Opinião | O que a invasão da embaixada do México no Equador significa para Daniel Noboa

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Por Sebastián Hurtado

QUITO – O Equador pode não ser um grande jogador na arena global, mas não é estranho a grandes controvérsias envolvendo asilos diplomáticos e operações policiais dentro de embaixadas. O fundador do Wikileaks, Julian Assange, passou um extenso período solicitando asilo na Embaixada Equatoriana em Londres, até que foi removido à força por autoridades do Reino Unido e do Equador em 2019. Por sete anos, esse caso colocou o Equador no centro de uma complexa rede de disputas internacionais, desafiando normas do asilo político e tensões entre soberania e direito internacional.

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Agora o Equador encontra-se novamente envolvido em uma disputa diplomática internacional. Em 5 de abril, a policiais e militares equatorianos entraram à força na Embaixada Mexicana em Quito para prender o ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas, que foi condenado pela Justiça e era procurado. O movimento radical, sem precedentes no país latino-americano, motivou o México a suspender relações diplomáticas com o Equador, intensificou o drama político equatoriano e projetou novas sombras em suas relações internacionais.

Fortes reações locais têm se dividido principalmente ao longo de linhas políticas, com um lado apoiando o movimento citando a necessidade de combater a impunidade a qualquer custo e o outro tecendo críticas e qualificando-o como um ato autoritário motivado politicamente contra uma figura da oposição. Os observadores mais equilibrados levantaram sérios questionamentos sobre as implicações mais amplas dessas ações contra convenções diplomáticas, soberania de embaixadas e direitos políticos no Equador.

Imagem mostra presidente do Equador, Daniel Noboa, na chegada a um evento em El Quinche, interior do país, em 8 de abril. Ação de invadir embaixada mexicana em Quito para prender opositor afeta globalmente o governo equatoriano Foto: Dolores Ochoa/AP

No curto prazo, o incidente provavelmente será interpretado localmente como uma forte mensagem do governo de Daniel Noboa contra corrupção e impunidade, alinhando-se com promessas eleitorais e expectativas públicas anteriormente a um referendo convocado pelo governo para este mês. Ao definir suas ações contra Glas e a máquina política associada como uma cruzada por integridade e legalidade, Noboa seduz a maioria dos equatorianos desiludidos com o status quo político. Essa narrativa, que o retrata como um outsider que desafia poderes corruptos estabelecidos, poderia impulsionar sua credibilidade doméstica e posicioná-lo favoravelmente para a eleição presidencial do próximo ano.

Mas esse movimento impetuoso ocasiona comparações renovadas entre Noboa e o presidente autoritário de El Salvador, Nayib Bukele. Noboa desconsiderou comparações desse tipo no passado, argumentando que é um democrata e que o “modelo Bukele” não funcionaria no Equador. Mas ele parece incrivelmente inclinado a fazer uso de gestos mais radicais — como lançar uma “guerra” interna contra organizações criminosas sem precedentes — para ganhar peso político. Alguns comentaristas locais e até apoiadores de Noboa já levantaram preocupações a respeito do que consideram um desvio na direção do autoritarismo, uma tendência que poderia se intensificar em um segundo mandato de duração completa.

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Rompendo com o correísmo

Por outro lado, a prisão dentro da embaixada prejudicou irrevogavelmente a já frágil relação entre o governo do presidente Noboa e o correísmo, o movimento associado ao ex-presidente Rafael Correa, que apoia o agora encarcerado ex-vice-presidente Glas e passou a exigir a renúncia de Noboa. Esse rompimento fere no peito o ordenamento legislativo e governamental do Equador. Com o correísmo representando o maior bloco no Congresso e exercendo uma influência ainda considerável, apesar de enfraquecida, sobre a política nacional, essa fissura sugere um período iminente de polarização política renovada, impasses e confrontos, o que poderia prejudicar colaborações políticas recentes entre Noboa e forças da oposição que até aqui o ajudaram a avançar com reformas no Congresso.

De uma perspectiva internacional, é difícil perceber algum lado positivo nas ações do equatoriano, que, até aqui, têm sido criticadas pela maioria dos governos, das organizações internacionais e dos observadores na região. A comunidade internacional tem colocado foco no que pareceu uma incursão injustificada do governo equatoriano em uma embaixada soberana para prender uma figura da oposição e no problemático precedente que esse movimento poderia estabelecer em relação a representações diplomáticas em todo o mundo. Pouca atenção será dada aos detalhes sobre o ex-vice-presidente condenado merecer ou não asilo ou o México estar ou não exacerbando convenções internacionais ao abrigá-lo na embaixada.

