Por que a economia chinesa cambaleia? É a política, estúpido; leia o artigo de Paul Krugman

Alguns analistas atribuem o tropeção da China às políticas de sua atual liderança, mas acredito que os problemas da China são mais sistêmicos

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Por Paul Krugman (The New York Times)

Dois anos atrás a China estava com tudo. Décadas de crescimento milagroso tinham transformado um país desesperadamente pobre em uma superpotência econômica com um produto interno bruto que, segundo algumas métricas, era maior que o dos Estados Unidos. A resposta agressiva da China à covid era amplamente elogiada; sua Iniciativa Cinturão e Rota, um imenso programa de investimento em infraestrutura em todo o mundo, mostrava-se claramente um empreendimento em busca de influência global, talvez até de supremacia.

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Mas agora a China cambaleia. Sua política “covid zero”, trancando cidades inteiras ao primeiro sinal de infestação, provou-se insustentável, mas abandonar a estratégia não produziu o crescimento econômico esperado. Na verdade, a China experimenta deflação atualmente, inspirando comparações à diminuição de ritmo da economia japonesa nos anos 90 (apesar do Japão ter se saído muito melhor do que reza a lenda).

O que deu errado? A China será capaz de reverter este declínio? E como o restante do mundo — particularmente os EUA — deve responder?

Economia chinesa cambaleia após anos de crescimento e otimismo  Foto: STR / AFP

Alguns analistas atribuem o tropeção da China às políticas de sua atual liderança. Um influente artigo publicado recentemente por Adam Posen, presidente do Instituto Peterson para Economia Internacional, sugere que a China sofre de uma “covid econômica longa”, um declínio na confiança do setor privado ocasionado por intervenções arbitrárias do governo — que começaram antes da pandemia mas se intensificaram desde então.

Mas ainda que as ações do presidente chinês, Xi Jinping, tenham realmente sido erráticas, eu me coloco no campo de economistas como Michael Pettis, do Fundo Carnegie, que consideram os problemas da China mais sistêmicos.

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O argumento básico é que a China, de várias maneiras, suprime o consumo privado, deixando o país com enormes poupanças que precisam de alguma maneira ser investidas. Isso não era muito difícil 15 ou 20 anos atrás, quando o PIB chinês podia crescer até 10% ao ano em grande medida por alcançar a tecnologia do Ocidente: uma economia que cresce rapidamente pode fazer bom uso de enormes quantidades de capital. Mas à medida que a China ficou mais rica, o escopo para ganhos rápidos em produtividade se estreitou ao mesmo tempo que a população economicamente ativa parou de crescer e começou a declinar.

Visitantes em frente a uma tela exibindo o presidente chinês Xi Jinping ao lado de uma bandeira do Partido Comunista da China, no Museu Militar da Revolução do Povo Chinês em Pequim, China, outubro Foto: Florence Lo/ Reuters

Inevitavelmente, portanto, o crescimento diminuiu. O Fundo Monetário Internacional acredita que, a médio prazo, a China pode esperar um crescimento menor que 4%. O que não é ruim — é algo em torno de duas vezes o que a maioria dos observadores espera para os EUA. Mas a China ainda tenta investir mais de 40% de seu PIB, o que é simplesmente impossível dada a queda no crescimento.

Este problema à espreita é óbvio há uma década ou mais, mas a China tem sido capaz de mascará-lo principalmente criando um setor imobiliário imensamente inchado. Esta estratégia, contudo, foi insustentável. As trapalhadas de Xi podem ter adiantado o dia do juízo, mas sem uma reforma fundamental, o atual axioma chinês era apenas uma questão de tempo.

Então a China já era? Será que Posen está correto ao afirmar que testemunhamos “o fim do milagre econômico chinês”?

Eu não contaria com isso. Conforme notou certa vez Adam Smith, “Há bastante ruína numa nação”. A China já é uma superpotência, e seus atuais tropeços não deverão pôr fim a esse status. Além disso, ainda que o governo chinês tenha sido estranhamente resistente a reformas que poderiam tornar o crescimento de seu país sustentável, nós não podemos assumir que essa resistência continuará indefinidamente.

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E o que os problemas da China significam para os EUA? O governo Biden adotou uma linha bastante dura em relação à China — muito mais dura, na prática, do que a adotada por Donald Trump, que falava grosso mas na maioria do tempo só estrebuchava inutilmente. O governo americano está agora promovendo a produção de semicondutores para reduzir a dependência em relação à China, tentando impedir exportações de chips avançados de silício para os chineses e, mais recentemente, banindo alguns investimentos no setor de alta tecnologia do país.

Estas ações tornam-se desnecessárias agora que a via para o domínio global da China parece estar desaparecendo?

Não. Não é preciso ser um xenófobo para se preocupar com as possíveis ações futuras de uma superpotência cuja liderança parece cada vez mais autocrática e errática a cada ano que passa. Tentar reduzir a capacidade dessa superpotência de causar dano faz sentido, mesmo que deixe muita gente nervosa. E a possibilidade da China poder não ser mais a superpotência que muitos esperavam não muda esse cálculo.

Na realidade, os problemas da China devem reforçar o argumento por ações preventivas. Os governantes chineses se fiam há muito em conquistas econômicas para obter legitimidade. E agora enfrentam problemas no front doméstico, mais imediatamente na forma de um índice de desemprego crescente entre os jovens. Como eles responderão?

Idealmente, conforme afirmei, governantes chineses deverão aplicar reformas há muito necessárias que coloquem mais dinheiro nas mãos das famílias, para que o consumo elevado seja capaz de substituir investimentos insustentáveis. Mas não é preciso estudar muita história para saber que regimes autocráticos certas vezes respondem a dificuldades domésticas tentando distrair a população com aventuras no exterior.

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Eu não estou afirmando que isso vai acontecer. Mas realisticamente, os problemas da China a tornam mais — não menos — perigosos para a segurança global. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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