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O que as mudanças de Putin na Defesa da Rússia significam para a guerra na Ucrânia

Sergei Shoigu foi demitido após denúncias de corrupção de aliados e desejo de Moscou por ‘inovação’; o substituto é um economista que tem o desafio de conduzir a economia de guerra russa

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Foto do author Daniel Gateno

Sergei Shoigu sobreviveu a muitos percalços desde que a Rússia invadiu a Ucrânia em fevereiro de 2022. O ministro da Defesa continuou no cargo apesar das perdas no campo de batalha para as forças de Kiev no início da guerra, também se manteve em seu posto mesmo quando o então chefe do Grupo Wagner Ievgeni Prigozhin lançou um motim de 24 horas e quase marchou com tanques de guerra em direção a Moscou exigindo a sua demissão em junho do ano passado. Contudo, casos de corrupção e o desejo de adaptar a economia russa para uma longa guerra fizeram com que Vladimir Putin optasse por sua demissão no dia 13 de maio.

Mudanças nos cargos de confiança do presidente russo não são comuns. Shoigu estava em seu posto há 12 anos e é considerado um aliado leal e amigo de Putin, com direito a diversas fotos dos dois em viagens para caçar e pescar. Shoigu foi substituído por Andrei Belousov, um economista e civil.

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“Hoje, no campo de batalha, o vencedor é aquele que está mais aberto à inovação”, explicou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, em uma coletiva de imprensa após a saída de Shoigu. “Portanto, é natural que, no estágio atual, o presidente tenha decidido que o ministério da Defesa russo deveria ser chefiado por um civil.”

Mesmo com a explicação de Peskov, a saída do ex-ministro ocorreu após a prisão de dois aliados por denúncias de corrupção. Timur Ivanov, ex-vice-ministro de Defesa da Rússia e o general Yuri Kuznetsov foram presos por acusações de suborno.

“A necessidade de continuar esta guerra de atrito com a Ucrânia junto com as denúncias de corrupção de aliados de Shoigu contribuíram para a sua saída”, avalia Vitelio Brustolin, professor de relações internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador de Harvard. O analista notou que outros membros importantes do setor de defesa continuaram em seus cargos, como o chefe do Estado-Maior da Rússia, Valeri Gerasimov.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, participa de um desfile militar ao lado do então ministro da Defesa da Rússia, Sergei Shoigu, em Moscou, Rússia  Foto: Alexander Zemlianichenko/AP

Saída de Shoigu

A demissão de Shoigu foi concretizada seis dias depois da cerimônia de inauguração do quinto mandato de Vladimir Putin como presidente da Rússia. Para Raphael Cohen, analista especializado em assuntos políticos e militares, da Rand Corporation, centro de estudos americano com base em Washington, Putin não considerou antes a demissão de Shoigu porque uma substituição no topo da pasta da Defesa representaria fraqueza. “O fato de que Putin iniciou o seu novo mandato permite que ele tenha mais espaço político para mudanças”.

Putin tinha todas as razões para demitir Shoigu, opina o analista. “A Rússia está em um momento melhor na guerra do que a Ucrânia, mas este conflito ainda está demorando muito mais do que o esperado e está muito mais sangrento e os fracassos militares da Rússia no começo da guerra são de responsabilidade de Shoigu “, destaca Cohen.

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Apesar da saída do cargo, até agora Shoigu não foi escanteado: ele foi apontado como o novo secretário do Conselho de Segurança da Rússia.

Sergei Shoigu foi apontado como o novo secretário do Conselho de Segurança da Rússia  Foto: Vyacheslav Prokofyev/AP

Economia de guerra

O presidente russo escolheu Andrei Belousov para consolidar a transição de Moscou para uma economia de guerra. O novo ministro da Defesa já chefiou a pasta da economia da Rússia, foi consultor econômico de Putin e ocupava o cargo de vice-primeiro-ministro. O fato de ser um civil não surpreende, já que Shoigu também era civil antes de assumir a pasta da Defesa. Para analistas entrevistados pelo Estadão, a escolha de um economista chama mais atenção.

“Faz sentido que o ministro da Defesa seja um economista neste momento”, avalia Vitelio Brustolin. Segundo o especialista, a Rússia está mobilizando a estrutura de seu Estado para o esforço de guerra, reforçando que está pronta para uma “guerra total”, que significa um conflito prolongado com Kiev.

