NOVA YORK - Um co-réu do caso que ficou conhecido nos Estados Unidos como os Cinco do Central Park foi absolvido pela Justiça americana na segunda-feira, 25, 33 anos após sua condenação. Steven Lopez foi preso junto com outros cinco jovens negros e hispânicos, condenados por agredir e estuprar a corredora Trisha Meili em 1989 e que comprovaram sua inocência mais de uma década após o julgamento do crime. O caso ganhou repercussão internacional devido ao uso de declarações falsas, confissões sob coerção e provas forjadas para condenação dos jovens.
Na época, Steven Lopez conseguiu um acordo com promotores para diminuir a pena se ele se declarasse culpado por roubar um corredor no parque naquela mesma noite. Steven foi preso aos 15 anos, cumpriu três anos na prisão e hoje, aos 48, teve a condenação anulada.
O promotor distrital de Manhattan, Alvin Bragg, disse a um juiz na segunda-feira que a revisão do caso descobriu que Lopez havia se declarado culpado involuntariamente “em face de declarações falsas” e sob “imensa pressão externa”.
Em 19 de abril de 1989, a corredora e investidora bancária Trisha Meili foi agredida e estuprada no Central Park, ponto turístico e histórico da cidade de Nova York. A jovem de 28 anos ficou em coma por 12 dias seguidos, um crime que chocou a população americana, ganhando grande destaque na mídia.
Seis adolescentes negros e hispânicos, entre 14 e 16 anos, foram presos naquela noite e condenados pelo crime — cinco deles por envolvimento direto. Steven Lopez se recusou a assumir a culpa por estuprar Meili, concordando com o acordo proposto pela promotoria.
Como seus pares, Lopez foi para a prisão; coletivamente, o grupo serviu cerca de 45 anos. Logo depois que o verdadeiro agressor do estupro no Central Park foi identificado em 2002, as autoridades anularam as condenações de estupro contra os cinco homens. Eles fizeram um acordo de US$ 41 milhões com a cidade de Nova York e se tornaram temas de filmes, livros e programas de televisão. O caso se tornou internacionalmente conhecido como Os Cinco do Central Park.
Lopez, no entanto, foi esquecido nos julgamentos de anulação, não ganhou a mesma relevância midiática ou sequer recebeu parte do acordo com a cidade de Nova York. Também não está claro se Steven manteve contato com os cincos: Korey Wise, Kevin Richardson, Raymond Santana, Antron McCray e Yusef Salaam.
“Falamos sobre os Cinco do Central Park, os Cinco Exonerados, mas havia seis pessoas nessa acusação”, disse Bragg. “E os outros cinco que foram acusados, tiveram suas acusações anuladas. Agora é hora de ter a acusação de Lopez retirada.”
Confissão assinada
Steven Lopez foi mantido em uma cela pela polícia por cerca de 20 horas antes de ser interrogado. Seus pais, que não eram falantes nativos de inglês, estavam presentes, mas nenhum tradutor foi fornecido. Após quase duas horas e meia de interrogatório, um detetive escreveu uma declaração que Lopez e seu pai assinaram.
A declaração colocou Lopez no local do ataque, relacionando o jovem ao roubo e agressão de um corredor masculino. Mas, apesar do questionamento agressivo, Lopez se recusou a dizer que esteve envolvido no ataque a Meili.
Enquanto os outros adolescentes, questionados sob coação, disseram que Lopez havia cometido crimes contra o corredor masculino e a Trisha, não havia evidências forenses que o ligassem aos ataques. Meili foi severamente espancada e deixada para morrer. Os detalhes do crime horrorizaram a cidade de Nova York e inflamaram as tensões raciais. A prisão de Lopez e dos outros cinco jovens, todos negros ou hispânicos, foram tratados como sintomas de uma cidade caindo no caos do crime.
O homem esquecido
Até segunda-feira, Steven Lopez tinha sido um elemento esquecido em sua própria história. Ele não apareceu no documentário de 2012, feito por Ken Burns sobre o caso, e nenhum ator o interpretou no drama seriado Olhos que Condenam, dirigido por Ava DuVernay e lançado pela Netflix em 2019.
A história de Lopez foi ignorada, em parte porque ele se declarou culpado, cumpriu mais de três anos de sua sentença e não recorreu de sua condenação. Em vez disso, quase 20 anos após a absolvição de seus co-réus, Steven Lopez discretamente apareceu no gabinete do promotor distrital de Manhattan em fevereiro de 2021, pedindo que sua condenação fosse revogada. No mês seguinte, o gabinete concordou e iniciou a análise do caso.
Alvin Bragg, que em janeiro se tornou o primeiro promotor distrital negro de Manhattan, tinha 15 anos e morava no Harlem quando o caso do Central Park começou a ganhar manchetes. Ele recorda que sentiu empatia facilmente com as experiências dos jovens exonerados, relatando como brincava de basquete e andava de ônibus no mesmo parque onde os eventos que levaram a prisão aconteceram.
Bragg também era amigo de Ken Thompson, o primeiro homem negro a ser promotor distrital do Brooklyn, morto em 2016. Thompson era conhecido por trabalhar em uma unidade que investigava condenações questionáveis, deixando um legado que inspira Alvin até hoje. “Sou humildemente grato por estar em uma posição de replicar este trabalho”, disse.
O promotor de Manhattan enfatiza que, em tempos de preocupação pública com a segurança – como foi o caso em 1989 e como é o caso novamente hoje – exonerações como a de Lopez podem ajudar a restaurar a fé na função do sistema legal./NYT e AP
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