Rússia ameaça com ‘consequências graves’ se mísseis dos EUA forem enviados à Ucrânia

Moscou alertou que colaboração americana transformaria o país em uma parte ativa da guerra aos olhos do Kremlin e prometeu uma ‘resposta à altura’

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Por Redação

A Rússia alertou nesta quinta-feira, 15, que se os Estados Unidos confirmarem o envio do sofisticado sistema de mísseis de defesa aérea Patriot à Ucrânia seria “outro movimento provocativo dos EUA” e poderia levar a uma resposta de Moscou.

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A porta-voz do ministério das Relações Exteriores do país, Maria Zakharova, disse que “os EUA vão se tornar efetivamente uma parte” na guerra na Ucrânia e estarão sujeitos à “respostas à altura”. O alerta veio após relatos de que os EUA fornecerão a Kiev mísseis terra-ar Patriot, os mais avançados que o Ocidente já forneceu para ajudar os militares da Ucrânia a repelir ataques aéreos russos.

Zakharova acrescentou que quantidades crescentes de assistência militar dos EUA, incluindo a transferência de tais armas sofisticadas, “significariam um envolvimento ainda mais amplo de militares nas hostilidades e poderiam acarretar possíveis consequências”. Ela não especificou quais seriam as consequências, mas o presidente Vladimir Putin falou na quarta-feira sobre “ataques preventivos” como os dados pelos EUA em outros conflitos.

Veículos blindados russos são carregados em plataformas ferroviárias em uma estação não muito longe da fronteira com a Ucrânia, em fevereiro de 2022. Foto: AP - 23/02/2022

Autoridades dos EUA disseram na terça-feira que Washington estava prestes a aprovar o envio de uma bateria de mísseis Patriot para a Ucrânia, atendendo um pedido urgente de líderes ucranianos desesperados por armas mais robustas para derrubar mísseis russos que prejudicaram grande parte da infraestrutura vital do país. O anúncio oficial está previsto para a semana que vem.

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O sistema de mísseis antiaéreo Patriot pode precisar de até 90 soldados para operá-lo e mantê-lo, e por meses os EUA relutaram em fornecer o sistema complexo porque enviar militares para a Ucrânia para utilizá-lo é algo que não pode ser feito pelo governo do presidente Joe Biden - seria um envolvimento direto na guerra e poderia justificar para ataques russos até a países da Otan.

No entanto, permanecem as preocupações de que, mesmo sem a presença de militares dos EUA para treinar os ucranianos sobre como usar o sistema, a implementação dos mísseis poderia provocar a Rússia ou arriscar que um projétil disparado acabe atingindo o interior da Rússia, aumentando ainda mais o conflito.

Mesmo antes de surgirem relatórios sobre a entrega dos sistemas Patriot, Dmitri Medvedev, vice-chefe do Conselho de Segurança da Rússia, abaixo apenas de Putin, alertou que se os mísseis Patriots entrarem na Ucrânia “junto com o pessoal da Otan, eles se tornarão imediatamente um alvo legítimo para nossas Forças Armadas”.

Questionado na quarta-feira se Moscou apóia essa ameaça, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, respondeu que sim, mas acrescentou em uma teleconferência com repórteres que se absteria de fazer comentários mais detalhados até que os EUA anunciem oficialmente a entrega do Patriot à Ucrânia.

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Os líderes da Casa Branca e do Pentágono disseram que fornecer à Ucrânia defesas aéreas adicionais é uma prioridade, e os mísseis Patriot estão sendo considerados há algum tempo. Autoridades disseram que, à medida que o inverno se aproximava e o bombardeio russo de infraestrutura civil aumentava, essa consideração ganhava maior prioridade.

Militares ucranianos ficam ao lado de um veículo blindado destruído na vila libertada de Petropavlivka, perto de Kupiansk, região de Kharkiv. Foto: Sergey Bobok/ AFP - 15/12/2022

Ofensiva russa contra Kiev

Apesar da aparente ajuda iminente dos americanos, comandantes militares ucranianos têm expressado cada vez mais preocupação com uma nova ofensiva em larga escala da Rússia contra Kiev e territórios recuperados durante a contraofensiva iniciada em meados de setembro.

