A Rússia pretende assumir o “controle total” do sul da Ucrânia, disse um alto comandante militar russo nesta sexta-feira, 22, embora não tenha ficado imediatamente claro se o anúncio surpresa representa uma mudança da política oficial nos objetivos declarados do Kremlin para a guerra.
O comandante, general Rustam Minnekayev, disse em uma reunião da indústria de defesa que a Rússia estava tentando ganhar o controle de uma faixa de território que se estende até a Moldávia, vizinho ao sul da Ucrânia. Isso cortaria o acesso da Ucrânia ao Mar Negro, disse o general Minnekayev, de acordo com agências de notícias russas, permitindo que a Rússia “influencie elementos críticos da economia ucraniana” e ganhe “mais um ponto de acesso” ao enclave moldavo pró-russo da Transnístria.
Essas são metas muito mais ambiciosas do que as estabelecidas pelo presidente Vladimir Putin nas últimas semanas, que se concentraram em ganhar o controle da região de Donbas, no leste da Ucrânia. E também não parecem ser realistas, pelo menos por enquanto, já que os observadores militares questionam se a Rússia tem tropas e equipamentos suficientes para vencer a batalha pelo Donbas – muito menos pelo sul da Ucrânia, que abriga Odessa, uma cidade fortificada com 1 milhão de habitantes.
“Quero lembrá-los de que muitos planos do Kremlin foram destruídos por nosso Exército e povo”, escreveu Andri Yermak, chefe de gabinete do presidente da Ucrânia, nas redes sociais em resposta aos comentários do general Minnekayev.
Não ficou claro se a declaração do general refletia os planos de Putin para a guerra - ou se pretendia distrair ou confundir a Ucrânia à medida que os combates no Donbas se intensificam. Quando questionado em uma teleconferência com repórteres se o general Minnekayev havia divulgado objetivos de guerra russos mais amplos do que o anunciado anteriormente, Dimitri Peskov, porta-voz do Kremlin, se recusou a comentar.
Em seus comentários na sexta-feira, o general Minnekayev disse que uma segunda fase da guerra havia começado dois dias antes. “Um dos objetivos dessa fase é assumir o controle total do Donbas e do sul da Ucrânia”, disse. Ele afirmou ainda que isso permitiria à Rússia controlar os portos ucranianos do Mar Negro por meio dos quais produtos agrícolas e metalúrgicos são entregues a outros países, explicou.
O comandante também emitiu uma advertência velada à Moldávia. Um regimento russo já está estacionado na Transnístria. “O controle sobre o sul da Ucrânia é outra conexão com a Transnístria, onde também há evidências de opressão da população de língua russa”, disse o general Minnekayev.
‘Objetivos inalcançáveis’
Yuri Fyodorov, analista militar russo, disse que os objetivos mais amplos detalhados pelo general Minnekayev “do ponto de vista militar são inalcançáveis”.
“Todas as unidades russas prontas para o combate estão agora concentradas no Donbas, onde a Rússia não conseguiu avanços significativos nos últimos cinco dias”, disse Fyodorov em entrevista. A posição do general Minnekayev geralmente não permite que ele faça declarações políticas tão abrangentes que também contradizem o que foi dito pelos principais políticos do país, acrescentou Fyodorov.
“Isso pode sinalizar uma divergência de posições, talvez significativa, entre os altos escalões militares e a elite política”, disse ele.
Desde o início da guerra na Ucrânia, Putin tem usado falsas alegações de “genocídio” contra falantes de russo na parte leste do país como justificativa para a invasão.
Na quinta-feira, a Rússia afirmou ter assumido o controle de Mariupol, uma cidade portuária no Mar de Azov. Foi o último bolsão de resistência séria na “ponte de terra” que o Kremlin criou entre o território que já detém na região de Donbas, a leste, e a Península da Crimeia, ao sul, que a Rússia anexou em 2014.
O que é conhecido como sul da Ucrânia fica além da Crimeia, ao sul e oeste da península, e inclui as regiões de Odesa, Kherson e Mykolaiv. A Rússia afirma ter controle total de Kherson, mas suas tentativas de avançar para as áreas ao redor de Mykolaiv em março foram repelidas pelas forças ucranianas./NYT
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.