O primeiro-ministro do Rishi Sunak decidiu adiar os compromissos climáticos do Reino Unido, como a proibição de novos carros movidos a gasolina ou diesel. No anúncio desta quarta-feira, 20, o líder conservador citou os custos para os consumidores britânicos, que viram a inflação disparar como efeito da guerra na Ucrânia. O recuo, no entanto, irritou ativistas, políticos do próprio partido e a indústria automobilística.
Com o recuo, os carros a combustão que seriam proibidos a partir de 2030 agora ficarão disponíveis no mercado até 2035. O governo também flexibilizou os planos para acabar com os aquecedores a gás e abriu exceções para as famílias com dificuldade de fazer a transição energética.
Em entrevista coletiva convocada de última hora, o primeiro-ministro alegou que as metas para “ganhar as manchetes” foram mal pensadas e pouco debatidas. Atrás do púlpito com a frase “decisões de longo prazo para um futuro melhor”, Sunak argumentou que os britânicos podem não estar prontos para arcar com os custos da transição e defendeu uma “abordagem mais pragmática e realista” para zerar as emissões de carbono.
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‘Da liderança a lanterna’
A pauta ambiental tem sido um dos raros pontos de consenso entre conservadores e trabalhistas no primeiro país do mundo a colocar em lei o compromisso de cortar as emissões de gases do efeito estufa com o Britain’s Climate Change Act, de 2008. Por isso, o recuo de Rishi Sunak despertou críticas de todos os lados.
O ex-primeiro-ministro Boris Johnson — responsável pela meta de trocar todos os carros por modelos elétricos a partir de 2030 — declarou que os britânicos não podem “perder a ambição para o país” e engrossou o coro contra decisão do governo. Enquanto os ambientalistas da ONG Greenpeace afirmaram que o Reino Unido foi da “liderança para lanterna” na pauta ambiental.
No momento em que os conservadores aparecem atrás nas pesquisas de intenção de voto, o primeiro-ministro nega que o recuo seja eleitoreiro e rebate que os críticos têm que explicar porque querem impor mais custos às famílias britânicas. Na oposição, o partido Trabalhista prometeu retomar a meta de proibir os veículos a combustão a partir de 2030 se confirmar o favoritismo e vencer as eleições geradas para o ano que vem.
Essa incerteza preocupa a indústria automobilística que já se preparava para a transição. A Associação de Fabricantes e Vendedores de Automóveis criticou a confusão causada pela decisão do governo, posição que foi seguida pelas montadoras.
“Nosso negócio precisa de três coisas do governo do Reino Unido: ambição, comprometimento e consistência. O relaxamento prejudicaria todos os três”, disse a presidente da Ford no país, Lisa Brankin. Na mesma linha, a Stellantis, dona de marcas como Fiat, Citroën e Peugeot, destacou que os governos precisam ser claros sobre a legislação, especialmente em questões ambientais que “impactam a sociedade como um todo”.
Polêmicas na pauta ambiental
O governo anunciou a decisão de deixar as metas climáticas para depois no dia em que o rei Charles III fez a sua primeira visita de Estado à França. O monarca sempre foi um defensor ativo da pauta ambiental e, inclusive, aproveitou a viagem ao país vizinho para debater o financiamento de ações contra o aquecimento global. O ministro do Clima, Graham Stuart, também estava fora do Reino Unido participando do encontro da ONU, às margens da Assembleia-Geral das Nações Unidas em Nova York.
O anúncio veio de surpresa nesta quarta-feira, mas não foi a primeira polêmica do governo nessa área. Em junho, o órgão independente que aconselha Downing Street em políticas climáticas lamentou a “preocupante lentidão” da transição no país, particularmente no cumprimento das metas para 2030.
No mês seguinte, Sunak anunciou novas licenças para exploração de petróleo e gás no Mar do Norte. Na ocasião, o primeiro-ministro argumentou que era melhor encontrar soluções caseiras do que recorrer ao fornecimento da Rússia enquanto o país precisar de combustíveis fósseis durante a transição para energia verde./ W. Post e AFP
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