Ao falar sobre seu encontro com o novo monarca britânico, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está em Londres para a cerimônia de coroação, disse que manifestou ao rei Charles III a necessidade que o Brasil tem de ajuda para cuidar da Amazônia. “O rei me pediu para cuidar da Amazônia e eu disse que preciso de ajuda”, falou o presidente em uma entrevista coletiva em Londres, após a coroação.
Lula participou da cerimônia entre os cerca de 2,2 mil convidados, entre eles, o presidente francês, Emmanuel Macron, a primeira-dama dos EUA, Jill Biden, entre outros. Veja como foi a cerimônia na cobertura ao vivo do Estadão. Ele se encontrou com o rei rapidamente na noite de sexta-feira. “Foi uma novidade na minha vida (coroação de um rei), a rainha viveu muito tempo com a coroa, fazia tempo que não tinha coroação”, disse.
Ele desembarcou na manhã de sexta-feira em Londres e, à tarde, se reuniu com o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak. O premiê anunciou um investimento de R$ 500 milhões para o Fundo Amazônia no encontro que manteve com Lula. Segundo o líder britânico, a contribuição do Reino Unido é um reconhecimento pela liderança do presidente Lula no combate às mudanças climáticas.
No entanto, segundo o presidente brasileiro, essa quantia está longe de suficiente e disse que voltará a cobrar as nações na próxima COP dos Emirados Árabes, assim como fez na COP do Egito. “O problema é que os países ricos prometem, mas esse fundo de US$ 100 bilhões nunca aparece”, disse ele, na entrevista coletiva. O presidente disse também que voltará a insistir que a próxima COP seja no Brasil. “Imagina na Amazônia, dormir no barco, no Rio Tapajós, onde quiser, tudo para discutir a preservação ambiental. "
“Nós que já tínhamos perdido tudo, que tínhamos perdido os fundos da Noruega e da Alemanha porque o presidente (Bolsonaro) não aplicava, não só estamos aplicando como já recebemos mais um aviso do (presidente) Biden que vai dar US$ 500 milhões, agora a Inglaterra eu não sei quanto vai dar, mas eu espero que não seja menos que os EUA”, disse Lula, ignorando que os britânicos já anunciaram o valor e que ele é sim menor que o prometido por Washington.
Lula diz que vai criar um grupo de trabalho para discutir questões comerciais com a Inglaterra, alegando que o governo anterior “parou de falar de negócio ou de discutir negócio” e que o fluxo comercial entre os dois países “diminuiu de US$ 8,6 bilhões para US$ 6 bilhões”. Segundo ele, já muitas oportunidades para aumentar a cooperação entre ambos países, que cresceram mais após os britânicos abandonarem a União Europeia. “Vamos criar um grupo de trabalho para discutir como podemos trocar mais bilateralmente”, disse ele.
Segundo Lula, a Amazônia é responsabilidade do Brasil, mas também é patrimônio da humanidade. “Vou dizer que os países precisam levar mais a sério a questão climática, precisamos de uma nova governança mundial”, disse ele, defendendo mais representatividade e governança para as questões climáticas, assim como uma participação mais ampla no Conselho de Segurança.
É de longa data a defesa do presidente Lula sobre uma reforma do órgão máximo da ONU que, segundo ele, precisa rediscutir uma nova geopolítica de decisões que possam efetivamente serem cumpridas. “É preciso rediscutir uma nova geopolítica para que a ONU tenha autoridade de decidir e ver as decisões serem cumpridas, porque do jeito que está hoje, as decisões da ONU só valem para os países pequenininhos. Os membros do Conselho de Segurança não respeitam sequer o Conselho de Segurança. Eles são os produtores de armas, maiores vendedores de armas, são eles que têm todas as armas mais potentes”, afirmou Lula a jornalistas em Londres, em uma entrevista coletiva transmitida também pelo canal da TV Brasil no Youtube.
