BERLIM - A Alemanha deu início, na segunda-feira, 4, às comemorações dos 30 anos da queda do Muro de Berlim, em um ambiente sombrio marcado por um clima semelhante ao da Guerra Fria e uma intensificação dos movimentos nacionalistas pelo mundo.
Longe das esperanças despertadas com o fim da Cortina de Ferro, o prefeito de Berlim, Michael Müller, lançou uma advertência "diante da situação (atual) do mundo".
"É preciso que todos se comprometam juntos pela liberdade, liberdade de imprensa, liberdade de opinião, liberdade de culto", disse o prefeito em um discurso na Alexanderplatz, perto das longas avenidas onde ocorreram as gigantescas manifestações que levaram à queda do muro, em 9 de novembro de 1989.
Müller lembrou que essa "revolução pacífica", que permitiu a união dos alemães, se desenvolveu "sem o derramamento de uma gota de sangue".
A Alemanha planejou um programa político mínimo para essa comemoração, cujo principal dia será o sábado, aniversário da abertura de uma fronteira que separou os berlinenses do leste e do oeste por mais de 28 anos.
Há dez anos, líderes de todo o mundo, incluindo as quatro forças aliadas da 2ª Guerra, se reuniram no Portão de Brandemburgo, em Berlim, epicentro de anos da divisão da cidade e do continente, para derrubar um muro falso, erguido para a ocasião.
A mensagem era clara: os muros e divisões são temas do passado. Há cinco anos, balões luminosos foram lançados ao longo do caminho da antiga muralha para simbolizar o fim das divisões.
Desta vez, sem grandes comemorações
O ambiente político na Alemanha é rarefeito e mais polarizado do que nunca devido à ascensão da extrema direita que se opõe à imigração e à chanceler Angela Merkel.
O programa desta semana inclui uma série de exposições, encontros com palestrantes e shows nos locais que foram palco da revolução de 1989.
Europa central
Merkel fará um discurso no sábado num local onde ficava parte do Muro de Berlim. Acompanhada pelos líderes poloneses, checos, eslovacos e húngaros, destacará "a contribuição dos Estados da Europa Central na revolução pacífica" de 1989.
No mesmo dia, na parte da tarde, o chefe de Estado, Frank-Walter Steinmeier, vai discursar no Portão de Brandeburgo.
"A unidade alemã é um presente da Europa para a Alemanha, no fim de um século em que os alemães infligiram sofrimentos inimagináveis neste continente ", disse o chefe da diplomacia alemã, Heiko Maas.
Já o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, tem previsto uma viagem à Alemanha, onde em 1989 foi enviado como soldado para a fronteira que dividia o país europeu em dois.
A queda da Cortina de Ferro, que dividiu a Europa do pós-guerra, previa um tempo de distensão e unidade, desarmamento e extensão do modelo democrático liberal, mas a direção do vento parece ter mudado e a perspectiva atual é muito mais sombria.
Nova Guerra Fria?
As fronteiras voltaram. A União Europeia acusa países que saíram do comunismo há 30 anos, como Hungria ou Polônia, de agora questionar o estado de direito, numa época em que a tentação nacionalista ganha força nos discursos.
"Na geopolítica, a Guerra Fria voltou, mas desta vez com uma diferença", alertou no ano passado o secretário-geral da ONU, António Guterres. "Porque os mecanismos e garantias que anteriormente permitiam controlar os riscos de escalada parecem não existir mais", afirmou Guterres.
Em um dos exemplos do atual cenário, os Estados Unidos deixaram o tratado de desarmamento INF assinado com a então União Soviética em 1987 e acusa Moscou de violá-lo, abrindo caminho para uma nova corrida armamentista contra a Rússia.
Por sua vez, Moscou coloca suas fichas em todos os lugares dos quais Washington se retira, como o Oriente Médio, assim como a China.
Para a visita de Pompeo, o Departamento de Estado americano divulgou que discutirá "a necessidade de maior envolvimento diante das crescentes ameaças da Rússia e da China".
O último presidente soviético, Mikhail Gorbachev, ainda popular na Alemanha por não se opor à queda do muro, não está otimista 30 anos depois.
O atual confronto entre os países ocidentais e a Rússia coloca o mundo em um "perigo colossal" devido à presença de armas nucleares, concluiu recentemente numa entrevista à emissora britânica BBC . / AFP
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