Novas revelações ligam George Santos a primo de oligarca russo sancionado

Comitê de campanha do deputado filho de brasileiros recebeu doações de Andrew Intrater, primo de um oligarca russo sancionado nos EUA

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Por Isaac Stanley-Becker e Rosalind S. Helderman
Atualização:

George Santos, o congressista republicano novato que representa o Estado de Nova York e mentiu sobre sua biografia, possui laços mais estreitos do que previamente conhecido com um empresário que cultivou relações próximas com um indivíduo com que Donald Trump se confidenciou e é primo de um oligarca russo sancionado, de acordo com uma gravações em vídeo e documentos judiciais.

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Andrew Intrater e sua mulher doaram cada um a quantia máxima, de U$ 5,8 mil, para o principal comitê de campanha de Santos e outras dezenas de milhares de dólares desde 2020 para comitês ligados a ele, de acordo com registros da Comissão Eleitoral Federal. Intrater é primo do bilionário russo Viktor Vekselberg, que foi sancionado pelo governo dos Estados Unidos em razão de seu papel na indústria russa de energia.

A relação entre Santos e Intrater vai além de contribuições de campanha, de acordo com um depoimento concedido privadamente por Santos em 2020 e um registro judicial do ano seguinte em um processo aberto pela Comissão de Valores Mobiliários (SEC) contra a firma de investimentos Harbor City Capital, com base na Flórida, onde Santos trabalhou por mais de um ano.

Deputado George Santos sendo gravado por câmeras de TV após sair do seu gabinete no Capitólio, no dia 12. Filho de brasileiros, Santos possui relações com empresário ligado a oligarca russo Foto: Jabin Botsford / The Washington Post - 12/01/2023

Reunidas, as evidências sugerem que Santos pode ter mantido relação comercial com Intrater quando estreou na política, em 2020. Elas também mostram, de acordo com o registro na SEC, que Intrater colocou centenas de milhares de dólares na antiga empregadora de Santos, a Harbor City, que foi acusada pelos reguladores de coordenar uma pirâmide financeira. Santos e Intrater não responderam pedidos de comentários. Advogados que já representaram Intrater também não deram retorno.

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O congressista, cuja eleição por Long Island no ano passado ajudou o Partido Republicano a garantir sua diminuta maioria na Câmara, desculpou-se pelo que qualificou como “embelezamento de currículo” ao mesmo tempo que rejeitou pedidos por sua renúncia. Santos está sob investigação de promotores de Justiça em Nova York e no Rio de Janeiro.

Os laços entre Santos, de 34 anos, e Intrater, de 60, refletem as maneiras pelas quais o congressista encontrou apoio pessoal e político em seu caminho para a função pública.

Ainda que Intrater seja cidadão americano, sua empresa, a firma de investimentos Columbus Nova, teve relações extensas historicamente com os interesses empresariais de seu primo russo. Até 2018, quando Vekselberg foi sancionado pelo Departamento do Tesouro, seu conglomerado era o maior cliente da Columbus Nova, segundo a empresa confirmou ao Post naquele ano.

As interações de Intrater, em 2016 e 2017, com Michael Cohen, que na época trabalhava como advogado de Trump, foram analisadas pela investigação do ex-procurador-especial Robert Mueller III a respeito de interferência da Rússia na eleição de 2016 e possíveis ligações entre o ex-presidente e o Kremlin.

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A empresa de Intrater pagou ao advogado e autodescrito “fixer” de Trump para identificar contratos para seus negócios, e registros judiciais mostram que eles trocaram centenas de mensagens de texto e telefonemas. Intrater e Vekselberg não foram acusados de violações na investigação de Mueller.

Em 2020, quando Santos foi incumbido pela Harbor City de localizar investidores em Nova York, ele afirmou em uma reunião da empresa realizada por Zoom que a firma de investimentos de Intrater, a Columbus Nova, era sua “cliente”, de acordo com uma gravação de vídeo obtida pelo Washington Post.

Santos fez o comentário durante uma discussão a respeito das dificuldades de investir em imóveis, particularmente para investidores que colocavam dinheiro na torre de 427 metros de altura no número 432 da Park Avenue, em Manhattan, que por um período foi o edifício residencial mais alto do mundo. Intrater não respondeu a uma pergunta questionando se ele ou a Columbus Nova tinha envolvimento no projeto.

Imagem mostra Andrew Intrater, investidor de Manhattan e doador do ex-presidente Donald Trump, em 18 de junho de 2019. Primo de oligarca russo, Intrater também doou para a campanha de George Santos em 2022 Foto: Jeenah Moon/NYT

“Vocês podem saber quem eles são”, acrescentou Santos na reunião da empresa, referindo-se à Columbus Nova. “Eles viraram notícia em várias oportunidades, estiveram pesadamente envolvidos na investigação sobre a Rússia. Sem fundamento. Mas eles são uma imobiliária, são legítimos”, acrescentou Santos.

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Santos não respondeu a uma mensagem de texto pedindo seu comentário. Intrater não respondeu a um questionamento enviado por e-mail perguntando se sua firma era cliente de Santos, conforme alegado, e a respeito do depósito à Harbor City.

Mentiras de George Santos

O congressista mentiu sobre vários aspectos de sua experiência profissional. E, nas reuniões por Zoom da Harbor City analisadas pelo Post, ele relatou negócios com outros investidores proeminentes e organizações endinheiradas que essas entidades negaram ter ocorrido.

