Análise | O que está por trás da queda da aprovação de Trump? Esta estrategista republicana tem a resposta

Ações de Trump estão em sintonia com o que os eleitores querem ou ele está se rebelando contra os EUA?

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Por Kristen Soltis Anderson (The New York Times)

A presidência de Trump assumiu uma qualidade de “danem-se os torpedos, avançar em velocidade máxima”. Pressionar pela aprovação de uma vasta reformulação do governo federal e perturbar o sistema de comércio global é claramente algo que o presidente Trump queria fazer há muito tempo e, agora, algo que ele sente ter a legitimidade necessária para levar a cabo após a eleição de novembro. Mas os números da aprovação dele em relação à economia começaram a cair e seus índices de aprovação do cargo estão de cabeça para baixo. Como pesquisadora que avalia o desempenho político e o impacto das políticas, continuo voltando a isso: os americanos elegeram Trump para que fizesse exatamente o quê?

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Essa pergunta reflete um mistério central desta presidência até agora: as ações de Trump estão em sintonia com o que os eleitores querem dele, ou ele está se rebelando contra os Estados Unidos, fazendo aquilo que lhe convém, e que se danem as pesquisas? As pessoas queriam que ele refizesse o governo e perturbasse a ordem financeira global, ou elas queriam apenas pagar menos no supermercado?

A forma como as pessoas veem e julgam isso ajudará a determinar o sucesso ou fracasso final de Trump no cargo, bem como as chances do Partido Republicano garantir sua pauta política nos próximos anos.

Imagem de 4 de fevereiro mostra o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinando decretos executivos na Casa Branca. Aprovação do presidente começa a cair dois meses após ele assumir o cargo Foto: Evan Vucci/AP

Trump parece ver seu trabalho de forma diferente de muitos eleitores, o que é um dos motivos para a queda de sua aprovação nas pesquisas. Ele acredita firmemente que foi eleito para retornar a Washington como um disruptor, desta vez com significativamente mais experiência e eficácia do que em seu primeiro mandato. Ele se vê como alguém que traz força de volta ao Salão Oval após quatro anos de um fraco Joe Biden. Nisso, ele acredita que tem a latitude para ser grande e ousado, para criar alguma turbulência e fazer com que alguns preços subam no curto prazo, enquanto ele se afirma em Washington e ao redor do mundo. Tudo isso, diz Trump, é feito na esperança de estabelecer uma posição americana mais forte no longo prazo.

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Mas, conforme eu me aprofundava nos dados das pesquisas de Trump, parecia cada vez mais que o mandato atribuído pelos eleitores americanos ao presidente era mais estreito do que ele considera. Após um período prolongado de inflação, com um governo Biden que disse aos americanos para não acreditarem em suas carteiras mentirosas, os eleitores claramente queriam que o próximo presidente estabilizasse a economia e tornasse seu custo de vida mais administrável.

Trump e seus funcionários do gabinete alertaram os americanos de que estamos fazendo as coisas “do jeito mais difícil” e que o acesso a “produtos baratos” não é uma prioridade. Ao fazer isso, eles estão pedindo ao país para absorver a dor de curto prazo em nome de uma perspectiva de ganho de longo prazo.

Sem uma visão clara e consistente do que os americanos receberão em troca do desmantelamento do seu governo ou do encarecimento do supermercado — e quão cedo eles podem esperar obter esse ganho — a equipe de Trump pode rapidamente descobrir que a boa vontade do público está se esgotando, especialmente entre os eleitores indecisos que recompensaram Trump e os candidatos republicanos com seu apoio na expectativa de ver algum progresso econômico.

Outros presidentes já interpretaram mal seus mandatos no passado, vendo o que eles queriam ver em vez do que os eleitores claramente lhes disseram. O melhor argumento para a crença de Trump de que ele foi eleito com um amplo mandato para trazer mudanças agressivas é o fato de ele nunca ter fingido que faria as coisas de outra forma.

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As pesquisas eleitorais mostraram que os americanos queriam um presidente que tivesse a capacidade de liderar e criar grandes mudanças. Na minha própria pesquisa pré-eleitoral, sete em cada 10 eleitores disseram que “um líder forte e decisivo” ou alguém que “pode trazer a mudança necessária” era o que eles mais queriam, enquanto atributos como “se importar com pessoas como eu” ou “ter o temperamento certo” atraíram muito menos interesse.

