Professores dos EUA se armam cada vez mais para se proteger de ataques em escolas

Em Ohio, nova lei exige apenas 24 horas de treinamento para funcionários de escola portarem armas; estratégia é criticada por democratas, associações de policiais e sindicatos de educadores

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Por The New York Times
Atualização:

RITTMAN, EUA - Mandi, professora de jardim de infância em Ohio, já havia feito o que podia para proteger sua sala de aula de um atirador. Ela colocou uma estante perto da porta, para o caso de ser preciso fazer uma barricada. Em um balde, guardava suprimentos de emergência dados pelo distrito escolar: inseticida em spray, para jogar na cara de um agressor, e uma meia cheia de objetos pesados para usar contra um invasor.

Mas depois que 19 crianças e dois professores foram assassinados em Uvalde, Texas, ela sentia um desespero cada vez maior. A escola onde trabalha fica em um prédio antigo, sem fechaduras automáticas nas portas ou polícia no campus. “Nós nos sentimos desamparados”, disse ela. “Isso não é suficiente.”

Mandi, professora de uma escola rural em Ohio, treina tiro para poder estar armada dentro da escola; ela diz que teme massacres no seu local de trabalho Foto: MADDIE MCGARVEY

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Ela decidiu que precisava de algo muito mais poderoso: uma pistola 9 milímetros. Então se inscreveu em um treinamento para poder levar uma arma na escola. Como outros nesta reportagem, ela pediu para ser identificada apenas pelo primeiro nome, em razão da regras do distrito escolar que limitam as informações sobre funcionários portando armas de fogo.

Há dez anos, era extremamente raro que os funcionários de uma escola carregassem armas. Hoje, depois de uma série aparentemente interminável de tiroteios em massa, a estratégia se tornou a principal solução apoiada por republicanos e defensores dos direitos das armas, os quais dizem que permitir professores, diretores e zeladores armados dá às escolas uma chance de lutar no caso de um ataque.

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Pelo menos 29 estados permitem o porte de armas por indivíduos que não são policiais ou agentes de segurança nas dependências da escola, de acordo com a Conferência Nacional de Legislaturas Estaduais dos Estados Unidos (NCSL, na sigla em inglês). Em 2018, o último ano para o qual as estatísticas estavam disponíveis, os dados da pesquisa federal estimam que 2,6% das escolas públicas do país tinham professores armados.

Esse número provavelmente aumentou.

Na Flórida, mais de 1.,3 mil funcionários de escola atuam como protetores armados em 45 distritos escolares, dos 74 no Estado, segundo as autoridades locais. O programa foi criado depois que um atirador matou 17 pessoas na escola Marjory Stoneman Douglas em Parkland, em 2018.

No Texas, pelo menos 402 distritos escolares – cerca de um terço no Estado – participam de um programa que permite que pessoas escolhidas, entre elas funcionários de escola, portem armas, de acordo com a Associação de Conselhos Escolares do Texas. Outro programa, que exige um treinamento mais longo, é adotado por um número menor de distritos escolares. A participação em ambos está em alta desde 2018.

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E nas semanas seguintes ao tiroteio em uma escola em Uvalde, os legisladores em Ohio tornaram mais fácil para professores e outros funcionários de escola portarem armas.

Especialistas contestam estratégia de dar armas a professores

A estratégia é contestada por democratas, associações de policiais, sindicatos de professores e defensores do controle de armas, que dizem que os programas para porte secreto de armas nas escolas – em vez de resolver o problema – só criarão mais riscos. Pesquisas anteriores mostraram que a grande maioria dos professores não deseja andar armada.

A lei em Ohio é controversa, sobretudo, porque não exige mais do que 24 horas de treinamento, além das oito horas de renovação do treinamento a cada ano.

