OTTAWA - Os protestos contra a vacinação obrigatória anticovid e outras medidas de saúde em Ottawa protagonizadas pelos caminhoneiros alcançaram nesta terça-feira, 1º, a disputa política interna entre os opositores ao premiê Justin Trudeau. Pierre Poilievre, um dos nomes que brigam pela liderança do Partido Conservador, se reuniu com os caminhoneiros a quem elogiou por escolher a liberdade.
“Acabei de conversar com centenas de canadenses alegres, sal-da-terra, do tipo de canadense que faria qualquer coisa pelo outro, no protesto dos caminhoneiros. Eles escolhem a liberdade ao invés do medo”, tuitou Poilievre.
Dias de protestos contra as políticas de pandemia e uma profunda cisão dentro do movimento conservador do Canadá destacaram o crescente poder dos movimentos populistas de direita no país, segundo análise do jornal britânico The Guardian.
Nesta terça-feira, lojas de varejo e clínicas de vacinação em Ottawa permaneceram fechadas porque manifestantes, que viajaram para a capital do país sob o pretexto de protestar contra a obrigatoriedade da vacina para caminhoneiros, se recusaram a deixar a cidade.
Poilievre é um dos cotados para ocupar o lugar do líder Erin O’Toole, que corre o risco de cair por tentar levar o Partido Conservador mais ao centro. Ele recebeu críticas repetidas não apenas por perder uma eleição paraTrudeau, mas também pela forma como lidou com vários problemas nos últimos meses. A legenda deve decidir seu futuro nesta quarta-feira.
Apesar da declaração de seu colega de partido, o governador de Ontário, o conservador Doug Ford, disse que estava extremamente perturbado ao ver as pessoas profanarem os monumentos do país e acenar com suásticas e outros símbolos de ódio e intolerância.
Nas ruas, o que começou com um comboio de caminhoneiros protestando contra a obrigação de se vacinar se transformou, nos últimos dias, em bloqueios na capital do país e obstrução de uma passagem na fronteira com os EUA. Alguns manifestantes pressionaram funcionários de um abrigo para sem-teto para entregar comida a eles.
Em cenas destoantes da reputação dos canadenses de gentis e ordeiros, milhares de manifestantes em caminhões chegaram à capital no fim de semana, bloqueando deliberadamente o tráfego ao redor do Parliament Hill. Alguns urinaram e estacionaram no National War Memorial. Um dançou no Túmulo do Soldado Desconhecido. Outros carregavam placas e bandeiras com suásticas.
Pouca simpatia
Após o maior protesto pandêmico do Canadá até hoje, os manifestantes encontraram pouca simpatia em um país onde mais de 80% são vacinados. Muitas pessoas ficaram indignadas com alguns dos comportamentos grosseiros. A polícia anunciou que várias investigações criminais estão em andamento para apurar ilegalidades cometidas durante os protestos.
O chefe de polícia de Ottawa, Peter Sloly, disse que várias investigações estão em andamento e uma linha para denúncias de casos de crimes de ódio, ameaças e agressões relacionadas à manifestação foi aberta. Sloly disse que uma pessoa foi presa em conexão com o protesto.
O primeiro-ministro Trudeau chamou os manifestantes de Ottawa de “minoria marginal” e disse que eles refletem a proliferação de “desinformação e desinformação online, teóricos da conspiração sobre microchips, sobre Deus sabe o que mais combinar com os chapéus de papel alumínio”, em referência aos chapéus feitos com a crendice deproteger o cérebro de ameaças como campos eletromagnéticos e controle da mente.
Os organizadores, incluindo um que defendeu visões de supremacia branca, arrecadaram milhões para o Comboio da Liberdade. O movimento atraiu o apoio do ex-presidente dos EUA Donald Trump e do bilionário da Tesla, Elon Musk.
A insurreição foi vista como tão estranho para o Canadá que um cientista dos EUA se sentiu compelido a se desculpar pelo que ele retratou como influência da América. “O Canadá nos deu bondade, tolerância, poutine e hóquei e, por outro lado, exportamos esse terrível movimento falso de liberdade de saúde ligado ao extremismo da extrema direita que causou tanta perda de vidas sem sentido na América e agora pode fazer o mesmo lá", tuitou Peter Hotez, especialista em doenças infecciosas do Baylor College of Medicine, no Texas. "Nossas desculpas."
Muitos dos manifestantes se recusaram a usar máscaras em hotéis, shoppings e mercearias. O estudante Tim Abray disse que foi agredido pelos chamados combatentes da liberdade enquanto tirava fotos do protesto em seu bairro. /AP, REUTERS
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.