Mesmo que os americanos soubessem o que estavam recebendo em troca de coisas como tarifas, isso ainda não responde se eles votaram nele por causa dessas coisas, ou apesar delas

Os eleitores tinham bastante conhecimento prévio do que Trump poderia fazer em um segundo mandato, e votaram nele mesmo assim. Talvez aumentar significativamente a deportação ou mudar a abordagem do governo para os direitos das pessoas transgênero não esteja entre as principais prioridades para todos os eleitores indecisos, mas Trump deixou claro o que faria nessas frentes, e é notável que pelo menos algumas de suas ações nessas áreas continuem bastante populares. Mesmo na economia, as ações de Trump provavelmente não são tão surpreendentes para os eleitores, em algum nível. Minha pesquisa mostrou que mais de 80% dos eleitores acreditavam que ele imporia novas tarifas como presidente, uma parcela muito mais alta do que a observada em relação a muitas outras políticas que Trump adotou.

Mas, mesmo que os americanos soubessem o que estavam recebendo em troca de coisas como tarifas, isso ainda não responde se eles votaram nele por causa dessas coisas, ou apesar delas. Mesmo que os republicanos tenham passado décadas clamado pelo encolhimento do governo, as tarifas estão há pouco tempo no topo de sua lista de desejos. E há evidências crescentes em dados de opinião pública de que os americanos estão ficando impacientes para obter a principal coisa que eles sentem que lhes foi prometida: uma economia mais estável, onde o custo de vida seja mais acessível.

Logo após a posse, perguntei aos eleitores americanos qual a prioridade que eles achavam que cada uma de uma série de medidas políticas deveria ter para Trump. No topo da lista? “Reduzir o custo de vida”. Também no topo da lista estavam as ações envolvendo a imigração, o que explica por que minha pesquisa descobriu que a aprovação de Trump para o seu trabalho na imigração continua positiva, mesmo que sua aprovação em outras áreas tenha enfraquecido.

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Em contraste, “aprovar tarifas adicionais” e “demitir um grande número de funcionários do governo federal” — o assunto das manchetes das semanas mais recentes — caem muito nesse ranking. Apenas um em cada quatro eleitores achava que cada um desses itens deveria ser “uma das principais prioridades”. E embora os números pareçam mais robustos entre os eleitores de Trump, menos da metade deles identificou demissões em massa ou tarifas como prioridade máxima. Em vez disso, as prioridades dos eleitores de Trump pareciam exatamente as prioridades dos eleitores em geral: reduzir o custo de vida, deportar imigrantes ilegais criminosos, proteger a fronteira ao sul.

Presidentes anteriores que abordaram o tópico errado na hora errada levaram seu partido à derrota eleitoral. Em 2004, George W. Bush foi reeleito para tornar os EUA seguros e ter sucesso na Guerra ao Terror. Ao buscar a reforma da Previdência Social como forma de gastar o capital político que ele sentia ter ganho, Bush sem dúvida colocou os republicanos em uma trajetória decadente de dois anos que resultaria em Nancy Pelosi se tornando presidente da Câmara. Em 2008, Barack Obama foi eleito para consertar o desastre econômico da crise financeira; mas ele buscou a reforma da assistência médica e, embora tenha garantido o Affordable Care Act, os democratas sofreram uma derrota monumental nas eleições intercalares de 2010.

No final das contas, assim como Trump está preparando os eleitores para aceitar a dor de curto prazo em troca da promessa de ganho de longo prazo, seu partido pode estar disposto a aceitar a dor política de curto prazo se acreditar que pode garantir uma nova estrutura econômica global duradoura e um desmantelamento do estado burocrático. E assim como os democratas agora acreditam que a política de preservação do Affordable Care Act está do seu lado, os republicanos podem sentir que, uma vez que a dor inicial das tarifas e da interrupção do governo tenha passado, os eleitores acabarão ficando do lado deles.

Mas esta é uma aposta perigosa se a pauta de Trump for executada quase exclusivamente pelo poder executivo e a opinião pública devolver o controle do governo aos seus opositores; o Affordable Care Act provou ser muito difícil de erradicar para os republicanos porque foi consagrado em lei pelo Congresso, enquanto muitas das ações de Trump são produtos apenas de canetadas e telefonemas.

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Trump sente que os EUA o enviaram a Washington em uma missão. Ele, em vários momentos, se autodenominou tanto um agente do caos quanto um antídoto para ele. Alguns de seus principais apoiadores vão aplaudir enquanto ele adota uma abordagem de touro em uma loja de porcelanas em relação às instituições, e há algumas evidências de que os eleitores estão dispostos a lhe dar margem de manobra em suas abordagens pouco ortodoxas para muitos dos problemas que eles acham que enfrentam — uma mentalidade do tipo “vamos em frente com tudo e seremos lendas”.

Mas a questão número 1 nos EUA continua sendo a questão número 1, e há riscos políticos reais para uma estratégia que pede aos eleitores que sorriam e aguentem na fila do caixa hoje em nome de uma promessa de algo melhor amanhã. /TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Análise por Kristen Soltis Anderson
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