O Twitter está um caos e a gente deve isso a Elon Musk

“Sob Musk, a rede parece ter perdido o que o fazia impossível de ser batido: sua centralidade”

PUBLICIDADE

Por Farhad Manjoo

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Cerca de seis meses atrás, Elon Musk comprou seu bar favorito no bairro. Em seguida, ele demitiu seguranças e bartenders veteranos, tentou enganar o proprietário e pelo menos um fornecedor e exigiu que os frequentadores pagassem uma consumação mínima. Ele frequentemente se esforça para atender seus clientes, mas os penaliza por mencionar a concorrência. Na verdade, ele acabou com a folia em geral - muitas conversas em seu bar foram abafadas pela própria performance interminável de Musk, que consiste principalmente em fazer piadas inconvenientes para os clientes através de um megafone.

Vamos servir uma para o Twitter, então. Eu estava aberto à compra da rede social por Musk, mas meio ano depois, acho que foi um desastre absoluto. Musk foi rápido e destruiu quase tudo - a velocidade e a totalidade com que ele arruinou o site foram quase impressionantes. Pelas próprias contas de Musk, a empresa agora vale menos da metade do que ele pagou por ela. Perdeu muitos grandes anunciantes, a maioria de seus funcionários e, com eles, grande parte de sua funcionalidade.

Elon Musk, CEO do Twitter, que relaxou o controle de conteúdo quando comprou a rede social. Foto: Daniel Oberhaus / Creative Commons

PUBLICIDADE

Mais do que isso, o Twitter sob Musk parece ter perdido o que o fazia impossível de ser batido: sua centralidade. O site já foi o local on-line de maior importância, não apenas um disseminador de notícias de última hora e comentários, mas algo como um árbitro. Em seu auge cultural, de cerca de 2015 a talvez 2020, o que as pessoas falavam no Twitter parecia definir a agenda para discussões em outros lugares. Mesmo no ano passado, ele ainda era importante: depois de anos de má gestão e inovação inexpressiva, o Twitter, na véspera do reinado de Musk, ainda era o único local a visitar quando algo importante acontecia em qualquer lugar.

O que quer que seja o Twitter agora, ele não é mais esse lugar. A relevância cultural é difícil de quantificar, mas você a reconhece quando a sente. E agora, quando algo está acontecendo, o Twitter raramente parece o lugar onde todos se reúnem para assistir.

Percebi isso quando Donald Trump foi indiciado. Trump, o tuiteiro mais poderoso que o mundo já conheceu, um homem cujos erros de digitação poderiam levar o Twitter à loucura, compareceu ao tribunal e o Twitter foi, como disse Shirin Ghaffary, da Vox, “uma festa da soneca”.

Publicidade

Pode haver muitas razões para a soneca, incluindo que as pessoas se importam menos com Trump do que costumavam - ou que, mesmo depois de Musk restabelecer a conta suspensa de Trump no Twitter, o ex-presidente continuou usando a plataforma que fundou, a Truth Social, para suas missivas ad hoc.

Mas eu apostaria que grande parte do problema decorre das mudanças que Musk fez no feed de notícias do Twitter.

Hoje em dia, muitas vezes é difícil saber o que está acontecendo no Twitter. As mudanças egoístas de Musk no algoritmo de classificação do site reduziram significativamente sua usabilidade: onde o Twitter já foi agradavelmente variado, oferecendo tuítes de pessoas comuns de maneira bastante equilibrada com os de celebridades e políticos, ele agora parece destacar os mesmos poucos usuários o tempo todo. (Adoro seus tuítes, Matt Yglesias, mas gostaria que você não estivesse sempre no topo do meu feed!)

Outros sinais do declínio da relevância do Twitter: várias organizações de notícias, incluindo o The New York Times, disseram que não pagarão pelo Twitter Blue, o serviço de assinatura de Musk para adquirir um selo de usuário verificado no site. A NPR disse que pararia de postar em suas contas oficiais do Twitter porque o Twitter a rotulou como “mídia afiliada ao estado” e depois como “mídia financiada pelo governo”. A PBS, que também foi rotulada como “financiada pelo governo”, disse que também pararia de tuitar em protesto contra o rótulo. (A NPR é uma organização sem fins lucrativos que recebe muito pouco financiamento do governo; o rótulo, diz ela, mina sua credibilidade.)

Musk não gosta da mídia de notícias - o endereço de e-mail de relações públicas do Twitter responde automaticamente com um emoji de cocô - mas não consigo ver como brigar com a mídia pode ajudar seu site. Correndo o risco de me gabar, as organizações de mídia são vitais para o Twitter porque as notícias estão no centro da utilidade do site.

Publicidade

Musk disse que os algoritmos do Twitter não recomendam usuários não verificados em sua seção “Para você” e que os selos de verificação gratuita - os cheques azuis simultaneamente cobiçados e caluniados - que muitos jornalistas possuem foram removidos. A mudança reduz ainda mais a utilidade do Twitter: se muitos jornalistas forem removidos dos feeds principais do site, por que as pessoas continuariam a acessá-lo como sua principal fonte de notícias?

PUBLICIDADE

Como um tuiteiro de longa data, a destruição operada por Musk me entristece e me irrita. Os funcionários e usuários do Twitter não mereciam esse destino. Nas mãos de um líder menos volátil e mais ponderado, o Twitter poderia ter sido muito mais do que o feudo esfarrapado de um bilionário suscetível que ele se tornou.

Mas como uma pessoa que quer viver em um mundo justo com pessoas amigáveis e coisas boas, não estou totalmente chateado com o declínio do Twitter. Como argumentei antes, o Twitter tem sido uma fonte de desinformação, um acelerador da polarização e um contribuinte para o pensamento cultural de grupo. Pouco antes da aquisição de Musk, minha colega do Times, Michelle Goldberg, preocupada com problemas semelhantes, esperava um incêndio rápido e espetacular: “Se Musk tornar o Twitter horrível o suficiente”, escreveu ela, “os usuários fugirão e ele se tornará menos relevante”.

Bem, parece que Michelle acertou. Acabe com ele, Elon: o Twitter já era. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.