Pela primeira vez, Otan acusa China de ajudar a Rússia na guerra contra a Ucrânia

Aliança acusou Pequim de fornecer a Moscou componentes de armas e outras tecnologias, fazendo uma ameaça implícita de que haverá um ‘custo’ para país asiático

PUBLICIDADE

Por David E. Sanger (The New York Times)
Atualização:

WASHINGTON — Depois de décadas vendo a China como uma ameaça distante, a Otan acusou Pequim, nesta quarta-feira, 10, de se tornar “um facilitador decisivo da guerra da Rússia contra a Ucrânia” e exigiu que o país asiático interrompesse o envio de “componentes de armas” e outras tecnologias críticas para a reconstrução do exército russo.

PUBLICIDADE

A declaração está contida em um documento aprovado pelos 32 líderes da aliança militar, pouco antes de irem para um jantar na Casa Branca. Trata-se de uma grande mudança para a Otan, que até 2019 nunca mencionou oficialmente a China como uma preocupação, e mesmo assim apenas com uma linguagem mais branda.

Agora, pela primeira vez, a aliança se juntou às denúncias de Washington sobre o apoio militar da China à Rússia. Mas a declaração contém uma ameaça implícita de que o apoio crescente da China para Moscou teria um custo. A China “não pode viabilizar a maior guerra na história recente da Europa sem sem que isso tenha um impacto negativo em seus interesses e reputação”, diz o documento, particularmente chamando a atenção para “seu apoio em larga escala à base industrial de defesa da Rússia”.

A declaração da Otan não especificou o que esse “custo” seria, embora o primeiro passo natural seriam sanções econômicas para barrar a China de partes do comércio global. Até um ano atrás, líderes europeus estavam hesitantes em desafiar Pequim, especialmente países como Alemanha, que vê a China como um mercado crítico para itens de luxo e carros de alto padrão.

Publicidade

Muitos líderes europeus inicialmente inicialmente rejeitaram o acordo alcançado no início de 2022, pouco antes das Olimpíadas de Inverno de Pequim, para uma “parceria sem limites” assinada pelo presidente russo Vladimir Putin e o presidente chinês Xi Jinping. Até mesmo Joe Biden disse que tinha suas dúvidas de que os dois países, com um longo histórico de inimizade, pudessem trabalhar juntos. Em março de 2023, durante uma viagem ao Canadá, ele disse: “Acho que exageramos muito” a parceria.

“Tenho ouvido agora nos últimos três meses sobre ‘a China vai fornecer armas significativas para a Rússia e eles vão’ — muita conversa sobre isso”, acrescentou o Sr. Biden. “Eles ainda não o fizeram. Não significa que não o farão, mas ainda não o fizeram.”

“Tenho ouvido nos últimos três meses sobre ‘a China vai fornecer armas significativas para a Rússia e eles vão’ — muito se fala sobre isso,” acrescentou Biden. “Ainda não fizeram isso. Não significa que não o farão, mas ainda não o fizeram.”

Depois de décadas vendo a China como uma ameaça distante, a Otan acusou Pequim, nesta quarta-feira, 10, de se tornar “um facilitador decisivo da guerra da Rússia contra a Ucrânia” Foto: Evan Vucci/AP

Mas 29 meses depois da invasão da Ucrânia, essa visão mudou drasticamente. Embora a China tenha atendido os avisos de não abastacer a Rússia com sistemas de armamento completos, ela fez tudo o que estava aquém disso, fornecendo chips de computador, software avançado e os componentes necessários para a Rússia reconstruir uma base industrial de defesa que produzia equipamentos defeituosos e desatualizados.

Publicidade

As evidências de inteligência foram fornecidas aos países da Otan pelo governo Biden, em um esforço para conquistar os céticos que argumentavam que a China não era um jogador central na guerra. Isso teve sucesso, mas somente depois que os Estados Unidos publicaram os nomes, em uma ordem de sanções econômicas do Departamento do Tesouro, de empresas de fachada e fabricantes chineses que estavam canalizando a tecnologia para a Rússia.

”A declaração demonstra que aliados da Otan agora coletivamente entendem esse desafio e estão pedindo à RPC (República Popular da China) para cessar essa atividade”, Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional de Biden disse na tarde desta quarta-feira. “Se esse apoio da RPC continuar, isso degradará suas relações em toda a Europa, e os Estados Unidos continuarão impondo sanções às entidades da RPC envolvidas nessa atividade, em coordenação com nossos aliados europeus.”

A declaração também culpa a China por “atividades cibernéticas e híbridas maliciosas, incluindo desinformação” direcionadas aos Estados Unidos e à Europa.

A China negou ser um fator importante na guerra e autoridades chinesas acusaram Washington, pública e privadamente, de profunda hipocrisia, destacando as dezenas de bilhões de dólares em munição, sistemas de mísseis, tanques e, em breve, jatos F-16 que os Estados Unidos estão dando para a Ucrânia.

Publicidade

Em maio, quando sanções americanas foram impostas, Wang Wenbin, um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, chamou as acusações dos Estados Unidos de “hipócritas e altamente irresponsáveis”. Mas ele não negou as especificidades.

O impasse sobre o papel da China na Ucrânia está ameaçando desfazer qualquer boa vontade que o Biden construiu com o Xi quando se encontraram em novembro de 2023 na Califórnia. Na época, Biden o alertou em particular sobre interferir na eleição presidencial de 2024, mas ainda não havia evidências disponíveis de que a China estava se tornando uma força importante, ao lado do Irã e da Coreia do Norte, no fornecimento do esforço de guerra russo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.