Mas a Harbor City foi capaz de obter um depósito de US$ 625 mil de uma empresa registrada no Mississippi que identifica Intrater como seu único operador, de acordo com uma prova incluída na queixa da SEC contra a Harbor City. O suposto depósito, que não foi datado, está incluído em um documento que lista várias entidades que, segundo a SEC, realizaram pagamentos para a Harbor City.

A empresa do Mississippi, FEA Innovations, é registrada em nome de Intrater, de acordo com registros da secretaria estadual. Os documentos de registro não incluem outros funcionários nem diretores e identificam o endereço de Intrater como o mesmo usado pela Columbus Nova na Madison Avenue em Manhattan. Agora a Columbus Nova é conhecida como Sparrow Capital.

Deputado republicano George Santos na Casa dos Representantes em Washington, no dia 5 deste mês. Santos é investigado por fraudes no currículo e crimes no Brasil Foto: Haiyun Jian/NYT

No processo da SEC, iniciado em abril de 2021, os reguladores acusaram a Harbor City e seu fundador de promoverem um “clássico esquema Ponzi” (pirâmide financeira) — prometendo aos investidores lucros confiáveis e, em vez disso, arrancando-lhes milhões.

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A queixa da SEC não identificou Santos, que negou conhecimento a respeito da suposta violação, apesar de ter sido informado por um possível investidor que a firma estava usando um documento bancário fraudulento, conforme o Post noticiou anteriormente.

O fundador da Harbor City, JP Maroney, negou as alegações da SEC, que foram apresentadas a um tribunal federal na Flórida. A empresa não respondeu na corte. Maroney não respondeu a uma mensagem de texto questionando-o a respeito do suposto depósito da firma de Intrater. A prova que identifica o suposto depósito da empresa de Intrater não fornece detalhes sobre seu propósito nem sugere que Intrater tinha conhecimento de alguma intenção de violações na Harbor City.

Depois que os ativos da Harbor City foram congelados, com a assistência de um ex-colega da Harbor City, Santos fundou uma empresa em 2021, a Devolder Organization, que lhe pagou pelo menos US$ 3,5 milhões ao longo dos dois anos seguintes, de acordo com registros empresariais da Flórida e formulários de informe financeiro que ele registrou ao se candidatar. Santos colocou na própria campanha mais de US$ 700 mil do próprio bolso, mas não relatou recebimentos da Harbor City apesar de ter sido pago pela empresa até abril de 2021.

Detalhes a respeito da passagem de Santos na Harbor City foram confirmados por um advogado indicado pela corte que supervisiona a liquidação dos ativos da empresa.

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A Columbus Nova tornou-se objeto de interesse da investigação de Mueller conforme os procuradores investigaram as relações forjadas por Intrater e sua empresa com Cohen, que era confidente de Trump na época.

Doações para Trump

Intrater doou US$ 250 mil para o comitê inaugural de Trump, de acordo com registros financeiros de campanha, e compareceu à inauguração em 2017 junto com Vekselberg. O Washington Post noticiou que os dois homens encontraram-se com Cohen no evento. Pouco depois, a Columbus Nova começou a pagar Cohen como parte de um contrato para recrutar novos investidores para a empresa, noticiou o Post. Registros jurídicos mostram que os pagamentos totalizaram US$ 583 mil.

Registros jurídicos também mostram que Cohen e Intrater trocaram mais de mil telefonemas e mensagens de texto entre novembro de 2016 e novembro de 2017. Intrater doou US$ 35 mil para comparecer a um evento de arrecadação de fundos para a reeleição de Trump atendendo ao convite de Cohen, noticiou o Post.

Autoridades federais interrogaram Intrater e Vekselberg durante a investigação, entrevistando Vekselberg quando seu avião privado fez uma escala nos EUA, em 2018, afirmaram fontes familiarizadas com a investigação.

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Cohen por fim se declarou culpado de violações em financiamento de campanha, fraudes fiscal e bancária e por mentir ao Congresso — temas não relacionados às suas interações com a Columbus Nova. Intrater disse ao New York Times em 2019 que sua ausência no relatório final de Mueller “confirma o que eu sabia desde o início — que eu não fiz nada de errado”.

Posteriormente Cohen se voltou contra Trump, criticando-o em uma audiência no Congresso, em 2019, e cooperando com investigações sobre as práticas empresariais de seu ex-chefe.

Vekselberg e sua empresa, Renova, foram sancionados pelo Departamento do Tesouro em abril de 2018, citados por se beneficiar da “atividade maligna ao redor do planeta” do presidente russo, Vladimir Putin. Em abril de 2022, após a invasão da Rússia à Ucrânia, o iate de US$ 90 milhões de Vekselberg foi confiscado por autoridades da Espanha a pedido dos EUA.

A Columbus Nova é descrita há muito como associada próxima do Renova Group, um conglomerado russo controlado por Vekselberg. Até 2017, um website do Renova Group listava a Columbus Nova como uma de suas empresas, e a Columbus Nova confirmou ao Post em 2018 que o conglomerado de Vekselberg era então seu maior cliente. Contudo, a firma afirmou na época que pertencia a americanos e que nunca tinha sido controlada pelo Renova Group nem por Vekselberg. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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