Opinião | Sou professor de Columbia. Os protestos no meu câmpus não são justiça

Protestos pró-palestinos se espalham e criam embates em universidades dos Estados Unidos

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Por John McWhorter (The New York Times)

Na quinta-feira passada, durante a aula de humanidades musicais que leciono na Universidade Columbia, dois estudantes fizeram uma apresentação à classe sobre o compositor John Cage. Sua obra mais famosa é “4′33′'”, que nos convida a ouvir em silêncio os ruídos do nosso entorno por exatamente quatro minutos e trinta e três segundos.

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Tive de dizer aos alunos que não poderíamos ouvir aquela obra naquela tarde, porque os ruídos do nosso entorno não teriam sido sons de pássaros cantando nem de passos no corredor, mas da cantoria enfurecida dos manifestantes diante do prédio da faculdade. Ultimamente esse ruído tem sido quase contínuo durante dias de noites, incluindo as estrofes perversas que bradam “Do rio até o mar”. Dois estudantes da minha classe são israelenses; três outros, sei que são judeus americanos. Eu não podia vê-los tendo que sentar e escutar essas coisas como música de fundo.

Pensei no que teria acontecido se os manifestantes estivessem em vez disso entoando slogans antinegros ou até algo como “DEI tem de morrer” na mesma melodia de “Sound Off” à qual “Do rio ao mar” foi adaptada. Não teriam durado nem cinco minutos antes de massas de estudantes berrassem mais alto e os expulsassem do câmpus. Dizeres desse tipo teriam sido condenados enquanto graves rupturas no intercâmbio civilizado, alardeados como um retorno ameaçador à segregação e classificados como uma forma de violência. Aposto que a maioria dos manifestantes contrários à Guerra de Gaza de fato os interpretaria dessa maneira. Mas por que tanta gente pensa que semanas de protestos contrários não apenas à guerra em Gaza, mas à própria existência de Israel são, não obstante, aceitáveis?

Manifestantes acampam na Universidade de Columbia, que adiou ação policial afirmando que negociações avançaram, Nova York, 24 de abril de 2024 Foto: Michael M. Santiago/AFP

Apesar de saber que muitos judeus discordarão de mim, eu não acredito que o ódio antissemita seja a razão para esse sentimento tanto quanto a oposição ao sionismo e à guerra contra Gaza. Eu conheço alguns dos manifestantes, incluindo um casal que foi preso na semana passada, e para mim é muito difícil crer que eles sejam antissemitas. Sim, a linha pode ser tênue entre o questionamento ao direito de existir de Israel e o questionamento ao direito de existir do povo judeu. E sim, parte da retórica em meios aos protestos cruza essa linha.

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Conversas que tive com pessoas calorosamente contrárias à guerra em Gaza, sinalizações e postagens em redes sociais e outros ambientes e comentários anti-Israel e geralmente da extrema esquerda inserem essas confrontações em uma batalha maior contra estruturas de poder — aqui na forma do que os manifestantes qualificam como colonialismo e genocídio — e contra a branquitude. A ideia é que estudantes e docentes judeus deveriam ser capazes de tolerar tudo isso porque são brancos.

Até certo ponto, eu entendo. Comícios e eventos pró-palestinos, muitos ocorridos aqui ao longo dos anos, não são por si só hostis a alunos, professores e funcionários judeus. A discórdia nem sempre será coisa trivial. Mas os ataques implacáveis dos atuais protestos — diários, barulhentos, mais barulhentos ainda, atravessando a noite e usando retóricas cada vez mais furiosas — vão além do que qualquer um deveria suportar, independentemente de sua branquitude, seu privilégio ou seu poder.

O debate nas redes sociais tem alegado que os protestos são pacíficos. Parte do tempo eles são; isso varia segundo a localização e o dia — geralmente o que acontece dentro dos portões do câmpus é um pouco menos estridente do que fora. Mas os tambores batendo são constantes — pessoas discordam sobre o quão pacífico esse som poderá ser da mesma forma que discordam sobre a natureza do antissemitismo. O que eu tenho certeza é que até os protestos mais pacíficos seriam considerados ultrajes se fossem interpretados, digamos, como antinegros — mesmo se a mensagem fosse codificada, como em um grupo silencioso de pessoas empunhando cartazes trumpistas ou usando camisetas afirmando “Todas as vidas importam”.