Em entrevista à revista britânica The Economist, o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, e os generais Valeri Zaluzhni, comandante das Forças Armadas ucranianas, e o Oleksandr Sirski, comandante do Exército, disseram-se convencidos de que a Rússia está preparando outra grande ofensiva para começar já em janeiro, e que todas as movimentações ucranianas neste período que antecede a nova incursão russa será fundamental para definir o futuro da guerra.

“Assim como na [2ª. Guerra]… em algum lugar além dos Urais, eles estão preparando novos recursos”, disse Zaluzhni, referindo-se à decisão soviética de mover a indústria de defesa para o leste, além do alcance dos bombardeiros nazistas. “Eles estão 100% sendo preparados.” Um grande ataque russo pode ocorrer “em fevereiro, na melhor das hipóteses em março e na pior no final de janeiro”, acrescentou, antes de advertir que a nova ofensiva pode chegar a qualquer: do Donbass a Dnipro, ou mesmo em Kiev.

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Não tenho dúvidas de que eles farão outra tentativa em Kiev.

Valeri Zaluzhni, comandante das Forças Armadas ucranianas, em entrevista a 'The Economist'

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Na avaliação dos principais responsáveis pela defesa ucraniana, a maior ameaça russa no momento é a capacidade de mobilização militar do Kremlin, que recentemente convocou 300 mil reservistas para combaterem na linha de frente na Ucrânia. “Um czar diz para eles irem para a guerra, e eles vão para a guerra”, afirmou Zaluzhni.

“O inimigo não deve ser descartado. Eles não são fracos… e têm um potencial muito grande em termos de contingente”, disse Sirski, apontando que recrutas russos, mesmo com as alegações de que não teriam tido um treinamento militar completo e equipados apenas com armas pequenas, retardaram com sucesso ataques ucranianos em Kreminna e Svatove, na província de Luhansk.

Outras preocupações imediatas dos comandantes militares ucranianos são os novos exercícios militares em Belarus ― trampolim estratégico de Moscou para o norte da Ucrânia no começo da guerra ― e os combates atualmente em curso na região do Donbass, principalmente na cidade de Bakhmut, onde uma mobilização de tropas regulares russas e outras provenientes da Chechênia e do grupo mercenário Wagner ― os últimos, muitas vezes melhor equipados que os militares ― estão em atividade.

Ataque à Infraestrutura

O fornecedor de eletricidade da Ucrânia disse na quinta-feira que o sistema de energia do país estava sofrendo um “déficit significativo de eletricidade” e que desligamentos de emergência foram aplicados em algumas áreas do país, pois as temperaturas giram em torno ou abaixo de zero.

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A operadora de rede estatal Ukrenergo alertou em um comunicado no Facebook que os danos causados à infraestrutura de energia por ataques russos estão sendo agravados por condições climáticas adversas, incluindo neve, gelo e ventos fortes.

Prevê-se que as temperaturas máximas na capital Kiev mal ultrapassem o ponto de congelamento no fim de semana, com clima ainda mais frio esperado no início da próxima semana.

Bombardeios frequentes da Rússia tem mirado cada vez mais alvos de infraestrutura energética na Ucrânia. Foto: Mykola Tys/ EFE

Kirilo Timoshenko, vice-chefe do gabinete do presidente ucraniano, escreveu no Telegram que a cidade de Kherson, no sul da Ucrânia, ficou completamente sem energia após o bombardeio russo na quinta-feira, acrescentando que duas pessoas foram mortas nos ataques.

Na entrevista à The Economist, os comandantes militares ucranianos também relataram temer pelos efeitos dos bombardeios à infraestrutura energética na moral da tropa, que poderia perder o foco dos combates por preocupação com a situação de seus familiares.

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“Parece-me que estamos no limite”, advertiu o general Zaluzhni. “É aí que as esposas e filhos dos soldados começam a congelar. Que tipo de moral os combatentes estarão?”.

O chefe da província de Donetsk, no leste da Ucrânia, Pavlo Kirilenko, informou na quinta-feira que os ataques russos no dia anterior mataram dois civis e feriram sete.

Autoridades apoiadas pelo Kremlin na região, que foi anexada ilegalmente por Moscou em setembro, anunciaram que a Rússia assumiu o controle de 80% da cidade de Marinka, vista como crítica para as esperanças ucranianas de retomar a capital regional, Donetsk.

Denis Pushilin, o chefe regional interino instalado em Moscou, disse à TV estatal russa que “os combates estão acontecendo em prédios altos”./AP e The Economist

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