‘Grande potência’
Lula disse que também vai levar a reivindicação de mais recursos para preservar a Amazônia ao G-7, G-20 e Brics. Afirmou que o objetivo é levar o tema a reuniões para tomar “decisões que façam com que a humanidade comece a acreditar que os governos estão dizendo a verdade quando falam na questão da preservação ambiental.”
“Muita gente fala na questão climática, mas na hora de ajudar não ajuda. Muitos países que têm florestas querem preservar, mas precisam de ajuda”, declarou.
Lula também exaltou a “grande potência” do Brasil na questão climática. “Temos oportunidade enorme com o hidrogênio verde que está sendo explorado agora em todos os Estados do Nordeste, temos eólica, solar, com muita oportunidade de crescimento. O que não falta no Brasil é oportunidade de energia renovável e vamos discutir no G-20, G-7, Brics, em cada reunião”, reforçou.
Ucrânia
Sobre a conversa com o líder francês Macron, Lula disse que combinou com ele um novo telefonema para que os dois possam conversar sobre a guerra na Ucrânia. “Não é segredo para ninguém o que vamos conversar”, disse ele, lembrando que haverá um encontro dos Brics este ano no qual os grandes - Brasil, Índia, Rússia, China e África do Sul - vão poder conversar.
Lula confirmou que o embaixador Celso Amorim, ex-chanceler e assessor especial do presidente, irá para Kiev no dia 10. Sua ida para a Ucrânia passou a ser cobrada depois que ele viajou a Moscou e se reuniu com o líder russo, Vladimir Putin.
Articulação política
Ao ser questionado sobre a articulação política no Congresso, Lula defendeu o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que tem sido acusado de ter problemas nessa área. “O Padilha é o que o País tem de melhor na articulação política. O fato de acertar ou errar, nós temos de pensar no que aconteceu, precisa ver do que estão se queixando os deputados”, ponderou.
Lula disse que a dificuldade na articulação com o Congresso se deve à necessidade de atender às reivindicações dos deputados. “A coisa mais barata e mais eficaz é a gente cumprir aquilo que a gente promete. Tudo que você trata e não cumpre fica muito mais caro depois. É preciso que a gente seja eficaz e cumpra tudo o que prometa”.
O presidente disse não ter ficado preocupado com a votação na Câmara que derrubou os decretos que mudaram as regras no saneamento - a primeira derrota do governo no Congresso. Ele disse acreditar que a Lei do Saneamento será aprovada. “São 513 deputados e um articulador e podemos errar, mas vamos acertar.”
Banco Central
O presidente também voltou a criticar a alta taxa de juros no país. “Eu não discuto a autonomia do Banco Central. Eu indiquei um presidente do PSDB, que eu nem conhecia. Eu nem conhecia o (Henrique) Meirelles quando eu o indiquei e duvido que esse cidadão (Campos Neto, atual presidente do BC) tenha mais autoridade do que o Meirelles. Ele (Campos Neto) não tem compromisso com o Brasil, mas com o governo que o indicou e com quem gosta de taxa de juros alto”, disse ele. Indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, Campos Neto tem mandato até dezembro de 2024.
“Se eu não puder reclamar dos equívocos do Banco Central, quem vai reclamar? O presidente dos EUA”, disse Lula, acrescentando que o BC tem autonomia, “mas não é intocável”.
Julian Assange
Já no fim da entrevista coletiva, o presidente foi questionado sobre a situação do jornalista australiano Julian Assange, acusado de espionagem após ter vazado documentos sigilosos dos EUA, preso na Inglaterra, em um momento de debate público sobre liberdade de expressão.
“Eu acho uma vergonha que um jornalista que denunciou falcatruas de um estado contra os outros esteja preso, condenado a morrer na cadeia, e a gente não fazer nada para libertar. A imprensa não se mexe na defesa desse jornalista. Eu sinceramente não consigo entender. A gente precisa de movimento da imprensa mundial em defesa dele”, defendeu.
Segundo Lula, é preciso “colocar nossas teorias na prática para continuar lutando por liberdade de expressão”. O presidente brasileiro disse que esqueceu de tratar do tema com Sunak, mas prometeu ligar para o premiê britânico para conversar sobre o assunto.
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