A ONU acusou a Rússia de colocar em risco a segurança alimentar dos países em desenvolvimento. A acusação das Nações Unidas se baseia na decisão de abandonar o acordo para escoamento seguro de grãos pelo Mar Negro e nos repetidos ataques à infraestrutura portuária da Ucrânia.
A chefe dos Assuntos Políticos da ONU, Rosemary DiCarlo, ressaltou que “a nova onda de ataques aos portos ucranianos poderá ter um impacto significativo na segurança alimentar mundial, em especial nos países em desenvolvimento”.
A ONU também vê como “inaceitáveis” as ameaças de ataque a embarcações civis no Mar Negro. A preocupação ganhou força depois que a Rússia bloqueou o Mar Negro e avisou que consideraria todos os navios que viajassem aos portos ucranianos como potenciais transportadores de carga militar.
A ONU afirma que o acordo, abandonado por Moscou no início da semana, ajudou a reduzir em 20% o preço dos alimentos globalmente durante a guerra entre dois dos maiores exportadores de grãos do mundo. E esse avanço, agora, está em risco.
“Os preços globais dos grãos dispararam, ameaçando anular os progressos alcançados no ano passado com a estabilização dos mercados, empurrando potencialmente milhões de pessoas para a fome”, apontou DiCarlo.
Os contratos futuros de trigo negociados nos Estados Unidos, por exemplo, tiveram alta de 6% na semana. Nesta sexta-feira, 21, os preços continuam em um patamar acima do registrado antes da Rússia abandonar o acordo, mas registram queda com a esperança de retomada nas negociações.
Na quarta-feira, 19, Moscou sugeriu que poderia voltar ao acordo no prazo de três meses se tivesse suas demandas atendidas. Agora, o presidente Vladimir Putin afirmou que estaria disposto a reabrir o corredor de grãos “imediatamente” se as condições forem cumpridas.
As condições de Moscou envolvem a volta do banco agrícola russo ao sistema internacional de pagamentos SWIFT e a suspensão de sanções sobre peças de reposição para máquinas agrícolas, entre outras demandas.
Putin disse que as Nações Unidas fizeram o possível para cumprir o acordo e voltou à carga contra o Ocidente, que acusou de “distorcer” a essência do acordo que tinha em sua essência “um significado humanitário enorme”, nas palavras do presidente russo.
Novos ataques em Odessa
Ao mesmo tempo em que se diz disposta a negociar, a Rússia bombardeia a infraestrutura portuária da Ucrânia e faz testes com mísseis no Mar Negro.
Na madrugada, o ataque que atingiu uma empresa em Odessa destruiu 120 toneladas de produtos agrícolas, segundo informações do representante militar ucraniano na região Oleg Kiper.
No início da semana, Kiev já havia informado a destruição de 60 mil toneladas em ataques a zona portuária no sul do país. Na cidade de Odessa - que concentra três dos três portos contemplados pelo acordo de grãos - os bombardeios são constantes há quatro dias seguidos.
Agora, o porta-voz militar ucraniano notou uma mudança no foco dos mísseis e drones: depois de bombardear intensamente a infraestrutura da cidade, agora a Rússia estaria concentrada nas empresas, afirmou Oleg Kiper.
Como exemplo, ele apontou que o maquinário e os celeiros de uma companhia foram destruídos em um dos ataques mais recentes.
Ainda nesta sexta-feira, as forças navais da Rússia praticaram disparos com mísseis de cruzeiros no Mar Negro, elevando ainda mais a tensão.
Em comunicado, o ministério disse que as tropas russas em aviões e navios também “praticaram o isolamento de uma área temporariamente fechada à navegação” e realizaram exercícios que simulavam a apreensão de possíveis navios intrusos.
O exercício foi anunciado pelo Ministério da Defesa como rotineiro, mas ocorreu em meio à preocupação de ataques a navios sem a proteção do acordo de grãos costurado pela ONU e pela Turquia.
China promete comprar mais da Ucrânia
No campo da diplomacia, China e Ucrânia tiveram o primeiro encontro de alto nível desde o início da guerra, há quase um ano e meio. Representantes dos ministérios do comércio dos dois países se reuniram na capital chinesa para discutir relações comerciais e cooperação agrícola.
A China fortaleceu os laços com a Rússia durante o conflito. Agora, se disse pronta para aumentar as importações de produtos ucranianos.
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A declaração é do vice-ministro do Comércio chinês, Ling Ji, que também destacou a disposição de Pequim em trabalhar com Kiev para “promover a parceria estratégica entre os dois países”.
O representante do Comércio ucraniano Taras Kachka, por sua vez, destacou que Kiev espera “expandir as exportações de produtos agrícolas para a China”.
Além das questões comerciais, a Ucrânia também tem interesses diplomáticos na conversa com a China. A esperança de Kiev é que Pequim use a influência sobre o Kremlin para conseguir uma redução nos ataques./EFE e The New York Times
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