O rei da Dinamarca, Frederik X, revelou um novo brasão real que destaca mais a Groenlândia no emblema monárquico em meio à pressão pública do presidente eleito americano, Donald Trump, para anexar o território dinamarquês aos Estados Unidos. A proposta, que não é nova e já foi feita por Trump em seu primeiro mandato, estremeceu as relações entre os dois países.
O Rei emitiu uma declaração em dezembro para mudar o brasão real pela primeira vez em mais de 50 anos, disse a casa real dinamarquesa em um comunicado em 1º de janeiro. O novo design, que substitui o que a mãe de Frederik, a Rainha Margrethe, estabeleceu em junho de 1972, fortalece a proeminência dos territórios ultramarinos no brasão real.
O quadrante inferior esquerdo do escudo no centro do brasão anteriormente apresentava três coroas representando a união da Suécia, Noruega e Dinamarca, bem como símbolos das duas partes da Comunidade Dinamarquesa: um urso polar para a Groenlândia e um carneiro para as Ilhas Faroé. No novo brasão, as coroas foram removidas, e o urso polar e o carneiro têm seus próprios quadrantes.
A ação do rei representa uma “continuação” do papel tradicional da família real dinamarquesa como construtora de pontes dentro da Comunidade, disse Mikkel Runge Olesen, pesquisador sênior no Instituto Dinamarquês de Estudos Internacionais. Os reis dinamarqueses historicamente desempenharam o papel “de manter o reino unido”, disse Olesen.
À medida que Trump se prepara para seu segundo mandato, ele está novamente promovendo a ideia de a Groenlândia se tornar parte dos Estados Unidos — mesmo depois de oficiais dinamarqueses e groenlandeses terem descartado a ideia nos anos que se passaram anos após ele a trazer à tona pela primeira vez.
Nesta terça, ele ameaçou a Dinamarca com tarifas de importação caso o Reino não concorde com a venda e disse não descartar uma opção militar para anexar a Groenlândia por conta de seu papel estratégico para os EUA.
Além disso, Donald Trump Jr., filho do presidente, chegou hoje à Groenlândia para uma visita de caráter pessoal. O presidente eleito escreveu na segunda-feira em sua rede social Truth Social que seu filho “e vários representantes” viajariam para a Groenlândia para “visitar algumas das áreas e vistas mais magníficas”.
“A Groenlândia é um lugar incrível, e as pessoas se beneficiarão tremendamente se, e quando, se tornar parte de nossa Nação”, disse Trump. “Nós a protegeremos e valorizaremos, diante de um Mundo exterior muito cruel.”
Colonizada pela Dinamarca no século 18, a Groenlândia, uma ilha ártica aproximadamente três vezes o tamanho do Texas, com uma população de cerca de 57.000 pessoas. Desde 1979, é um território autônomo com seu próprio parlamento e governo e vem lutando pela independência da Dinamarca.
A ilha abriga uma grande base militar dos EUA, e Washington vê o território como uma localização estratégica chave enquanto a competição com a China e a Rússia aumenta no Ártico.
No último mês, Trump disse: “Para fins de Segurança Nacional e Liberdade em todo o Mundo, os Estados Unidos da América sentem que a propriedade e controle da Groenlândia são absolutamente necessários”.
Trump inicialmente propôs comprar a Groenlândia durante seu primeiro mandato, provocando rejeições de oficiais groenlandeses e dinamarqueses. Ele cancelou uma visita de Estado planejada de dois dias à Dinamarca em 2019 depois que a Primeira-Ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, chamou a ideia da venda de “absurda”.
As relações eventualmente melhoraram, e oficiais dos EUA e da Dinamarca caracterizaram uma chamada entre Trump e Frederiksen em agosto de 2019 como “construtiva”.
“Todos seguiram em frente”, disse Olesen, mas a questão do status da Groenlândia permanece “um assunto delicado”.
Como os oficiais dinamarqueses responderão às investidas de Trump sobre a Groenlândia durante seu segundo mandato ainda é uma incógnita. Mas a situação pode ser ligeiramente diferente desta vez, disse Olesen. Em outubro, três ex-oficiais da administração Trump escreveram em um editorial para o National Interest a favor de um acordo de livre associação EUA-Groenlândia, reconhecendo a soberania do governo dinamarquês sobre o território.
Embora Trump não tenha falado publicamente sobre a ideia e não esteja claro se a proposta dos ex-oficiais representa seu pensamento, o editorial poderia indicar um amolecimento da postura do presidente eleito, disse Olesen.
A campanha de Trump não se pronunciou sobre a mudança do brasão.
Para o governo dinamarquês, esta situação é “uma enorme dor de cabeça”, disse Olesen. Não pode ser visto pressionando a Groenlândia ou colocando em risco as relações com Washington, das quais depende para garantias de segurança através da Otan.
Copenhague concentrou-se em aumentar seu apoio à ilha: além de uma concessão anual de cerca de $511 milhões, o ministro da Defesa da Dinamarca anunciou no mês passado um pacote de defesa para a Groenlândia que chega a cerca de $1,5 bilhão.
Frederik também destacou a importância da Groenlândia em seu discurso de Ano Novo.
“Todos nós somos unidos e cada um de nós comprometido pelo Reino da Dinamarca”, disse ele. “Da minoria dinamarquesa no Sul de Schleswig — que está até situada fora do Reino — e até a Groenlândia. Nós pertencemos juntos.”
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