Como os superávits comerciais enfraquecem Rússia e China; leia a análise de Paul Krugman

Rússia e China administram superávits comerciais, mas excedentes não significam sinais de força

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Por Paul Krugman (The New York Times)
Atualização:


De acordo com uma nova pesquisa NBC News, os eleitores americanos agora consideram “ameaças à democracia” o problema mais importante que seu país enfrenta, o que é tanto perturbador quanto um sinal bem-vindo de que as pessoas andam mais atentas. Também vale notar que não se trata apenas de um problema dos Estados Unidos. A democracia está se erodindo em todo o mundo; de acordo com a mais recente pesquisa da Economist Intelligence Unit, existem hoje 59 regimes totalmente autoritários por aí, abrigando 37% da população mundial.

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Desses 59 regimes, porém, apenas dois – China e Rússia – são poderosos o suficiente para representar desafios maiores para a ordem internacional.

As duas nações são, evidentemente, muito diferentes. A China é uma superpotência autêntica, cuja economia superou, segundo algumas medidas, a dos EUA. A Rússia é uma potência menor em termos econômicos, e os eventos ocorridos desde 24 de fevereiro sugerem que suas forças militares eram e são menos poderosas do que a maioria dos observadores imaginava. Mas os russos possuem armas nucleares.

Uma coisa que China e Rússia têm em comum, contudo, é que ambos os países administram atualmente enormes superávits comerciais. Esses excedentes são sinais de força? São provas de que autocracias funcionam?

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Presidente da Rússia, Vladimir Putin, ao lado do presidente da China, Xi Jinping, em reunião no dia 4 de fevereiro deste ano Foto: Alexei Druzhinin/AP

Não, em ambos os casos, os superávits são sinais de fraqueza. E a atual situação oferece um corretivo útil à noção comum – defendida, entre outros, por Donald Trump – de que um país que vende mais do que compra é, de certa maneira, “vencedor”.

Comecemos com a Rússia, cujo excedente comercial inflou desde que Vladimir Putin invadiu a Ucrânia. O que será que aconteceu? A resposta é que isso resulta, em grande medida, das sanções econômicas do Ocidente, que têm sido surpreendentemente eficazes – apesar de que não da maneira que muitos esperaram.

Quando a invasão começou, houve chamados generalizados por embargos sobre as exportações russas de petróleo e gás natural. Na realidade, porém, a Rússia conseguiu facilmente manter suas exportações de petróleo; o país está vendendo o insumo com desconto, mas os preços globais elevados resultam em bastante dinheiro ainda entrando. E ainda que tenha havido uma acentuada queda nas exportações russas de gás natural para a Europa, isso é reflexo dos esforços do regime de Putin de colocar pressão sobre o Ocidente, não o contrário.

As sanções, por sua vez, minaram a capacidade da Rússia importar, especialmente sua capacidade de comprar produtos cruciais para a indústria. Um exemplo do problema: relatórios indicam que as companhias aéreas russas estão desativando alguns de seus aviões para desmontá-los e usar suas peças para reposição, pois não conseguem mais comprá-las no exterior.

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Portanto, o superávit comercial da Rússia é, na realidade, má notícia para Putin, um sinal de que seu país enfrenta problemas para conseguir usar o dinheiro que tem para comprar as mercadorias que necessita para manter seu esforço de guerra.

O problema da China é diferente: Seu superávit comercial é resultado de problemas internos antigos que podem, finalmente, estar tomando a frente.

Observadores externos notam há muito que uma parte pequena demais da receita nacional da China chega ao público, tanto que o gasto da população em consumo tem permanecido baixo apesar do rápido crescimento econômico. Em vez disso, a nação tem mantido aproximadamente o pleno-emprego canalizando crédito barato para um investimento cada vez mais improdutivo, principalmente um mercado imobiliário habitacional inflado, sustentado pela sempre crescente dívida privada.

A China tem conseguido manter esse jogo, insustentável em última instância, por um tempo notavelmente longo. Neste momento, contudo, o mercado imobiliário habitacional chinês parece estar ruindo, e a demanda dos consumidores parece estar despencando. Esse fenômeno diminui o fluxo de importações do país – o que faz o superávit comercial aumentar. Repito, um excedente pode ser sinal de alguma fraqueza, em vez de força.

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Outros dois pontos em relação à China: Primeiro, sua economia também está sofrendo com a recusa do governo em revisar sua fracassada estratégia em relação à covid, dependendo de vacinas produzidas domesticamente, relativamente pouco eficazes, e impondo lockdowns draconianos para conter a pandemia. Segundo, sob as atuais condições, a fraca demanda chinesa é, não intencionalmente, um trunfo para o restante do mundo.

Dez anos atrás, a economia mundial sofria de uma demanda inadequada, e os superávits comerciais da China pioraram o problema ao sugar o poder de compra do restante do planeta. Hoje, porém, a economia mundial sofre de uma oferta inadequada, o que ocasionou inflação em muitos países. Nesse contexto, a fraqueza chinesa é na realidade boa para todos os demais: A demanda chinesa em queda está colocando um limite sobre os preços do petróleo e de outras commodities, reduzindo a pressão inflacionária global.

Então o que podemos aprender dos ditadores e seus superávits comerciais?

Conforme afirmei, estamos diante de uma prova de que exportar mais do que importar não significa que você está vencendo: De maneiras distintas, os superávits comerciais tanto da Rússia quanto da China representam fracassos, não sucessos.

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Em um nível mais amplo, estamos testemunhando o problema peculiar das ditaduras, nas quais ninguém pode dizer ao líder que ele está errado. Putin parece ter invadido a Ucrânia em parte porque todos estavam assustados demais para alertá-lo a respeito das limitações do poderio militar russo; e a resposta da China contra a covid passou de modelo exemplar a alerta provavelmente porque ninguém ousa dizer a Xi Jinping que políticas com a sua assinatura não estão funcionando.

Portanto, a autocracia pode estar em marcha — mas não porque funciona melhor que a democracia. A autocracia não funciona melhor. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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