E além do mais, classificar isso tudo como algo pacífico distende o significado do termo de maneira quase implausível. Há uma paz estranha quando rabinos locais pedem aos estudantes judeus que se apressem para chegar em casa o mais rápido possível, quando um ativista árabe-israelense é hostilizado na Broadway, quando as canções furiosas ficam tão constantes que a gente mal aguenta escutar e quando começa a parecer normal ver pôsteres e trajes retratando os membros do Hamas como heróis. Numa noite recente eu vi um pai chegando com sua filha pequena do protesto, dando as últimas batidas vigorosas no tambor que levava a tiracolo, balançando a cabeça afirmativamente para ela em uma saudação direta, martelando sua perspectiva na mente da pequena. Isso não é pacífico.

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Entendo que os manifestantes e seus colegas de viagem sentem que tudo isso é a resposta apropriada, a justiça social em marcha. Eles ouviram que virtuosidade significa mirar a batalha contra a branquitude, sua frente de poder e centro, contestando o abuso de poder como seja preciso. Eu, de minha parte, acho que a guerra em Gaza não é mais construtiva — e nem mesmo coerente.

Mas os problemas são complexos de maneiras que essa forma intransigente de batalha contra o poder não é capaz de resolver. Dúvidas legítimas sobre a definição de genocídio permanecem, assim como a respeito da dimensão do direito de uma nação se defender e sobre partilhas justas (que historicamente não se limitam à Palestina). Há um motivo para muitos considerarem o conflito israelo-palestino o embate mais moralmente desafiador na história moderna.

Quando estudei na Universidade Rutgers, em meados dos anos 80, os protestos eram contra investimentos no regime de apartheid da África do Sul. Havia similaridades com as atuais manifestações em Columbia: um grande grupo de estudantes levantou acampamento bem na frente do centro estudantil da Rutgers na College Avenue, onde dezenas de alunos passaram as noites por semanas a fio. Havia cantorias, assim como o inevitável teatro de rua e um elemento talvez necessário para protestar efetivamente: um cara até deitou no meio da College Avenue para bloquear o trânsito, pegando emprestado uma linha da cartilha dos protestos contra a Guerra do Vietnã.

Não me recordo de sul-africanos no câmpus se sentindo pessoalmente atingidos, mas a maior diferença era que, apesar de buscarem difundir seus argumentos em alto volume, durante um longo período e às vezes até rudemente, os manifestantes não tentavam impedir a vida acadêmica no câmpus.

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Manifestantes pró-palestinos acampam na Universidade de Columbia, Nova York, 23 de abril de 2024 Foto: Bing Guan/The New York Times

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Na noite da segunda-feira, Columbia anunciou que haverá aulas online até o fim deste semestre, para a segurança dos estudantes. Presumo que os manifestantes seguirão ao longo dos dois principais dias da graduação, manchando um dos dias mais especiais das vidas de milhares de graduandos para repreender a guerra “imperialista” no exterior.

Os manifestantes de hoje não odeiam o governo Israel mais que os manifestantes do passado odiavam o governo da África do Sul. Mas têm perseguido seus objetivos com um sentido marcadamente diferente — em parte por causa da obstinação da cultura acadêmica antirracista e em parte por causa da influência dos iPhones e das redes sociais, que encorajam inerentemente um grau de desempenho mais intensificado. É parte da estrutura subjacente dos protestos os manifestantes serem filmados de vários ângulos para o mundo inteiro ver. A pessoa se empolga.

Mas essas mudanças na história moral e na tecnologia dificilmente confortariam os estudantes judeus do aqui-agora. O que começou como um protesto inteligente se tornou, em sua fúria intransigente e incessante, uma forma de abuso. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Opinião por John McWhorter

John McWhorter (@JohnHMcWhorter) é professor-associado de linguística da Universidade Columbia. É autor de “Nine Nasty Words: English in the Gutter: Then, Now and Forever” e mais recentemente publicou “Woke Racism: How a New Religion Has Betrayed Black America”.

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