“Na guerra total, as empresas montadoras de carros passam a produzir blindados, as companhias que produzem aviões para uso civil focam o seu trabalho no uso militar, o país também passa a produzir mais munição e este processo dá um impulso para a economia”, destaca o pesquisador de Harvard.

O ministro da Defesa, Andrei Belousov, participa de uma reunião com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, em Moscou, Rússia  Foto: Gavriil Grigorov/AP

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O novo foco de Moscou foi ressaltado por Peskov, o porta-voz do Kremlin, durante coletiva de imprensa após a saída de Shoigu. De acordo com informações fornecidas por ele, Moscou destina 6,7% de seu PIB para o setor de Defesa e Segurança e deve aumentar ainda mais a fatia, se aproximando dos gastos nos tempos de Guerra Fria.

Putin já ressaltou em diversas ocasiões que a Rússia está pronta para uma guerra mundial, sem descartar o uso de armas nucleares. “A Rússia fará todo o possível para evitar um confronto global, mas, ao mesmo tempo, não permitiremos que ninguém nos ameace. Nossas forças estratégicas (nucleares) estão sempre em alerta”, disse o presidente russo durante a celebração dos 79 anos da vitória soviética contra os nazistas, no dia 9 de maio.

Em uma referência a guerra na Ucrânia, o porta-voz do Kremlin afirmou que por “circunstancias geopolíticas”, a Rússia está próxima da situação dos anos 80, quando a União Soviética gastava 7,4% de seu PIB com o setor de Defesa e Segurança.

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Para Brustolin, Belousov também foi escolhido por ter conquistado a confiança de Putin em outras posições e não ter envolvimento com corrupção. “Com o histórico do ministério da Defesa, Putin olhou a ficha de Belousov antes de nomeá-lo e acredita que ele pode acabar com a corrupção na pasta”.

Momento positivo de Moscou

A mudança ocorre em um período positivo para a Rússia na guerra. Nos últimos meses, os russos se aproveitaram do aparente cansaço ocidental em enviar ajuda econômica e militar para a Ucrânia para atacar áreas de infraestrutura civil na Ucrânia. Usando diferentes tipos de bombas e mísseis, Moscou quis testar o sistema de defesa de Kiev em uma cartada para levar os ucranianos a rendição.

Depois de muita disputa entre republicanos e democratas, o Congresso dos Estados Unidos conseguiu aprovar um pacote para a Ucrânia de 61 bilhões de dólares no mês passado. O pacote inclui capacidades de defesa aérea, munições de artilharia, veículos blindados e outras armas para reforçar as forças ucranianas.

Mas os armamentos estão chegando no país do Leste Europeu a conta-gotas, possibilitando que os russos tivessem margem de manobra para o lançamento de uma ofensiva surpresa no dia 10 de maio, na região ucraniana de Kharkiv. As tropas de Moscou avançaram mais de 10 km na região, um dos avanços mais rápidos desde o início da guerra. Os militares ucranianos já admitiram a escassez de tropas e falta de munição.

Para o analista da Rand Corporation, a ajuda americana deve ajudar os ucranianos, mas eles precisam ser mais agressivos. “Os ucranianos precisam lutar de forma diferente, é necessário atacar o território russo. Até agora o governo Biden está relutante em permitir que os ucranianos usem armas americanas em alvos dentro da Rússia, o que é compreensível, mas a melhor estratégia seria essa”, avalia Cohen.

Mas segundo informações do jornal The New York Times, a Casa Branca está discutindo um relaxamento das restrições do uso de armas americanas em ataques dentro da Rússia. A possível mudança de postura ocorreu após a visita do secretário de Estado americano, Antony Blinken, a Kiev.

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De acordo com o jornal, a posição de Blinken mudou justamente porque os russos abriram uma nova frente na guerra, com resultados devastadores. Moscou posicionou suas armas no nordeste ucraniano, sabendo que as tropas de Kiev só seriam capazes de usar drones não americanos e outras armas em resposta.

“O pacote americano vai fazer alguma diferença para Kiev, mas os ucranianos precisam fazer mais do que isso para reverter o momento positivo da Rússia no campo de batalha”, destaca o analista.

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