Reino Unido registra recorde de temperatura, e Paris se mostra vulnerável em meio à onda de calor

Londres marcou 40,2º C, quebrando o recorde registrado duas horas antes; a capital francesa registra 15º C a mais do que o previsto para julho e expõe seu despreparo frente às mudanças climáticas

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Por Redação
Atualização:

LONDRES - O Reino Unido registrou a temperatura mais alta de sua história nesta terça-feira, 19, de acordo com uma leitura provisória do escritório de meteorologia do país. Os termômetros marcaram 40,2° C no aeroporto de Heathrow, em Londres, quebrando o recorde registrado cerca de duas horas antes na cidade de Charlwood, no sul da Inglaterra, que bateu 39,1° C. Antes, a maior temperatura no país havia sido registrada em 2019, de 38,7° C.

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Ao mesmo tempo, Paris registrou máximas de 41° C, aproximadamente 15° C acima da temperatura máxima média prevista para julho - um patamar próximo da temperatura recorde de 42,9° C registrado durante a onda de calor de 2019. A onda de calor na Europa continua causando estragos nas infraestruturas dos países e incêndios florestais intensos de Portugal aos Bálcãs, levando a centenas de mortes relacionadas ao calor.

“Pela primeira vez superamos os 40° C no Reino Unido”, anunciou a agência meteorológica Met Office, do Reino Unido, em uma publicação nas redes sociais, afirmando que o registro foi feito às 12h50 (08h50 em Brasília) e que as temperaturas ainda estão subindo em muitos lugares do país.

O novo recorde ocorre em meio à grave onda de calor que vem varrendo a Europa desde a semana passada. Uma grande parte da Inglaterra, de Londres a Manchester, permanece sob o primeiro alerta do país de calor “extremo” no país, decretado na segunda-feira, 18, quando as previsões apontavam para temperaturas acima dos 40° C nos próximos dias. O alerta indica que há perigo de morte mesmo para pessoas saudáveis.

Números provisórios do Met Office mostraram que mesmo durante a noite a temperatura permaneceu acima de 25° C em partes do país pela primeira vez. Na segunda-feira, a cidade de Aberystwyth, no País de Gales, o recorde local havia sido batido: 35,3 °C, enquanto o aeroporto de Luton, em Londres, teve que fechar sua pista por causa dos danos causados à pista pelo calor.

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Pessoas usam sombrinhas para se proteger do sol durante onda de calor em Londres. Foto: Neil Hall/ EFE

Paris despreparada

A cidade de Paris, que está em alerta laranja como a maior parte do país devido às altas temperaturas que vêm sendo registradas desde segunda-feira, mostra-se mal preparada para enfrentar os cada vez mais frequentes verões escaldantes, que os especialistas apontam como efeito do aquecimento global.

A capital francesa possui uma das maiores densidades populacionais no mundo, com edifícios residenciais e prédios de escritórios ocupando grande parte da superfície da cidade, deixando pouco espaço para a refrescante presença de parques e árvores. Seus telhados de zinco e longas vias asfaltadas acumulam o calor, sufocando moradores que têm mergulhado de roupa nas fontes do Trocadero.

Na semana passada, a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, anunciou a criação de um projeto que examinará “políticas destinadas a adaptar Paris a superondas de calor”, que a Prefeitura solenemente apelidou de “Paris 50º”.

Parisienses e turistas se refrescam nas fontes da Pirâmide do Museu do Louvre em Paris, França  Foto: CHRISTOPHE PETIT TESSON/EPA/EFE

A capital francesa é particularmente vulnerável às chamadas “ilhas urbanas de calor”, fenômeno em que cidades experimentam temperaturas mais altas do que seus entornos rurais — em razão das superfícies secas de telhados e pavimentos que absorvem a radiação solar de ondas curtas e a transformam em calor, que emana para o ambiente durante a noite.

A agência Météo France, serviço meteorológico nacional, estimou que as temperaturas de Paris ficam entre 5ºC e 10ºC mais elevadas do que seu entorno.

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Mortes e estragos na infraestrutura

O clima excepcionalmente quente e seco tomou conta de grandes áreas do continente. Pelo menos 748 mortes relacionadas ao calor foram relatadas na onda de calor na Espanha e em Portugal, onde as temperaturas atingiram 47° C no início deste mês. Pelo menos cinco pessoas se afogaram em todo o Reino Unido em rios, lagos e reservatórios enquanto tentavam se refrescar.

Muitas pessoas lidaram com a onda de calor ficando paradas. O tráfego rodoviário caiu de seus níveis habituais na segunda-feira. Os trens funcionavam em baixa velocidade por medo de que a temperatura causasse problemas nos trilhos. A estação Kings Cross de Londres, um dos centros ferroviários mais movimentados do país, estava vazia na terça-feira, sem trens na movimentada linha da costa leste que liga a capital ao norte e à Escócia.

