Manifestantes foram às ruas da França nos últimos dias para protestar contra o assassinato do adolescente Nahel M., de 17 anos, por um policial durante uma blitz de trânsito na terça-feira, 27. A morte do jovem reacende traumas do país e gera revolta na sociedade francesa.
O presidente da França, Emmanuel Macron, e outros nomes importantes, como o jogador de futebol Kylian Mbappé, do Paris Saint-Germain (PSG), repudiaram a violência contra o jovem. Macron também criticou a violência dos protestos, que resultaram em detidos, policiais feridos e incêndios.
A onda de protestos desencadeada pede “Justiça para Nahel” e o fim da violência contra jovens. Segundo o jornal Le Monde, a mãe do adolescente esteve presente nos protestos na cidade de Nanterre, onde o caso aconteceu, seguida de centenas de pessoas. Nesta quinta-feira, 29, os manifestantes fazem mais uma marcha contra a violência.
O caso
Segundo o boletim policial, Nahel foi morto por um policial após tentar atropelar dois policiais durante uma blitz de trânsito.
Entretanto, um vídeo que circula nas redes sociais mostra que o policial aponta a arma para o adolescente e atira à queima-roupa quando este liga o automóvel. Na gravação, verificada pela Agência France-Press, é possível ouvir a frase “você vai tomar um tiro na cabeça”, mas não está claro quem a pronuncia.
A fuga do jovem terminou alguns metros adiante, quando o carro bateu contra um poste. A vítima faleceu pouco depois de ter sido atingido no tórax.
O agente de 38 anos que atirou contra o jovem está detido pela polícia como parte da investigação de homicídio doloso por parte de um funcionário público, afirmou o Ministério Público da França.
Repúdio nacional
A repercussão da morte do adolescente desencadeou manifestações já na terça-feira, data em que ocorreu. Os protestos continuaram no dia seguinte e acabaram com carros incendiados, detidos e policiais feridos. “Nossa cidade acordou em choque, abalada, marcada e preocupada com esta onda de violência”, disse o prefeito de Nanterre, Patrick Jarry, que também fez apelo por calma e pediu “Justiça para Nahel”.
Cerca de 77 pessoas foram detidas na região de Paris na segunda noite de protestos, segundo o balanço policial. As manifestações se estenderam a outras regiões da França, como Lyon, Toulouse e Lille. “Estamos cansados deste tratamento. Isto é por Nahel, nós somos Nahel”, gritaram jovens que participaram dos protestos.
Um jardim de infância foi danificado e veículos da polícia foram queimados em Neuilly-sur-Marne, na região metropolitana de Paris. Em Toulouse, manifestantes dispararam fogos de artifício contra policiais.
Para a primeira-ministra francesa, Elisabeth Borne, as imagens sugerem que o procedimento policial não foi seguido de forma correta. O jogador de futebol Kylian Mbappe declarou que a situação é “inaceitável”.
O presidente Emmanuel Macron também repudiou a violência contra o jovem, mas disse que a ação dos manifestantes é “injustificável”. “As últimas horas foram marcadas por cenas de violência contra uma delegacia, mas também contra escolas, câmaras municipais e, portanto, contra as instituições e a República”, declarou Macron no Palácio do Eliseu.
Com a continuidade dos protestos nesta quinta-feira, cerca de 40 mil policiais foram mobilizados para tentar conter os manifestantes.
Histórico
A tragédia evoca a recordação dos distúrbios de 2005 nos subúrbios das grandes cidades, depois que dois adolescentes morreram eletrocutados quando fugiam da polícia em Clichy-sous-Bois, ao noroeste de Paris.
Na ocasião, o governo do então presidente conservador Jacques Chirac decretou estado de emergência pela primeira vez na França metropolitana desde o fim da guerra de independência da Argélia. Os dois policiais acusados foram absolvidos em 2015.
O caso de Nahel também reacendeu o debate sobre as mortes por “recusa em cumprir” ordens policiais, que tem crescido na França. No ano passado, ao menos nove pessoas morreram de forma semelhante, segundo o Le Monde.
Os tiroteios com a polícia não são comuns na França, mas os ativistas acusam a força policial do país de ações discriminatórias e de perfil racial, que, segundo eles, ficam impunes.
Repercussão política
A morte de Nahel respinga no governo de Macron, que se vê dividido entre o repúdio da esquerda pela morte do jovem e o sindicato dos policiais. As críticas de Macron à morte geraram desconforto entre a categoria, enquanto as críticas aos manifestantes o deixa em situação delicada também com a esquerda.
O líder da direita Éric Ciotti e a extrema direita pediram o acionamento imediato do estado de emergência na França, mas, de acordo com fontes ouvidas pela AFP, a medida não é considerada pelo governo no momento. /Com informações da AFP
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