Quase dois meses após a invasão russa da Ucrânia, os EUA e seus aliados europeus planejam um mundo diferente, no qual não tentam mais coexistir e cooperar com a Rússia. O objetivo é isolá-la e enfraquecê-la como uma estratégia de longo prazo. Em Washington e Bruxelas, estão sendo elaboradas novas políticas em todos os setores, desde defesa e finanças até comércio e diplomacia.
O maior alvo da indignação é o presidente russo, Vladimir Putin. “Embora a gente não defenda abertamente a mudança de regime, é difícil imaginar um cenário estável com Putin agindo assim”, disse um alto funcionário da diplomacia europeia.
Os planos, porém, vão além de Putin. A Estratégia de Segurança Nacional de Biden, ainda incompleta, deve ser alterada, já que a expectativa inicial era de que ela se concentrasse na China. O novo plano de defesa, enviado ao Congresso em abril, prioriza o que o Pentágono chama de “desafio da Rússia na Europa”, além da ameaça chinesa.
A Otan também apresentará um plano estratégico na cúpula de junho, o primeiro desde 2010, quando a aliança tentou estabelecer uma “parceria estratégica” com a Rússia. “O diálogo com a Rússia, como buscamos antes, não é mais uma opção”, disse o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg.
Plano
A União Europeia já tem um plano para reduzir sua dependência do gás russo em dois terços até o fim do ano e encerrar todas as importações de combustíveis fósseis da Rússia antes de 2030.
Não se trata de sanções, mas de articular um caminho que garanta a nossa independência do gás e do petróleo russos”, disse chanceler da Holanda, Wopke Hoekstra. “Para alguns, será uma trajetória de meses. Para outros, pode levar anos. Mas a Holanda e outros países levam isso a sério. Nunca mais cometeremos o mesmo erro.”
Para a segurança da Rússia, a guerra parece ter sido um desastre. EUA e Europa ampliaram os gastos militares. Finlândia e Suécia devem solicitar a adesão à Otan, uma mudança no equilíbrio da segurança europeia que aumentaria a presença militar da aliança na fronteira russa.
Além disso, Biden encerrou as relações comerciais normais com Moscou e proibiu a compra de petróleo russo. A Assembleia-Geral da ONU suspendeu a Rússia no Conselho de Direitos Humanos e um movimento para reformar o Conselho de Segurança, onde Moscou usa livremente seu poder de veto, ganhou novo ímpeto.
Ninguém no Ocidente arrisca um palpite de como a crise terminará. “Muitas das mudanças propostas não podem ser decididas até que saibamos como esse conflito acabará”, disse Alexander Vershbow, vice-secretário-geral da Otan. “Será que acaba? Ou se arrastará com um cessar-fogo ou como uma guerra sem paz por vários anos?”
Diplomacia
A estratégia está sendo elaborada ao mesmo tempo em que os aliados lidam com a crise imediata, com sanções contra Moscou, ajuda militar à Ucrânia e envio de tropas à fronteira oriental da Otan. Muitas das medidas devem parecer cada vez mais permanentes, segundo conversas com autoridades americanas e europeias.
“Queremos uma Ucrânia livre e independente, uma Rússia enfraquecida e isolada e um Ocidente mais forte, unificado e determinado”, disse o assessor de Segurança Nacional de Biden, Jake Sullivan, no programa Meet the Press, da NBC. “Acreditamos que todos esses três objetivos são viáveis.”
Alguns, porém, questionam a estratégia e desaconselham a volta da política de “contenção”, que guiava a relação com a União Soviética. Outros dizem que a crise na Ucrânia e seu impacto na Europa são uma oportunidade para os EUA se afastarem de algumas de suas responsabilidades em defender o mundo livre.
Diálogo
“A guerra fortaleceu o argumento da disciplina estratégica, encorajando a Europa a se equilibrar contra a Rússia, enquanto os EUA focam na Ásia e em questões internas”, disse o historiador Stephen Wertheim, na Foreign Affairs.
Mas nem todos são a favor de isolar Moscou. Na França, Emmanuel Macron está envolvido em uma eleição acirrada e sua rival, Marine Le Pen, pediu reconciliação com a Rússia e prometeu retirar a França do comando integrado da Otan. Na Alemanha, também há vozes em favor de manter a porta aberta ao diálogo para facilitar uma reaproximação com Moscou.
Nos EUA, a questão é uma das poucas com apoio de ambos os partidos, superando o desejo de alguns republicanos aliados de Donald Trump, que preferiam criticar a Otan e se aproximar de Putin. O risco é que, se o senso de urgência se dissipar com a guerra, surgirão desacordos sobre o aumento dos gastos militares e a crise se estenderá, prejudicando a agenda doméstica de Biden./ WASHINGTON POST
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