O Sudão vive desde sábado um cenário de caos quando forças lideradas por dois generais rivais — que foram aliados no golpe de Estado de 2021, mas se tornaram inimigos depois — travaram um violento combate pelo controle do país. Na capital, Cartum, explosões e trocas de tiros deixaram 97 civis mortos e mais de 600 feridos.
A escalada da violência vista no fim de semana destruiu as esperanças dos sudaneses de que os militares pudessem ceder o poder a um governo liderado por civis após terem interrompido o processo de transição democrática em 2019.
A brutal disputa entre os generais Abdel-Fattah Burhan e Mohammed Hamdan Dagalo, conhecido como Hemedti, iniciada no sábado acontece quatro anos depois dos protestos no Sudão terem derrubado o ditador Omar al-Bashir, que comandou o país por três décadas, impulsionando movimentos similares em outras partes da África e do mundo árabe.
Qual o atual cenário político no Sudão?
Desde outubro de 2021, quando os militares tomaram o poder durante o processo de transição democrática que teve início em 2019 — após o ditador Omar al-Bashid ser derrubado —, o país é governado pelo general Abdel-Fattah Burhan e Mohammed Hamdan Dagalo (Hemedti), chefe do grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (FAR), era tido como seu número dois no comando.
Quem são os generais que disputam o controle do país?
O confronto é protagonizado por Burhan, que controla o Exército sudanês, e Hemedti, que lidera as forças paramilitares FAR. Eles se tornaram inimigos públicos nos últimos meses, mas estiveram lado a lado durante o golpe que depôs o primeiro-ministro civil Abdallah Hamdok em 2021.
Por que o Sudão é importante?
Terceiro maior país de África em extensão territorial — mas um dos mais pobres do mundo —, o Sudão fica localizado em um estratégico ponto no Nordeste da África e se tornou um importante ator de disputa na disputa por influência na região entre a Rússia e as potências ocidentais.
Nos últimos anos, o Sudão, membro da Liga Árabe, tornou-se um importante ator de disputa na batalha entre a Rússia e as potências ocidentais, particularmente os Estados Unidos, por influência na região.
O grupo paramilitar Wagner — força auxiliar do Exército russo na guerra na Ucrânia — já enviou tropas para o Sudão em apoio ao governo militar, além de comandar uma importância concessão de exploração de minas de ouro. O país ainda foi alvo de pressão do Kremlin para que os navios de guerra russos pudessem atracar nos portos da costa do Mar Vermelho do país.
O secretário de Estado americano Antony Blinken reagiu aos combates de sábado no Twitter afirmando que estava “profundamente preocupado” com a violência no Sudão. Blinken apelou para ambos os lados para que “cessarem imediatamente” as hostilidades e evitarem novas escaladas.
A disputa entre Burhan e Hemedti representou um duro golpe aos americanos e entidades internacionais como as Nações Unidas, União Africana e Liga Árabe, que na última semana tentaram evitar a eclosão dos confrontos. Autoridades militares dos EUA vinham pressionando o governo sudanês a retomar o processo democrático no país 18 meses depois dos generais terem tomado o poder após a queda do regime ditatorial em 2019.
Quem é Abdel-Fattah Burhan, o chefe militar do Sudão?
O general Abdel-Fattah Burhan é um comandante militar poderoso que tem sido, durante anos, líder de facto do Sudão. Ele lidera uma das duas principais facções rivais que lutam agora pelo controle do país.
Pouco conhecido antes de 2019, Burhan subiu ao poder no rescaldo do tumultuoso golpe militar que derrubou o ditador Omar al-Bashir, líder autoritário que foi deposto depois de três décadas após uma onda de protestos tomar o país naquele ano.
Nas Forças Armadas, Burhan também serviu como comandante do Exército em Darfur, no Sudão ocidental, quando 300 mil pessoas morreram e milhões foram obrigadas a se deslocarem durante os combates entre 2003 e 2008, que foram alvo de rechaço da comunidade internacional pelas violações aos direitos humanos.
Saiba mais sobre o conflito no Sudão
No passado, Burhan manteve laços estreitos com al-Bashir, mas quando o autocrata foi deposto, o seu ministro da Defesa, o tenente-general Awad Mohamed Ahmed Ibn Auf, assumiu o controle do país, forçando os manifestantes a exigirem a sua demissão.
Burhan ascendeu ao poder para substitui-lo, tornando-se o líder mais poderoso do país durante a transição política. Enquanto as nações ocidentais esperavam que o Sudão avançasse em direção à democracia, Burhan foi aumentando progressivamente o seu domínio.
Depois de civis e militares terem assinado um acordo de partilha do poder em 2019, Burhan tornou-se presidente do Conselho de Soberania, um órgão criado para supervisionar a transição do país para um regime democrático.
Contudo, à medida em que a data para a entrega do controle aos civis se aproximava, no final de 2021, Burhan relutou em passar o poder. Em 25 de outubro de 2021, o general deu um golpe no governo civil e depôs o então ex-primeiro ministro, Abdallah Hamdok.
Quem é Mohammed Hamdan Dagalo, o Hemedti?
Burhan lutou pelo controle do Sudão ao lado do tenente-general Mohammed Hamdan Dagalo, que lidera as Forças de Apoio Rápido (FAR) do país, um poderoso grupo paramilitar.
De origem humilde, Dagalo, amplamente conhecido como Hemedti, ganhou notoriedade após ascender ao comando das milícias janjawid, responsáveis pelas piores atrocidades registradas no conflito em Darfur. O seu sucesso em acabar com a revolta na região fez com que al-Bashit o retribuísse com a nomeação a chefe das recém-criadas FAR.
Em outubro de 2021, Burhan e Hemedti se uniram para tomar o poder num golpe, que os transformaram em líder e sub-líder do Sudão. No entanto, nos últimos meses, as rusgas entre eles tornaram-se públicas e ambos começaram a destacar silenciosamente tropas e equipamentos para bases militares em Cartum e ao redor do país.
Os EUA e outras nações estrangeiras conduziram os esforços para persuadir os dois generais a transferirem o poder para um governo liderado por civis. Em vez disso, agora eles estão em confronto violento.
Dagalo culpou Burhan pela violência que agora envolve o Sudão. “Lamentamos em estarmos combatendo nossos compatriotas, mas foi este criminoso que nos obrigou a fazer isso”, disse à al-Jazeera em entrevista.
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