Com uma explosão de movimentos diplomáticos e militares, ameaças de restringir exportações importantes e ataques cibernéticos devastadores em redes americanas, Pequim transmitiu nas últimas semanas que, ao contrário do primeiro mandato de Donald Trump, está preparada para confrontar o próximo presidente dos Estados Unidos de frente.
Desde a eleição presidencial dos EUA, a China revelou um extenso manual de medidas comerciais retaliatórias agressivas contra Washington caso Trump decida impor tarifas adicionais sobre produtos chineses importados para os Estados Unidos.
Após uma proibição de exportações para os Estados Unidos de várias matérias-primas importantes em dezembro, as autoridades chinesas propuseram na semana passada restrições de exportação expandidas em tecnologias para processamento de minerais críticos usados em baterias para veículos elétricos — um setor onde domina o fornecimento global.
Ao mesmo tempo, Pequim já está trabalhando para explorar rachaduras no poder americano que podem surgir da imprevisível política externa de Trump. O país exibiu armamento avançado, fortaleceu a sua influência sobre países emergentes e se reconciliou com parceiros de segurança dos EUA na região do Pacífico, enquanto múltiplos ataques cibernéticos bem-sucedidos nos Estados Unidos demonstraram a sofisticação aumentada de seus hackers.
Isoladamente, cada ação se encaixa nos esforços de longa data da China para ganhar vantagem sobre os Estados Unidos em uma disputa global por influência. Juntos, a onda de atividades revela como Pequim está preparada para agir rápida e vigorosamente em um impasse diplomático e comercial intensificado com Trump, disseram analistas.
“A supressão da China sob Trump 1.0 fez a China desistir de suas fantasias sobre os Estados Unidos e fortaleceu a unidade chinesa”, disse Wang Wen, reitor do Instituto Chongyang da Universidade Renmin em Pequim. Pequim deve ver o retorno de Trump como uma “arma mágica” para incentivar seu impulso tecnológico e alcance de parceiros internacionais, acrescentou Wang.
“Para a China, a guerra comercial é apenas uma fração do panorama estratégico maior de competição com os Estados Unidos, e Trump é apenas um período dessa competição”, disse Yun Sun, diretor do programa da China no Stimson Center, um think tank. “O jogo longo é como ganhar a vantagem estratégica.”
Competição
A China está adotando essa postura linha-dura enquanto o Senado dos EUA se prepara para realizar audiências para aprovar indicados importantes da equipe de política externa de Trump, como o próximo secretário de Estado, Marco Rubio, conhecido por suas posições duras sobre a China, Elise Stefanik, que deve se tornar a próxima embaixadora americana na ONU e o apresentador Pete Hegseth para o cargo de secretário de Defesa.
Pequim não ficou parada em sua busca por uma vantagem. Os militares chineses terminaram 2024 com a revelação surpresa de dois protótipos de caças de sexta geração, semanas depois do envio de um número recorde de navios de guerra para águas ao redor de Taiwan, que Pequim reivindica como sua.
Na semana passada, a China deu as boas-vindas à Indonésia no bloco Brics, um grupo de nações em desenvolvimento que Pequim espera que ajude a remodelar a ordem global a seu favor. No mês passado, Pequim fez progressos descongelando tensões com o Japão, um membro-chave da parceria de segurança Quad revivida por Trump.
E tudo isso aconteceu enquanto autoridades dos EUA revelavam detalhes de ataques cibernéticos patrocinados pelo Estado chinês contra infraestruturas críticas, redes de celulares e no Departamento do Tesouro nos últimos meses. Pequim disse que não era responsável pelas intrusões.
Mesmo projetando força, a China manteve a porta aberta para um possível acordo para evitar uma guerra comercial. O ministério das Relações Exteriores disse na terça-feira que “atribui grande importância” à declaração de Trump em um talk show conservador de que ele “se daria muito bem” com o líder chinês Xi Jinping, desde que o relacionamento fosse uma “via de mão dupla”.
“Pequim está mantendo sua pólvora seca enquanto espera para ver o quão duro e rápido Trump agirá contra a China após sua posse”, disse Neil Thomas, especialista em política chinesa no Asia Society Policy Institute, um think tank.
Ainda assim, a equipe de política externa de Trump deve ser dominada por políticos linha-dura em relação a China, e o ritmo constante de anúncios sobre hackers chineses nos Estados Unidos criou um início tenso nas relações após 20 de janeiro.
