O discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura da Assembleia Geral da ONU, no fim de setembro, voltou a colocar em evidência a vontade de fazer com que o país seja uma potência global com voz nos grandes debates internacionais. De acordo com um novo estudo sobre a ascensão de novas potências no mundo, isso está bem distante da realidade.
O Brasil não é uma potência em ascensão com chances de se tornar um membro do clube dos países mais poderosos do mundo. A conclusão, que confirma a perspectiva de frustração da histórica ambição brasileira de fazer com que o país seja um protagonista das grandes questões globais, faz parte de um livro que analisa a competição entre as grandes potências globais e a ascensão de novos atores entre elas.
The Sources of Great Power Competition: Rising Powers, Grand Strategy, and System Dynamics foi editado por J. Patrick Rhamey Jr. e Spencer D. Bakich e tem previsão de lançamento oficial no ano que vem. Um dos seus capítulos, que trata da ascensão de novas potências, já teve seu texto quase integral divulgado, e revela os limites da tentativa brasileira de emergir como um importante ator internacional.
Esta avaliação sobre o Brasil e outras nações que tentam ascender na hierarquia internacional está no capítulo “Rising Powers” in International Politics: Which Powers are Rising and Are They Challengers to the Liberal World Order?, escrito por Thomas J. Volgy e Kelly Marie Gordell.
No texto, os autores analisam de forma sistemática o que faz certos Estados serem potências emergentes e em que contexto eles estão ascendendo, avaliando para onde estariam indo. Isso faz com que eles desenvolvam critérios para analisar a ascensão de diferentes países, incluindo o Brasil.
Volgy e Gordell alegam que a questão da “ascensão” de novas potências tem sido uma grande preocupação para estudiosos da política internacional, especialmente desde o fim da Guerra Fria. Entretanto, o conceito nunca foi muito bem desenvolvido e operacionalizado de forma sistemática e não havia até agora uma noção amplamente aceita na literatura sobre o que pode ser uma potência emergente.
Isso acontece apesar de haver um grande número de países que são frequentemente propostos como candidatos ao status de potência emergente. Além do Brasil, os autores apontam que países tão variados como China, Rússia, México, Colômbia, Argentina, Argélia, África do Sul, Nigéria, Egito, Arábia Saudita, Irã, Turquia, Coreia do Sul, Índia, Indonésia, Filipinas e Tailândia aparecem na literatura de relações internacionais citados como emergentes.
Com base na teoria das relações internacionais, os autores alegam que grandes potências têm capacidades econômicas e militares acima do comum, alcance e oportunidade de agir além das suas regiões, amplo envolvimento em temas internacionais além das suas regiões e são reconhecidos pela comunidade internacional como tendo alto nível de prestígio. A partir desses critérios, as grandes potências globais são os EUA, a China, o Reino Unido, a França, o Japão (único deles que não é membro permanente do Conselho de Segurança da ONU) e a Rússia.
Segundo o capítulo, há duas formas de um Estado aumentar seu status: Ele pode ser aceito como parte de um grupo de países de alto status, ou ele pode melhorar sua posição relativa dentro de um desses grupos. “Identificamos um Estado como uma potência em ascensão se ele ainda não faz parte de um clube de alto status, mas está na trajetória de entrar em um deles. Adicionalmente, uma vez que é membro de tal clube, consideramos potência em ascensão se sua trajetória indicar que ele eleva sua posição dentro do clube”, diz o texto.
O Brasil começa bem na avaliação apresentada no livro, sendo reconhecido de cara como uma potência regional, o que é importante. Para os autores, essas potências têm capacidades econômicas e militares maiores do que os outros países da região combinados, suas principais interações políticas são com outros membros da região e é reconhecido pela comunidade internacional como tendo maior status do que os vizinhos.
Ao avaliar as trajetórias das supostas potências emergentes para avaliar se estão ascendendo em direção a esses destinos e avaliar a probabilidade de que esses estados possam alcançar esses destinos no futuro próximo, as coisas pioram para o país.
Os critérios básicos para avaliar se um país está de fato em ascensão na hierarquia global envolvem questões ligadas à oportunidade (força econômica, força militar e trajetória) e à vontade (presença global e trajetória). A partir desses pontos, eles consideram que é possível saber a situação dos países analisados.
No caso específico do Brasil, o estudo diz que o país não tem potência econômica nem militar, e que está estagnado em sua trajetória. De forma semelhante, o país é apontado como tendo presença global insuficiente, o que faz com que seja considerado que não está em ascensão para se tornar um membro do clube das grandes potências globais.
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Assim como o Brasil, o estudo diz que a África do Sul, a Nigéria e a Índia, outras potências regionais frequentemente consideradas emergentes globalmente, também não podem ser considerados “em ascensão”. Entre os poderes regionais analisados, somente a Alemanha responde positivamente a todas as questões e pode ser considerada em ascensão rumo ao clube das potências globais.
“Os resultados não são uma surpresa. A África do Sul, a Nigéria e o Brasil são potências dominantes em regiões que são relativamente fracas tanto na dimensão econômica quanto na militar, enquanto a Alemanha é uma potência regional em uma região forte da Europa Ocidental”, diz. Já a Índia se distingue por estar em uma região fraca em termos econômicos, mas com grande crescimento em importância militar.
Ainda assim, o estudo alega que o que mais limita a ascensão de um país como o Brasil é a relativa fraqueza da sua força econômica. “Quanto mais fraco é um Estado na perspectiva econômica, maior a necessidade de extração de recursos para atender aos desafios de criar uma grande potência”, dizem os autores.
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