É por esse motivo que, ao contrário de crises anteriores nas quais as reações dividiram-se entre governos de esquerda e de direita em toda a região, desta vez não foi esse o caso, com apenas uns poucos aliados próximos do governo equatoriano, notavelmente os Estados Unidos, abstendo-se de condenar inteiramente as ações do governo equatoriano — e em vez disso enfatizando a “obrigação de países anfitriões sob o direito internacional de respeitar a inviolabilidade de missões diplomáticas”.

A batalha na CIJ

Portanto, o Equador encarará uma dura batalha na Corte Internacional de Justiça e em outros organismos internacionais e regionais. Uma decisão internacional sobre a questão provavelmente tardará. Ainda assim, as resoluções políticas condenando os eventos em Quito influenciarão imediatamente a posição do Equador e do governo Noboa em particular. Poderiam até enfraquecer processos judiciais locais ou internacionais contra Glas e outras figuras políticas equatorianas.

Mesmo que o México não seja um grande parceiro comercial ou de investimento para o Equador (as exportações equatorianas e o IED mexicano rondaram aproximadamente US$ 200 milhões e US$ 6,7 milhões respectivamente em 2023), o país tem uma influência geopolítica imensa sobre outras áreas de interesse equatoriano. Por exemplo, o México tem poder de veto na Aliança do Pacífico, um grande bloco regional ao qual o Equador tenta aderir como membro pleno há vários anos, uma possibilidade que agora parece ainda mais remota. O México poderia também usar sua influência sobre várias nações caribenhas para bloquear ou atrasar a aprovação da Lei IDEA, que incluiria o Equador na Lei de Recuperação Econômica da Bacia Caribenha, um projeto legislativo que pretende prover acesso livre de tarifas ao mercado americano tramitando atualmente no Congresso americano.

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O conflito diplomático também ocorre num momento em que o México tornou-se a rota de trânsito mais crucial para dezenas de milhares de equatorianos que tentam entrar ilegalmente nos EUA, um fluxo humano que, de acordo com autoridades mexicanas, aumentou 220% apenas no ano passado. E também num momento em que os cartéis mexicanos de narcotráfico figuram como jogadores críticos na massiva expansão do comércio de cocaína — acompanhada de um pico de violência — que ocorre em todo o Equador nos anos recentes, uma situação que deveria demandar uma cooperação próxima em segurança entre os dois países.

Imagem do dia 6 mostra cidadãos mexicanos em um protesto na frente da Embaixada do Equador em Cidade do México. México cortou relações diplomáticas com o Equador após ter embaixada invadida Foto: Ginnette Riquelme/AP

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Finalmente, é bastante preocupante que um governo dependente em relação ao FMI e de apoios multilaterais para lidar efetivamente com desafios financeiros prementes esteja disposto a uma jogada geopolítica tão arriscada durante negociações de um novo programa. Essas negociações dificilmente sairão dos trilhos por causa desse episódio, mas somente em razão do apoio político sem precedentes que o governo dos EUA está provendo ao presidente Noboa.

Na essência, ainda que aprofunde divisões políticas e alimente estabilidades, esse novo drama na embaixada também oferece ao presidente Noboa uma oportunidade de definir suas ações como parte de uma luta maior contra a corrupção e a influência do crime na política e fortalecer seu apelo entre eleitores à procura se uma liderança mais forte e uma nova direção para o país.

Esse cenário ambíguo sublinha a complexidade da dinâmica política na América Latina, onde ações que dividem também são capazes, no curto prazo, de fortalecer a mão do líder satisfazendo desejos do público por justiça e responsabilizações. Contudo, de uma perspectiva internacional, isso cimentará ainda mais a percepção sobre o Equador enquanto um país estruturalmente instável, com pouco respeito às normas internacionais e constantemente sujeito aos caprichos de líderes políticos locais esforçando-se por ganhos políticos de curto prazo. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Opinião por Sebastián Hurtado

Fundador e presidente da proeminente consultoria de risco político PRóFITAS, sediada em Quito

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