 1322w)
Segundo o Comitê, muitos ucranianos já estão sem água, eletricidade e conectividade. “A primeira preocupação das pessoas é com suas famílias, as pessoas estão tentando desesperadamente entrar em contato com seus familiares, mas a conectividade com a internet é muito ruim”, informou o CICV em nota.