VLADIVOSTOK, RÚSSIA - Do Porto de Vladivostok, no Pacífico, e de um campo de treinamento na Sibéria, a uma distância de 1,5 mil km, China e Rússia enviaram uma mensagem para Washington na semana passada: sob pressão americana, esses rivais históricos estão se aliando.
Em Vladivostok, o presidente Vladimir Putin recebeu o presidente Xi Jinping como seu convidado principal em uma conferência anual no Extremo Oriente da Rússia. Na Sibéria, mais de 3 mil soldados chineses se uniram a seus russos para exercícios militares em que drones, paraquedistas, artilharia e caças encenaram uma batalha simulada.
Dois países que por muito tempo se consideravam adversários militares hoje fazem uma parceria para confrontar os EUA. “Ambos tentam mostrar que, se os EUA pressionarem demais, se aproximarão ainda mais um do outro”, disse Alexander Gabuev, diretor do Programa Ásia-Pacífico do Carnegie Moscow Center.
Washington vem travando uma guerra comercial com a China e impondo cada vez mais sanções contra a Rússia. O governo Trump reformulou a estratégia de segurança nacional dos EUA, anunciando uma “grande disputa de poder” com Rússia e China, alegando que ambos os países vêm procurando “criar um mundo antiético, segundo os valores e interesses americanos”.
As crescentes tensões com Washington valorizaram ainda mais, aos olhos de Pequim, a tecnologia e experiência militares da Rússia, afirmam analistas. Por outro lado, para Putin, as sanções ocidentais contra a Rússia tornam a força econômica da China mais atrativa. “Os chineses estão enviando um sinal claro de que não consideram a Rússia uma ameaça, o que já deveria ser motivo de preocupação para os EUA”, afirmou Michael Kofman, pesquisador na CNA, organização financiada pelo governo federal.
É a primeira vez que a China se une aos exercícios conjuntos anuais da Rússia, atividade que normalmente é reservada para aliados próximos de Moscou.
O vínculo militar mais estreito entre Moscou e Pequim dá à China um acesso valioso à tecnologia militar russa e à experiência de campo da Rússia na Síria e na Ucrânia.
Nos últimos anos, os russos começaram a vender armas avançadas para a China, como o seu sistema de mísseis terra-ar S-400 e caças de quarta geração Su-35. No passado, essas vendas eram dificultadas pelas preocupações de Moscou com a possibilidade de a China, que considerava um potencial adversário, roubar sua tecnologia. Em meio ao conflito com o Ocidente, tais preocupações dissiparam. A Rússia pode fornecer energia para seu vizinho, ao passo que a China ofereceria seu know-how em e-commerce, opinam os analistas.
A gigante chinesa Alibaba anunciou, na semana passada, que fará uma parceria com um famoso oligarca russo.
“Esse foi um ano notável para as relações entre Rússia e China”, escreveu um colunista do People’s Daily (Diário do Povo), observando que Putin acabara de visitar Pequim e Xi havia concedido sua primeira “medalha da amizade” ao líder russo.
Kofman observou que China e Rússia poderão atuar juntas contra os EUA num acordo que não precisa ser necessariamente uma aliança formal escrita. “Durante toda a história, as grandes potências se aliaram contra ameaças comuns por necessidade, e não forçosamente porque compartilham valores e objetivos”, disse. / W. POST
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