Os serviços de inteligência da Noruega afirmaram nesta sexta-feira, 28, que a verdadeira nacionalidade do suposto espião preso esta semana com cidadania brasileira é russa. O suspeito foi identificado como Mikhail Mikushin, de 44 anos. Segundo as investigações, ele fingia ser um pesquisador brasileiro com o nome José Assis Gianmaria, de 37 anos.
Preso na terça-feira, Mikushin está em um centro de detenção acusado de violar as leis de imigração. Desde a prisão, as autoridades estavam empenhadas em descobrir as “supostas ações de espionagem ilegal dirigida contra segredos de Estado, com o objetivo de prejudicar os interesses fundamentais da nação”.
As acusações podem ter pena de três anos de prisão. O suspeito concordou em permanecer em prisão provisória por quatro semanas, mas negou os crimes.
Antes de ser preso, Mikushin estava atuando como pesquisador na cidade de Tromso, localizada perto do Ártico, há cerca de um ano e meio. Ele se concentrou em estudar a política norueguesa na região, na qual o país compartilha 198 quilômetros de fronteira com a Rússia, e ameaças híbridas.
“O simples fato de entrar nos círculos de pesquisadores que fornecem às autoridades [informações] para definir sua política é algo de real interesse nacional”, argumentou um funcionário do serviço de inteligência norueguês, Thomas Blom, em uma coletiva de imprensa.
Segundo os investigadores, Mikushin procurou criar uma rede de contatos, lançar canais de informação e entrar nos círculos que lidam com informações confidenciais. Ele chegou a comparecer em seminários no qual eram exibidos métodos de como lidar com “desligamento do fluxo de gás após a explosão de um gasoduto” – em uma profunda semelhança com os vazamentos nos gasodutos da Nord Stream recentemente, que a Europa considerou resultado de sabotagem.
O jornalista investigativo Christo Grozev, do jornal holandês Bellingcat, informou que o nome Mikhail Mikushin corresponde ao de um coronel dos serviços de inteligência militar da Rússia (GRU). “Bom trabalho, Noruega. Eles conseguiram prender um coronel da GRU”, escreveu nas redes sociais. Esse cargo, contudo, não foi confirmado até o momento pelas autoridades norueguesas.
A prisão ocorreu depois que pelo menos sete russos – incluindo o filho de um associado próximo do presidente Vladimir Putin – foram detidos nas últimas semanas por pilotar drones ou tirar fotos perto de áreas de risco à segurança.
Em setembro, a Europa acusou sabotagem nos gasodutos Nord Stream, que transportam gás russo para o continente, após um vazamento do combustível. Depois disso, a Noruega e outros países iniciaram uma corrida para proteger a infraestrutura crítica da região e, segundo as autoridades, vários drones foram vistos próximos dos campos marítimos de petróleo e gás da Noruega e em aeroportos.
A enxurrada de incidentes deixa a Noruega – e a Europa – no limite. O setor de petróleo e gás é o núcleo da economia norueguesa. Desde que a Rússia lançou sua invasão em larga escala da Ucrânia, o país se tornou um fornecedor crítico para a Europa.
Antecedentes
Mikhail Mikushin estava realizando pesquisas na Universidade do Ártico da Noruega. Em resposta ao Estadão, a universidade informou que ele não foi oficialmente empregado da instituição, mas um pesquisador que ajudou a organizar palestras e seminários enquanto trabalhava na pesquisa.
Ainda de acordo com a universidade, a pesquisa não possuiu financiamento ou bolsa, sendo autofinanciada. Durante o período que esteve na universidade, não publicou nenhum artigo.
Em 25 de outubro, ele foi listado como pesquisador em um centro de estudos universitário chamado The Gray Zone. O nome dele foi retirado.
Antes de se mudar para a Noruega, Mikhail Mikushin morou no Canadá, onde frequentou a Carleton University e a University of Calgary. Em Ottawa, ele se ofereceu como voluntário para uma campanha política, de acordo com a Global News. Ele obteve o mestrado no Centro de Estudos Militares, de Segurança e Estratégicos da Universidade de Calgary em 2018.
Em 2019, ele escreveu um artigo para a Canadian Naval Review. O artigo, intitulado Terceira Base: O Caso de CFB Churchill, argumenta a favor do estabelecimento de uma base naval no norte do Canadá. /AFP, W.P.
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