Em 2016, completou 100 anos o Tratado das Índias Ocidentais dinamarquesas, quando foi transferida a soberania sobre as ilhas caribenhas de São João, São Tomás e Santa Cruz, da Dinamarca para os Estados Unidos, por US$ 25 milhões (nos valores atuais de US$ 550 milhões).
O acordo removeu as barreiras comerciais entre as Ilhas Virgens e a superpotência econômica de sua região e impediu que caíssem nas mãos dos alemães durante a 1.ª Guerra. Essa foi a última vez em que um país vendeu diretamente o controle sobre um território para outra nação.
Tais transações já foram comuns – a compra da Louisiana da França pelos Estados Unidos em 1803 e a do Alasca da Rússia em 1867 foram grandes exemplos – e permanecem perfeitamente legais sob as leis internacionais. Mas nessa era pós-colonial, as fronteiras só se movem quando um país de divide, quando as nações resolvem uma disputa ou, ocasionalmente, pelo uso da força, e não porque dois governos simplesmente concordam em negociar um pedaço de terra.
E se isso mudasse? Com um pouco de imaginação, é possível ver um mercado grande e variado para tais negócios. A mudança climática poderia incentivar a demanda. Países cuja existência é ameaçada por ela, como Nauru (ilha na Oceania que pode ser inundada por causa da elevação do nível do mar), têm um poderoso incentivo para adquirir ilhas de altitudes mais elevadas de países vizinhos, como as Ilhas Salomão.
Países pequenos, ricos e densamente povoados seriam compradores naturais de países pobres, mas ricos em terras. Nenhum governo árabe poderia vender terras israelenses e esperar se manter no poder. Mas este ano o Egito cedeu o controle de duas ilhas disputadas do Mar Vermelho para a Arábia Saudita pouco depois de receber apoio financeiro do reino, apesar de um tribunal ter anulado a decisão.
Disputas territoriais
A venda de terras poderia resolver disputas territoriais. Em vez de lutar para impedir que a poderosa China conquiste ilhas disputadas no Mar do Sul da China, as Filipinas e o Vietnã poderiam trocá-las por dinheiro em espécie? A Nigéria ainda está em ebulição pelo veredicto de 2002 da Corte Internacional de Justiça entregando a Península de Bakassi a Camarões; teria sido muito mais eficiente pagar pela reivindicação de Camarões.
A Rússia poderia formalizar sua anexação da Crimeia, ajudando a pagar algumas das dívidas da Ucrânia, possivelmente captando o dinheiro para isso, ao concordar em entregar o leste da Carélia, que conquistou na 2.ª Guerra, de volta para a Finlândia (no início de 1990, noticiou-se que Boris Yeltsin ofereceu o território por US$ 15 bilhões).
O Japão pode ter um interesse semelhante nas Ilhas Curilas e no sul da Ilha de Sacalina, produtora de petróleo, que perdeu para Stalin.
Por fim, há a questão do acesso ao mar. A Bolívia, sem litoral, poderia pagar ao Chile em gás para adquirir um porto no Pacífico, um desejo antigo. O comércio de Botswana teria um boom se comprasse um corredor para o mar, pela Namíbia.
Falência
Há um lado obscuro, porém. Hoje, os credores ficam com poucos recursos quando os devedores soberanos vão à falência. Se os governos estivessem dispostos a comprar terras, no entanto, os emissores teriam um ativo altamente comercializável que seus credores poderiam exigir que eles penhorassem. Inadimplentes em série como a Argentina poderiam tomar empréstimos até deixar de existir.
Ainda mais alarmantes seriam as compras de motivação militar. A Coreia do Norte e o Irã poderiam tornar irrelevantes os bilhões gastos em defesa contra mísseis ocidentais com a aquisição de ilhas no Mediterrâneo ou no Caribe.
Será que os Estados Unidos ou seus aliados realmente pagariam o que fosse necessário para mantê-los fora de mãos indesejadas, permitindo que países como a Venezuela ou a Argélia organizassem uma guerra de lances? Pode ser mais barato invadir. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO
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