O secretário de Transportes Grant Shapps disse que a infraestrutura de transporte do Reino Unido, algumas datando da época vitoriana, “simplesmente não foi construída para suportar esse tipo de temperatura – e levará muitos anos até que possamos substituir a infraestrutura pelo tipo de infraestrutura que poderia”.

Especialistas em clima alertam que o aquecimento global aumentou a frequência de eventos climáticos extremos, com estudos mostrando que a probabilidade de as temperaturas no Reino Unido atingirem 40° C agora é 10 vezes maior do que na era pré-industrial. A seca e as ondas de calor ligadas às mudanças climáticas também tornaram os incêndios florestais mais difíceis de combater.

A executiva-chefe da Royal Meteorological Society da Grã-Bretanha, Liz Bentley, alertou na segunda-feira sobre possíveis problemas de infraestrutura em todo o país nos próximos dias, incluindo estradas derretidas, falta de energia, trilhos de trem dobrados e incêndios florestais, com temperaturas que poderiam chegar até 42 ° C.

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“Este é um cenário extremo. É realmente uma consequência das mudanças climáticas. Acho importante passarmos essa mensagem. É provável que vejamos mais disso daqui para frente”, disse Liz.

Fogo se espalha pela Europa

Na França e na Espanha, bombeiros ainda lutam contra grandes incêndios florestais que forçaram o deslocamento de milhares de pessoas. Nesta terça-feira, mais de 2 mil bombeiros estavam enfrentando um incêndio no sudoeste que queimou quase 80 Km² de floresta seca na área de Gironde, no sudoeste do país, de onde cerca de 37 mil pessoas já foram retiradas.

Incêndio florestal perto de Landiras, na região de Gironde, no sudoeste da França. Foto: SDIS 33 via AP - 16/07/2022

Na pequena cidade de La Teste-de-Buch, perto do popular destino de férias de Arcachon Bay, um quartel-general temporário de combate a incêndios fervilhava. Caminhões de bombeiros corriam enquanto helicópteros e aviões que lançavam água sobrevoavam e os oficiais revisavam mapas codificados por cores das chamas.

Enquanto as temperaturas caíram durante a noite, quando o ar frio do oceano empurrou a onda de calor ainda mais para nordeste, os esforços dos bombeiros foram prejudicados por fortes rajadas de vento, condições áridas e árvores queimadas que enviaram brasas pelo ar, espalhando ainda mais as chamas.

As enormes nuvens de fumaça cinza e vermelha que surgiram dos incêndios chegaram até Bordeaux, cerca de 48 quilômetros a nordeste. Um cheiro de queimado pairava no ar e as autoridades de saúde recomendaram que os moradores – especialmente pessoas vulneráveis, como aqueles com doenças respiratórias – ficassem dentro de casa e limitassem a atividade física intensa.

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Caminhões e carros circulam em autoestrada invadida pela fumaça causada pelo incêndio florestal a cinquenta quilômetros ao sul de Bordeaux. Foto: Bob Edme/ AP - 18/07/2022

Na Espanha, onde a onda de calor extremo começou há nove dias, os incêndios persistem, especialmente na província de Zamora, no noroeste, que já sofreu um grande incêndio há um mês. Segundo as autoridades regionais, quase 6.000 pessoas tiveram que ser deslocadas. O tráfego ferroviário permaneceu suspenso entre Madri e Galiza, região conhecida como uma das maiores reservas de lobos da Europa, onde quase 30.000 hectares de terra já foram queimados em um incêndio anterior em junho.

Chamas gigantes cercaram um trem que faria uma parada em Madri na segunda-feira, causando alarme que foi capturado em um vídeo dramático por um passageiro a bordo.

“Vimos o fogo se aproximando dos dois lados e se aproximando a cada segundo”, disse o passageiro, Francisco Seoane Pérez, que postou imagens no Twitter. “Foi como se o dia se transformasse em noite de repente”, acrescentou.

O vídeo - postado com a mensagem “momentos de pânico” - vai de um lado do vagão para o outro, mostrando chamas saltitantes e nuvens de fumaça espessa. Passageiros com rostos ansiosos podem ser vistos e ouvidos perguntando por que o maquinista parou no meio de um incêndio. “O que ele está fazendo?” diz um passageiro.

Após vários dias em que as temperaturas ultrapassaram os 40ºC em grande parte do país, a agência de meteorologia espanhola anunciou uma pequena trégua.

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Mas o termômetro deve permanecer próximo de 40ºC em algumas áreas e voltar a subir a partir de quarta-feira, especialmente em Madri e Andaluzia. Uma máxima de 44ºC pode ser alcançada novamente em Sevilha neste fim de semana.

Na Bélgica, os principais museus oferecem entrada gratuita para pessoas com mais de 65 anos para que possam escapar do calor. As temperaturas também devem chegar a 40°C no oeste da Alemanha, onde o medo da seca levou o presidente da associação de agricultores, Henning Christ, a alertar sobre “grandes prejuízos” na produção de alimentos. /AP, , EFE, AFP e NYT

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