O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, reconheceu que houve falha na resposta ao terremoto de magnitude 7,8 que atingiu a Turquia e a Síria na segunda-feira, 6, e causou a morte de mais de 16 mil pessoas.
O governante visitou a província de Hatay, a mais afetada pelo desastre natural, na quarta-feira, 8, e reforçou que o clima frio também é um fator que não colabora com as operações de emergência. “Não é possível estar preparado para tal desastre”, afirmou Erdogan. Turcos criticaram as ações do governo e disseram que as equipes de resgate demoraram a chegar nos locais atingidos, e o presidente destacou que o “não deixará nenhum cidadão descuidado”.
À medida que cresce o número de mortes provocadas pelo terremoto que atingiu a Turquia, aumenta a insatisfação da população frente a reação do governo de Recep Erdogan ao desastre.
Autoridades e médicos informaram que 12.873 pessoas morreram na Turquia e 3.162 na Síria em áreas controladas pelo governo, enquanto nas regiões comandadas por rebeldes mais de 1.900 cidadãos foram vítimas fatais, conforme divulgado pelo grupo de socorristas voluntários conhecidos como Capacetes Brancos.
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Candidato à reeleição em maio, Erdogan usou a vistia ao local da tragédia para atacar adversários políticos que. segundo ele, espalham “mentiras e calúnias” sobre as ações do governo.
Enquanto isso, o líder da oposição, Kemal Kilicdaroglu, atribuiu à gestão de atual os efeitos devastadores do terremoto, ao dizer que o presidente não preparou o país para uma catástrofe como essa e fez mau uso do dinheiro disponível.
Buscas continuam
Os socorristas seguem em busca de pessoas soterradas nos escombros. Vários países, inclusive o Brasil, se mobilizaram para ajudar no resgate das vítimas, contudo, para especialistas, as chances de encontrar sobreviventes passados três dias da tragédia é pequena. “As primeiras 72 horas são consideradas críticas”, disse o especialista em riscos naturais da Nottingham Trent University, Steven Godby, à AP. “A taxa de sobrevivência em 24 horas, em média, é de 74%; após 72 horas, é de 22%; e no quinto dia, é de 6%”, acrescentou ele.
Para o professor de planejamento e gerenciamento de emergência da University College London, David Alexander, dados de terremotos anteriores confirmam a dificuldade para encontrar vítimas soterradas à essa altura. “Estatisticamente, hoje é o dia em que vamos parar de encontrar pessoas. Isso não significa que devemos parar de procurar.”, afirmou ele.
O professor disse também que o número exato de mortos pode demorar a ser conhecido devido à quantidade de escombros. Ainda assim, o número de vítimas fatais já superou o de um terremoto de magnitude 7,8 que matou 8.800 pessoas no Nepal em 2015, o que fez dos tremores na Turquia e na Síria o terremoto mais letal da década.
Revolta frente à tragédia
“Enfrentamos dificuldades no início com os aeroportos e as estradas, mas hoje estamos melhores e amanhã estaremos melhores”, disse Erdogan em Kahramanmaras, em resposta às críticas. “Estamos diante de um grande desastre. Meu povo sempre tem paciência. Tenho certeza de que minha nação mostrará paciência novamente.”
“Onde está o Estado? Onde está?”, perguntava desesperado um homem que se identificou como Ali, enquanto diminuíam suas esperanças de encontrar com vida o irmão e o sobrinho presos entre os escombros em Kahramanmaras.
“Onde estão as tendas, os food trucks?”, questionou Melek, 64, em Antakya, no sul do país, à agência de notícias Reuters. “Não vimos nenhuma distribuição de comida aqui, ao contrário do que houve em desastres locais anteriores. Sobrevivemos ao terremoto, mas vamos morrer de fome ou de frio aqui”, afirmou.
Resgate no frio
Durante dois dias e duas noites desde o terremoto de 7,8 graus de magnitude, milhares de socorristas trabalharam em temperaturas gélidas para encontrar sobreviventes. Dezenas de países, da China aos Estados Unidos, passando por Ucrânia e Emirados Árabes Unidos, prometeram ajuda à Turquia, que começou a receber equipes de emergência e material na terça-feira.
O diretor do Crescente Vermelho turco, Kerem Kinik, advertiu que as primeiras 72 horas foram críticas para os trabalhos de resgate, mas destacou que as ações foram prejudicadas pelas “severas condições meteorológicas”.
Em Sehitkamil, subúrbio de Gaziantep, em frente a um prédio reduzido a escombros, a sensação de abandono abala os sobreviventes ainda mais do que o frio. Muitos deles correram para a rua sem sequer calçar os sapatos quando foram acordados pelos tremores no meio da noite.
Lá, Ebru Firat, de 23 anos, tem consciência de haver cada vez menos chances de encontrar com vida a prima que desapareceu sob os escombros de sua casa. Como acontece com centenas de pessoas que esperam perante as ruínas, a dor se mistura muitas vezes com a raiva. “Já se passaram 36 horas desde o terremoto... o avanço é muito lento”, disse a jovem. “Quero ter esperança, mas…”
Cada minuto conta para encontrar sobreviventes, mas, nas horas posteriores à tragédia, não chegou nenhum socorrista nessa área. Foram os próprios parentes dos desaparecidos, às vezes acompanhados por policiais, os primeiros a usar as próprias mãos para fazer as buscas nos destroços.
Taxa do terremoto
“Não sabem pelo que o povo está passando. Onde estão nossos impostos recolhidos desde o terremoto de 1999?”, questiona ela, relembrando o desastre que deixou quase 17,4 mil mortos naquele ano ao devastar zonas altamente povoadas e industrializadas no noroeste da Turquia.
Depois dessa tragédia, estabeleceu-se um imposto especial denominado “taxa do terremoto”. A renda arrecadada desde 1999, estimada em 88 milhões de libras turcas (cerca de US$ 4,6 milhões), devia ser usada na prevenção de catástrofes e no desenvolvimento dos serviços de resgate. Mas ninguém sabe onde o dinheiro foi parar.
“Não há nenhuma região a que não chegam os serviços de resgate”, assegurou na noite de segunda-feira o presidente do Crescente Vermelho na televisão. “Mentira”, reagiu uma jovem que assistia, pedindo para continuar em anonimato. “Estamos abandonados”.
Existem relatos não confirmados de que o acesso ao Twitter está restrito naTurquia. Ele estava sendo usado como um canal para comunicar o paradeiro de pessoas presas nos escombros, mas a polícia turca disse ontem que deteve pelo menos quatro pessoas por “espalhar informações erradas” na plataforma e espalhar o pânico sobre o terremoto.
Na visita à região atingida, Erdoğan alertou para os turcos “ouvirem apenas canais oficiais” de informação e não “provocadores”. /AP, AFP, NYT e WASHINGTON POST /AP, AFP e EFE
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