Opinião | Como o pacto Rússia-Coreia do Norte fortalece o novo ‘alinhamento do mal’

Rússia, Irã, Coreia do Norte e China estão todos trabalhando juntos, em maior ou menor grau, para desafiar a ordem internacional baseada em regras e liderada pelos EUA

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Por Max Boot (Washington Post)

O tratado de “parceria estratégica abrangente” assinado na quarta-feira pelo ditador russo Vladimir Putin e pelo ditador norte-coreano Kim Jong-un é apenas a mais recente manifestação de uma das tendências mais sinistras e preocupantes nos assuntos mundiais de hoje: Rússia, Irã, Coreia do Norte e China estão todos trabalhando juntos, em maior ou menor grau, para desafiar a ordem internacional baseada em regras e liderada pelos EUA.

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Esse não é bem um “eixo do mal”, o termo infeliz que o presidente George W. Bush aplicou ao Irã, ao Iraque e à Coreia do Norte para justificar sua invasão do Iraque. Esses países tinham pouco a ver um com o outro; longe de serem aliados, Irã e Iraque eram inimigos que travaram uma guerra sangrenta na década de 1980.

Uma maneira mais adequada de descrever a situação atual foi sugerida por Yoel Guzansky, pesquisador sênior do Instituto de Estudos de Segurança Nacional de Israel, quando o encontrei na quinta-feira. Ele a chama de “alinhamento do mal”, uma frase que captou com precisão a dinâmica.

As quatro ditaduras em questão - Rússia, Irã, Coreia do Norte e China - não constituem uma aliança de segurança formal semelhante à Otan ou ao antigo Pacto de Varsóvia, mas estão amplamente unidas em seu desejo de desafiar os Estados Unidos e seus aliados, que vão da Ucrânia a Israel e à Coreia do Sul.

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Vladimir Putin, à direita, e o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, caminham juntos durante a cerimônia de partida do russo em um aeroporto internacional fora de Pyongyang, na Coreia do Norte: novo 'eixo do mal'?  Foto: Gavriil Grigorov/Sputnik/via AP

A Coreia do Norte forneceu à Rússia dezenas de mísseis de curto alcance e até 5 milhões de projéteis de artilharia para serem usados contra a Ucrânia. Em troca, a Rússia, que já apoiou as sanções internacionais contra a Coreia do Norte por causa de seu programa de armas de destruição em massa, vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU em março para autorizar um painel de especialistas independentes a acompanhar o cumprimento das sanções norte-coreanas.

De forma mais significativa, espera-se que a Rússia forneça à Coreia do Norte ajuda econômica (como petróleo e gás de baixo custo) e ajuda tecnológica para atualizar seu arsenal de armas nucleares e mísseis. Assim, enquanto a ajuda norte-coreana está tornando a Rússia mais perigosa para a Ucrânia, a ajuda russa provavelmente tornará a Coreia do Norte mais perigosa para a Coreia do Sul, o Japão e os Estados Unidos.

O Irã é o outro país que fornece armas para a Rússia. O Irã enviou projéteis de artilharia, drones e mísseis balísticos e até abriu uma fábrica na Rússia para produzir seus drones autodetonantes Shahed. Em troca, Teerã disse que receberia caças Su-35, helicópteros de ataque Mi-28 e outros equipamentos militares russos necessários para aprimorar suas próprias Forças Armadas. A Rússia até mesmo colocou satélites iranianos em órbita.

Essa relação militar representa um aprofundamento dos laços entre Moscou e Teerã, que vinham se estreitando desde que Putin decidiu, em 2015, enviar a Força Aérea russa para ajudar o aliado do Irã na Síria, Bashar al-Assad, a reprimir brutalmente uma rebelião contra seu governo. A intervenção russa ajudou a virar a maré na guerra civil síria, consolidando Assad no poder. Isso também levou a laços estreitos entre a Rússia e o Hezbollah, o representante terrorista do Irã no Líbano, que enviou suas próprias tropas para lutar por Assad.