“Para nós, isso é simplesmente ultrajante”, disse Michael Weinman, diretor de assuntos governamentais da Confraria da Polícia de Ohio (FOP, na sigla em inglês), a maior organização de segurança pública do estado. Para efeito de comparação, os policiais do estado passam por mais de 700 horas de treinamento. E os agentes de segurança em escolas – policiais que atuam nas instituições – precisam completar um treinamento adicional de mais 40 horas.

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Os apoiadores da lei dizem que 24 horas são suficientes porque, enquanto o treinamento da polícia inclui tudo, desde multas de trânsito a questões legais, os funcionários de escolas têm rigorosamente como foco o domínio da arma de fogo e a reação ao atirador em atividade.

Estudos a respeito de funcionários de escolas armados são limitados, e as pesquisas até agora encontraram poucas evidências de que a medida seja eficaz. Também há poucas provas de que os agentes de segurança nas escolas sejam amplamente eficazes na prevenção de tiroteios nas instituições, que são estatisticamente raros.

No entanto, armar funcionários de escola está ganhando interessados – em grande parte entre um pequeno grupo de pais e adultos nas pesquisas recentes.

Alvo usado em treinamento de três dias que professores de Ohio (EUA) fazem para poder levar armas para dentro da sala de aula Foto: MADDIE MCGARVEY

Dos cinco tiroteios em escolas com mais mortes já registradas, quatro – em Newtown, Connecticut; Uvalde, Texas; Parkland, Flórida; e Santa Fé, Texas – aconteceram nos últimos 10 anos.

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Foi essa possibilidade que levou Mandi e outros sete educadores a um campo de tiro escondido entre os campos de feno e as estradas agrícolas de Rittman, no nordeste de Ohio.

Durante três dias, Mandi praticou tiro, aprendeu como fazer um torniquete e treinou para responder a tiros em ritmo acelerado. Seu comportamento ali, disparando sua pistola sob o sol escaldante, contrasta com o de sala de aula, onde ela dança ao som de músicas para crianças de 5 anos, usa creme de barbear para atividades sensoriais e pendura na parede as obras de arte dos alunos.

O próprio fato de ela estar sendo treinada evidencia o fracasso doloroso do país em acabar com os tiroteios em massa e as responsabilidades pesadas que se acumulam sobre os ombros dos professores – recuperar o aprendizado dos alunos que foi prejudicado durante a pandemia, lidar com crises de saúde mental de crianças, tratar de conflitos em relação ao ensino de raça e gênero e agora, para alguns, defender suas escolas.

Mandi, na casa dos 40 anos, chegou ao treinamento com uma expectativa de preocupação. Ela é professora há mais de dez anos e também tem filhos. Ela tinha o desejo de garantir que poderia carregar sua arma com segurança perto dos alunos. “Sou abraçada o tempo todo”, disse ela.

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E depois havia a perspectiva de confrontar um atirador de verdade. Três dias de treinamento poderiam prepará-la para o impensável?

‘A única maneira de parar um cara mau com uma arma é um cara bom estar armado’

Os educadores vieram de Ohio e até mesmo de Oklahoma para um curso de 26 horas organizado pela FASTER Saves Lives, um importante programa de treinamento de porte de armas para funcionários de escola. Ele é comandado pela Fundação Buckeye Firearms, organização sem fins lucrativos que apoia o direito de manter e portar armas e trabalha em parceria a um importante grupo de lobby pelo porte de armas em Ohio. O grupo lobista, a Associação Buckeye Firearms, apoiou a nova lei estadual para o porte de armas por funcionários de escola.

Na última década, a fundação estima que gastou mais de US$ 1 milhão com o treinamento de pelo menos 2.600 educadores.

Sua estratégia está intimamente alinhada com um argumento que se tornou a marca registrada da Associação Nacional de Rifles (NRA, na sigla em inglês) e do lobby pelo porte de armas: “A única maneira de parar um cara mau com uma arma é um cara bom estar armado”.

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Sob essa perspectiva, os professores são os melhores “caras bons”. | TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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