Ex-secretário do Tesouro de Boris Johnson, Rishi Sunak foi apontado como novo primeiro-ministro do Reino Unido nesta segunda-feira, 24, tornando-se a primeira pessoa de uma família de imigrantes a alcançar o cargo. Único candidato a obter ao menos 100 declarações de apoio de parlamentares no processo eleitoral, Sunak herdará um Partido Conservador fraturado e um país em crise, pressionado pelo aumento do custo de vida e pela instabilidade política.
Eleito menos de 50 dias depois de ser derrotado por Liz Truss na votação que definiu a sucessão de Boris Johnson, Sunak se mostrou consciente do cenário conturbado que o espera no governo, em um rápido discurso, o primeiro após a confirmação do resultado.
“O Reino Unido é um grande país, mas não há dúvida de que enfrentamos um profundo desafio econômico. Precisamos agora de estabilidade e unidade, e farei de minha maior prioridade unir nosso partido e nosso país”, afirmou o novo premiê em pronunciamento transmitido da sede do Partido Conservador, em Londres, por volta das 16h10 (12h10 em Brasília).
O caminho de Sunak ao Número 10 de Downing Street já parecia certo no domingo, 23, quando o ex-premiê (e seu ex-chefe) Boris Johnson anunciou que não tentaria um novo mandato. A última adversária restante, Penny Mordaunt, retirou a candidatura minutos antes do prazo limite, nesta segunda, aparentemente sem ter conseguido o mínimo de declarações de apoio para levar a disputa à votação entre os filiados. Em uma publicação nas redes sociais, ela disse apoiar a escolha de Sunak.
Sir Graham Brady, chefe do comitê de 1922 (que cuida das eleições do Partido Conservador), anunciou pouco depois das 10h que apenas uma candidatura havia sido registrada na eleição para decidir a nova liderança do partido.
“Como oficial responsável nesta eleição de liderança, posso confirmar que recebemos uma candidatura válida”, disse Brady, sendo interrompido pela comemoração dos parlamentares reunidos no gabinete central do Partido, em Londres, para o anúncio. “E Rishi Sunak está, portanto, eleito líder do Partido Conservador”.
Sunak teve uma ascensão meteórica nas fileiras conservadoras. Eleito deputado pela primeira vez em 2015, representando Yorkshire, ele se tornou secretário do Tesouro - considerado por muitos o 2° cargo em importância no governo britânico - aos 39 anos, em 2020. Sua demissão em julho passado foi considerada vital para a queda do governo Johnson. Agora, aos 42 anos, vai liderar o país.
Filho de um médico e de uma farmacêutica, e neto de indianos que emigraram da África Oriental colonial britânica, Sunak nasceu em Southampton, no litoral sul da Inglaterra. Durante a infância, o novo premiê britânico frequentou o Winchester College, uma escola particular de elite do país, e disse ter aprendido sobre negócios no balcão da pequena farmácia da mãe.
Em uma entrevista à rede britânica BBC, Sunak revelou que ele e a família sofreram racismo, lembrando de um caso específico, quando era adolescente, em que ele e os irmãos foram chamados por termos ofensivos enquanto comiam em uma rede de fast-food. “Doeu, ainda me lembro, está marcado na minha memória”, disse na entrevista, acrescentando “não conceber” que isso aconteça hoje em dia.
Após se formar no colegial, Sunak frequentou o curso de Filosofia, Política e Economia da Universidade de Oxford. De acordo com o jornal inglês Financial Times, o jovem Rishi demonstrava mais interesse por economia do que por política, na época, tendo optado por participar da sociedade de investimentos da instituição, em vez de entrar para a união de debates. Foi em Oxford que ele conheceu a mulher, Akshata Murty, filha de um bilionário indiano da tecnologia.
Antes de entrar na política, Sunak ainda concluiu um MBA na Universidade de Stanford e trabalhou por anos na Goldman Sachs e como analista para os fundos hedge TXI e Theleme Partners.
Embora ainda precise receber do rei Charles III a incumbência formal de formar o governo, Sunak provavelmente já se prepara para enfrentar os pilares do cenário caótico em que o Reino Unido mergulhou nos últimos anos.
Com uma instabilidade política que derrubou quatro premiês (David Cameron, Theresa May, Boris Johnson e Liz Truss) desde o fim do governo de coalizão, em 2015, Sunak vai precisar demonstrar habilidade política para unir um partido dividido no que alguns especialistas consideram facções sectárias, que começaram a se separar com o Brexit.
Apesar de estar relacionado à ala mais à direita do partido, Sunak não se encaixa totalmente em nenhuma das facções sectárias. O novo premiê se posicionou a favor do Brexit, por exemplo, mas ]se opôs aos cortes de impostos propostos por Truss, alertando que a medida provocaria caos no mercado.
Para Entender
Ele também moderou posições na tentativa de abrir diálogo e conquistar apoios em setores de centro e mais liberais do partido. Em um gesto que pareceu destinado à união do partido, Sunak iniciou seu discurso de com uma reverência a sua antecessora, Liz Truss “por sua dedicação ao serviço público”.
“Ela liderou com dignidade e graça, em um tempo de grandes mudanças e sob circunstâncias excepcionalmente difíceis, internamente e no estrangeiro”, disse.
Em paralelo à busca pelo equilíbrio político, Sunak precisará recuperar a confiança do mercado na economia britânica A formação econômica, e atuação no mercado de investimentos e a experiência como secretário de Finanças, com um trabalho elogiado durante a pandemia da covid-19, foram alguns dos fatores que credenciaram Sunak como uma preferência entre os parlamentares conservadores.
Quando em campanha contra Liz Truss pela liderança do partido, Sunak descreveu os planos da rival como um “conto de fadas”. Derrotado, ele se manteve calado enquanto suas previsões econômicas se desenrolam, com a queda da libra, a disparada no custo de empréstimos do governo e danos ao mercado hipotecário, que precisou de intervenção do banco central.
Agora, ele terá que provar que, mais do que prever, ele tem a fórmula para fazer a economia britânica contornar os efeitos do Brexit e retomar o crescimento./ NYT e AFP
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