LONDRES (WASHINGTON POST) - As legisladoras britânicas estão proibidas de levar os bebês para os debates parlamentares, decidiu o Reino Unido nesta quinta-feira, 30. As regras foram revistas após uma parlamentar sofrer uma reprimenda por levar o filho de 3 meses a uma sessão.
Alguns políticos britânicos pediram a mudança após a trabalhista Stella Creasy receber uma notificação por levar ao Westminster Hall no ano passado o filho recém-nascido, que dormia, em uma mochila de carregar bebê conhecida no Brasil como canguru.
No boletim publicado nesta quinta-feira, a comissão de procedimento afirmou que a “tradicional prática” de manter bebês fora do recinto durante os debates deve permanecer em vigor para que parlamentares possam “observar, iniciar, falar ou intervir em procedimentos”.
Em resposta ao boletim, Creasy afirmou que o banimento afronta esforços para permitir que “política e criação de filhos coexistam”, particularmente em relação a novas mães.
“Eles não reconhecem que são mulheres que têm filhos que acabam apartadas do Parlamento por essas regras e abordagens antiquadas, assim como a necessidade de se modernizar”, afirmou Creasy ao Washington Post por e-mail.
O presidente da Câmara dos Comuns, a câmara baixa do Parlamento britânico, pediu a revisão após a indignação de Creasy e seus apoiadores, enquanto alguns reclamaram que crianças são distrações. Um legislador conservador afirmou que a legislatura “não é lugar” para um bebê.
O Reino Unido não é o único país a reconsiderar convenções nos anos recentes, enquanto muitos pensam em formas de superar as incompatibilidades que afastam as mães e as famílias das instituições responsáveis pelas decisões que as afetam, e como tornar o mundo da política, há muito dominado por homens, mais receptivo para as mães.
Questionamentos similares surgiram após uma legisladora dinamarquesa ouvir que sua bebê “não é bem-vinda” nas câmaras legislativas, em 2019, e quando uma legisladora alemã foi expulsa de um Parlamento estadual por levar ao recinto seu filho de 6 semanas de vida, em 2018.
A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern — segunda governante eleita no mundo a dar à luz durante o mandato, depois da paquistanesa Benazir Bhutto, em 1990 — chamou a atenção quando levou sua bebê à Assembleia-Geral da ONU, em 2018.
Também em 2018, a senadora Tammy Duckworth, democrata do Illinois, nos EUA, votou enquanto segurava no colo seu bebê de 10 dias de vida, na primeira vez que um recém-nascido teve a presença permitida no recinto do Senado. A Casa acabava de aprovar uma regra permitindo a presença de crianças com menos de 1 ano no recinto.
Diretrizes de autoridades de saúde, incluindo os Centros para Controle e Prevenção de Doenças, afirmam que recém-nascidos requerem alimentação pelo menos a cada duas a quatro horas, e alguns bebês precisam ser amamentados de hora em hora.
O boletim publicado nesta quinta-feira no Reino Unido afirmou que legisladoras levaram bebês aos debates “sem nenhuma perturbação” desde 2018, mas que isso “contribuiu para alguma confusão e um lapso entre a prática da Casa e suas diretrizes”. O texto afirma que parlamentares “deveriam exercitar parcimoniosamente” a discrição.
O boletim reconhece que as regras não têm sido totalmente claras, notando “uma falta de conhecimento das diretrizes”.
Creasy expressou sua decepção no boletim. Ela fez lobby por assistências-maternidade mais adequadas para parlamentares, com o objetivo de encorajar mulheres a entrar na vida política. A Câmara dos Comuns atualmente possui um número recorde de 225 legisladoras, o que corresponde a cerca de 35% do total de parlamentares na Casa.
Ainda que legisladoras que dão à luz possam obter o benefício do voto à distância e algum financiamento adicional por seis meses, críticas relatam que isso é insuficiente para viabilizar seu trabalho de representar o interesse do eleitorado.
“A mudança só virá quando começarmos a escutar as pessoas que estão fora do status quo”, afirmou Creasy. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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