Embora estejam ativos há décadas, os grupos de hackers chineses agora parecem estar “se aproximando do que provavelmente é o melhor período de capacidades de hackers chineses que já vimos”, disse Dakota Cary, especialista em China da empresa de segurança cibernética SentinelOne.
Hackers
A gama de alvos ilustra como as operações cibernéticas da China estão evoluindo, indo além de alvos comerciais ou militares óbvios, o que torna mais difícil identificar e repelir intrusões. Em um ataque, por exemplo, grupos ligados ao estado chinês usaram milhares de roteadores e outros dispositivos conectados à Internet para espionar organizações sensíveis.
O governo Trump “terá que confrontar isso de frente”, disse Cary.
A postura ousada de Pequim desta vez é um afastamento gritante do primeiro mandato de Trump. Na época, Xi respondeu cautelosamente, cortejando Trump com um tour exclusivo pela Cidade Proibida de Pequim. O presidente chines também falou sobre a importância do “respeito mútuo”.
Mesmo depois que Trump impôs tarifas abrangentes sobre produtos chineses, o governo chinês evitou mirar empresas americanas ou cortar exportações de minerais essenciais, concentrando-se em negociar um acordo, que foi finalmente fechado em janeiro de 2020.
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Estratégia
Entre o primeiro mandato de Trump e agora, Xi consolidou seu domínio sobre o Partido Comunista Chinês e aprimorou ferramentas de pressão econômica contra os Estados Unidos. Ele pediu que as empresas chinesas se isolassem de choques externos, concentrando-se na “circulação doméstica” e confiando menos em compradores americanos.
“Depois de lidar com Trump por quatro anos, a China o entende melhor”, disse Ren Xiao, ex-diplomata chinês e professor de política internacional na Universidade Fudan em Xangai. “Estamos mais confiantes e preparados.”
A estratégia revisada da China é em parte informada pela frustração de Pequim com um relacionamento consistentemente tenso com os Estados Unidos desde que Trump deixou o cargo.
Em sua reunião final com o presidente Joe Biden, Xi estabeleceu os limites de sua tolerância a Trump quando apontou quatro “linhas vermelhas” que os Estados Unidos não devem cruzar se quiserem evitar represálias.
Junto com reclamações de longa data sobre Taiwan, direitos humanos e o sistema político chinês, Xi ressaltou que o “direito ao desenvolvimento” do povo chinês era agora considerado um interesse central que não deve ser desafiado.
Esse direito é “inalienável e não pode ser ignorado”, disse o Ministério das Relações Exteriores da China na terça-feira, quando instou o Pentágono a reverter uma decisão de colocar na lista negra a maior empresa de tecnologia e fabricante de baterias para veículos elétricos da China. “A China tomará todas as medidas necessárias para defender firmemente” suas empresas, disse um porta-voz.
Economia
As declarações de Pequim nem sempre corresponde à realidade, no entanto.
A economia da China ainda está sobrecarregada pela fraca confiança do consumidor, uma prolongada crise imobiliária e um flerte com a deflação. Mesmo após um estímulo de US$ 1,4 trilhão no final do ano passado, muitos economistas preveem que o produto interno bruto para 2024 ficará abaixo da meta de crescimento de 5%.
A agenda militar e diplomática de Xi também enfrenta sérios obstáculos. Um escândalo de corrupção que derrubou dois ministros da defesa e o principal comissário político militar pode ter atrasado uma ambiciosa agenda de modernização, disse o Pentágono em dezembro.
As tensões com o Japão permanecem altas sobre as ilhas disputadas no Mar da China Oriental. Uma recente distensão com a Índia já está sendo testada pelos planos chineses de construir uma enorme represa no Tibete.
No entanto, a China está pronta para “tirar vantagem da falta geral de confiança dos aliados dos EUA [em Trump] e potenciais atritos para equilibrar a influência americana”, disse Qiu Huafei, professor da Universidade Tongji em Xangai.
Isso é especialmente verdadeiro para Taiwan, que Pequim frequentemente chama de “núcleo de seus principais interesses”, onde Qiu prevê mais sanções visando indivíduos e empresas americanas que vendem armas para Taipei. “As sanções pode causar algumas perdas econômicas para a China, mas esse é um preço que vale a pena pagar para transmitir a posição dura da China”, disse ele.
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