Deborah Nzigire, uma congolesa de 65 anos, mostra-se nervosa ao se sentar para sua entrevista de emprego. As mãos contraídas, suas palavras são lentas e pausadas. E ela pisca o tempo todo. “O que a inspirou a seguir esta carreira?”, pergunta um dos dois entrevistadores. Sua resposta é confusa. Ela diz que é o dinheiro. Quando lhe pedem para fazer uma demonstração, ela ri nervosamente e deixa a sala. E retorna chorando. “Bettina,” ela uiva e se joga no chão. “Bettina, porque você nos deixou?” Deborah bate no solo com a palma da mão, seu corpo convulsiona com seus soluços, ela geme e se lamenta. Os olhos do entrevistador enchem de lágrimas. Ela é contratada.
Deborah é a primeira a ser recrutada pela nova empresa de Gilbert Kubali, que decidiu trazer a profissão de carpideira para o leste da República Democrática do Congo. Na capital distante, Kinshasa, este comércio já está bem estabelecido e é lucrativo. Não é preciso ir muito longe para encontrar carpideiras para chorar em um funeral. Mas em Goma, cidade com um milhão de habitantes, localizada a leste do país, este negócio ainda não decolou e Kubali enxergou uma oportunidade. “Espero monopolizar o mercado”, afirmou.
A dor exagerada, ostentada em um féretro, está associada à crença tradicional de que o morto sobrevive ainda algum tempo depois de o seu coração deixar de bater. “Acreditamos que a pessoa ainda não está morta e está nos contemplando como um filme”, explica Deborah. “Se você não chora, o morto ficará furioso”. E sabe-se que ancestrais furiosos voltam e perturbam a vida dos seus descendentes.
Bruxaria
Além disto, é vergonhoso um membro da família não chorar no funeral de um ente querido – e imprudente. Sua indiferença pode ser interpretada como um sinal de que foi responsável pela morte dele por meio de bruxaria. Uma das funções das carpideiras é também provocar as lágrimas nos outros.
No entanto, elas cobram caro. Contratar uma mulher por uma semana de luto custa em torno de US$ 1.500. Além disso, as carpideiras esperam ser reembolsadas pelos seus gastos com alimentação, bebida e transporte. Talvez por isto esta indústria não tenha prosperado no leste do país – há mais ricos na capital.
Kubali diz que, se as mulheres forem muito boas e se ele fizer uma boa propaganda, encontrará clientes. E pretende enviar um profissional de Kinshasa para treinar suas dez carpideiras. Quanto às mulheres, chorar por encomenda é simples, afirma Deborah. Em uma parte do Congo devastada por milícias de estupradores, o sofrimento é grande.
E as preocupações financeiras perseguem a população: 77% dos habitantes contam com menos de US$ 2 por dia para sobreviver. “A todo o momento, surge algum problema. Nossa mente vive ocupada e estamos o tempo todo nos perguntando onde conseguir algum dinheiro. Isto entristece e você chora. Estamos sempre prontas para chorar”, disse Deborah. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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