A Alemanha consegue sobreviver das reservas existentes de gás natural até meados de dezembro, quando começa o inverno europeu, se a Rússia cortar o fornecimento de forma imediata - como fez com a Polônia e com a Bulgária nesta terça-feira, 26. A informação é do ministro da Economia e vice-chanceler do país, Robert Habeck.
Segundo Habeck, a sobrevivência durante o inverno sem o gás russo é mais difícil e para isso o país precisaria de “mais trabalho a toda velocidade”. A declaração foi feita durante uma entrevista coletiva na qual Habeck apresentou um novo pacote de subsídios destinados a ajudar os alemães a compensar os custos mais altos de energia.
O alerta para um possível corte do fornecimento do gás no país, que antes da guerra importava 55% do seu gás da Rússia, foi ligado após a energética russa Gazprom anunciar o corte na Bulgária e na Polônia. Nesta quarta-feira, o presidente Vladimir Putin falou durante uma reunião com deputados de São Petersburgo que novas retaliações seriam feitas contra qualquer país que criasse “ameaças de natureza estratégia inaceitáveis para a Rússia”.
A declaração de Putin é feita um dia depois da Alemanha mudar a sua política e anunciar o envio de armas pesadas para a Ucrânia pela primeira vez em dois meses de guerra. Além disso, o país também começou a repensar a sua resistência aos embargos contra o petróleo e o gás russos planejados pela União Europeia. “Esta é uma ameaça velada à Alemanha – Berlim está atualmente avaliando até que ponto ela e a UE podem sancionar as exportações russas de energia, e as ameaças russas são direcionadas para mudar seu cálculo”, disse Jonathan Hackenbroich, membro de políticas do Conselho de Relações Exteriores da UE.
Um corte total de gás para a Alemanha “teria consequências terríveis para as economias alemã e europeia”, acrescentou Hackenbroich. “As fábricas teriam que conter a produção ou até fechar. Algumas indústrias-chave podem ser perdidas para sempre e, na verdade, é difícil avaliar toda a gama de consequências. Mas a Rússia também é altamente dependente da receita das exportações de energia, pois elas representam sua última grande salvação”, disse.
Mesmo sem o corte, as consequências da guerra na Ucrânia e das ações da Rússia pioram as expectativas de crescimento da Alemanha este ano, que passaram de 3,6% para 2,2%, principalmente por causa do aumento do custo de energia.
Economistas avaliam que a queda na expectativa reflete o que a Europa pode enfrentar se o corte de gás se espalhar para outros países ou se o bloco europeu impor um embargo ao gás russo. Na semana passada, o Fundo Monetário Internacional (FMI) diminuiu sua previsão de crescimento em 2022 para os países que usam o euro de 3,9% (estimativa de janeiro) para 2,8%. A Alemanha, que é a maior economia do bloco, tem o maior impacto previsto.
O euro caiu nesta quarta-feira abaixo de US$ 1,06 pela primeira vez em cinco anos devido às crescentes preocupações com a segurança energética e uma desaceleração no crescimento europeu. A moeda caiu quase 4% em relação ao dólar americano somente em abril.
O anúncio da Gazprom contra Polônia e Bulgária provavelmente não leva a Europa a uma nova recessão imediatamente porque o bloco ainda possui “muitas respostas de política diplomática e fiscal disponíveis”, segundo a avaliação de Mark Haefele, diretor de investimentos do UBS. Entretanto, aumenta o risco de uma guerra energética em um momento vulnerável, em que as empresas europeias já enfrentam custos de energia mais altos, que ameaçam as margens de lucros e diminuem o poder de compra dos consumidores.
A União Europeia elabora planos para um embargo ao petróleo russo, mas não fez menção à medida após o corte da Gazprom. O bloco proibiu o carvão russo este mês.
Na avaliação de Casrten Brzeski, chefe global do ING Bank, um embargo ao gás desencadeará uma recessão europeia, e a alta inflação “se tornaria uma inflação ainda mais alta”. “Tudo isso é claramente negativo para as perspectivas de curto prazo”, disse. “Mas, para piorar, os altos preços de energia e commodities e cadeias de suprimentos interrompidas colocarão em risco a competitividade internacional da Europa.”
Para Holger Schmieding, economista-chefe do Berenberg Bank, as questões econômicas que podem desencadear de um embargo envolvem um cálculo político sobre as suas consequências na guerra. “Se seria ou não um preço que valeria a pena pagar para restringir a capacidade da Rússia de sustentar uma longa guerra é, em última análise, um julgamento político que vai muito além de um mero cálculo econômico”, disse. /NYT
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