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Ao contrário da Coreia do Norte ou do Irã, a China aparentemente não tem fornecido munições à Rússia, mas forneceu microchips, máquinas, ferramentas e outros componentes de uso duplo que permitiram que as fábricas russas continuassem a fabricar armas para uso contra a Ucrânia. Avril Haines, diretora de inteligência nacional, disse ao Congresso no mês passado: “O fornecimento de componentes e materiais de uso duplo pela China para o setor de Defesa da Rússia é um dos vários fatores que inclinaram o ímpeto no campo de batalha na Ucrânia a favor de Moscou, além de acelerar a reconstituição da força militar da Rússia após sua invasão extraordinariamente cara”.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin (esquerda), aperta a mão do ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, durante uma reunião em Pyongyang: visita para estreitar laços Foto: Gavriil Grigorov / Sputnik / via AFP

Não devemos exagerar a extensão da cooperação no “alinhamento do mal” ou ignorar as verdadeiras rivalidades e atritos que existem sob a superfície. Pequim, por exemplo, não deve estar muito feliz em ver seus aliados em Pyongyang se aproximando tanto de Moscou, diluindo assim a influência chinesa na Coreia do Norte.

Pequim e Moscou, por sua vez, têm se desentendido sobre a proposta de um gasoduto da Rússia para a China. Putin está desesperado para vender para a China o gás que não pode mais vender para a Europa, mas o projeto do gasoduto Sibéria 2 foi paralisado porque Xi Jinping não quis se comprometer a comprar a quantidade de gás que a Rússia deseja vender pelo preço que deseja cobrar.

Vladimir Putin e Kim Jong-un riem em um passeio na limusine russa Aurus dada de presente pelo presidente russo para o líder norte-coreano em visita a Pyongyang, na Coreia do Norte Foto: Kcna/via Reuters

Mas também não devemos ignorar a crescente ameaça que o Ocidente enfrenta com o alinhamento de seus inimigos. O mundo democrático deve responder com pelo menos a mesma solidariedade que as autocracias estão demonstrando. Um bom começo seria estreitar os laços entre os aliados dos EUA na Europa e na Ásia.

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Já houve um movimento considerável nessa direção: a cúpula da Otan do ano passado contou com a presença dos líderes da Austrália, Nova Zelândia, Coreia do Sul e Japão, e esses parceiros do Pacífico também foram convidados para a cúpula da Otan do próximo mês em Washington.

Todas essas quatro nações do Pacífico aplicaram sanções à Rússia e enviaram ajuda à Ucrânia. Até o momento, a Coreia do Sul e o Japão se recusaram a fornecer ajuda militar direta à Ucrânia, mas o The Washington Post noticiou em dezembro que a Coreia do Sul havia enviado projéteis de artilharia aos Estados Unidos para serem repassados à Ucrânia, enquanto o Japan News noticiou em fevereiro que o Japão estava prestes a enviar aos Estados Unidos munição para o sistema de defesa aérea Patriot para ser repassada à Ucrânia.

Considerando que a Rússia agora parece determinada a aprimorar as capacidades militares da Coreia do Norte - aumentando assim o perigo para o Japão e a Coreia do Sul - faria sentido que esses dois países fornecessem ajuda militar direta à Ucrânia. A Austrália já está fornecendo assistência militar direta, mas, como argumenta o general australiano aposentado Mick Ryan, ela pode e deve fazer mais.

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Norte-coreanos seguram retratos de Vladimir Putin e aplaudem enquanto uma comitiva com o presidente russo e o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, passa por uma rua em Pyongyang, na Coreia do Norte Foto: Gavriil Grigorov / Sputnik / via AP

Israel tem sido o grande retardatário entre as democracias do mundo no apoio à Ucrânia, mesmo com a Rússia assumindo uma postura cada vez mais favorável ao Hamas. Mas, embora Israel - atolado na guerra em Gaza e enfrentando a possibilidade de outra guerra no Líbano - não possa mais se dar ao luxo de doar equipamentos militares para a Ucrânia, ele ainda poderia aderir ao regime de sanções contra a Rússia. Essa seria a resposta perfeita para as exigências russas de que as Nações Unidas imponham sanções a Israel.

As principais potências não liberais do mundo reconhecem sua congruência de interesses e estão se aproximando para derrubar a ordem internacional baseada em regras. As democracias do mundo precisam ser, no mínimo, tão firmes ao enfrentar a ameaça do “alinhamento do mal”

Opinião por Max Boot
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