Numa das cidades com o maior poder aquisitivo do mundo, a cena não é rara: carros de luxo em plena avenida principal de Genebra num dia qualquer. Mas dessa vez, os carros estavam sobre um caminhão após serem confiscados pela Justiça. No total, o Ministério Público de Genebra apreendeu 11 carros pertencentes ao vice-presidente da Guiné Equatorial, Teodorin Obiang, filho do ditador local.
O confisco ocorreu na segunda-feira, revelando mais um escândalo com o país africano de 720 mil habitantes e com um dos piores índices mundiais de desenvolvimento social. Sua elite, que chegou a pagar por um samba enredo no carnaval do Rio de Janeiro, não passa fome.
Entre os carros confiscados estava um Porsche 918 Spyder, avaliado em mais de € 750 mil. Por € 2 milhões, um Bugatti Veyron também estava na lista, além de um dos sete exemplares de um Koenigsegg One.
O vice-presidente africano tentou embarcar os carros de luxo depois que o MP local iniciou um processo contra ele por suspeita de corrupção. Temendo o confisco, seu objetivo era despachar sua fortuna em um avião de carga alugado às pressas. No entanto, foi impedido pela polícia.
Há cinco anos, Teodorin já havia sido alvo de um confisco de outros 18 carros de luxo que ele mantinha em Paris. Na França, ele responde a um processo por “corrupção e desvio de dinheiro público” e procuradores estimam que o crime chegaria a € 200 milhões, apenas na França. Nos EUA, a Justiça também lacrou sua mansão em Malibu. Na garagem, havia maiis 28 carros.
A família então optou por intensificar sua relação com a Suíça. Segundo a revista local L’Hebdo, o avião privado de seu pai pousou 11 vezes em Genebra entre janeiro de 2015 e março deste ano. No total, o avião do filho permaneceu na cidade suíça por 69 dias em apenas um ano.
Os bancos suíços também continuavam a lhe oferecer crédito e pagar suas contas. Mas, desde o mês passado, suas contas em Genebra foram bloqueadas.
No ano passado, a escola de samba Beija-Flor homenageou a Guiné Equatorial em seu samba enredo. Meios de comunicação como a BBC, The Wall Street Journal e outros europeus indicaram como a escola de samba teria sido financiada pelo ditador Teodoro Obiang, algo negado pela direção da Beija-Flor e pelo embaixador da Guiné.
Sites mantidos pela oposição ao regime africano, como o Rombe, revelaram como a comitiva da Guiné viveu no luxo no Brasil durante a festa no Rio. Mas a imprensa do país africano, toda controlada pelo regime, não mencionou nem mesmo que o samba enredo que homenageava a Guiné saiu vencedora entre as escolas de 2015.
Teodor Obiang, o pai do vice-presidente, chegou ao poder em 1979, em um sangrento golpe de Estado no qual tirou da presidência seu próprio tio. Hoje, ele é o presidente africano há mais tempo no poder, superando até mesmo Robert Mugabe, do Zimbábue, e sem previsão para deixar o cargo.
Com apenas 720 mil moradores, o minúsculo país enriqueceu graças ao descobrimento de petróleo. Mas esse dinheiro jamais chegou à população. Mais de dois terços dos cidadãos vivem com uma renda menor a US$ 1 por dia. Quase 90% das pessoas não têm acesso à internet e a expectativa de vida é de apenas 53 anos, o equivalente ao que existia na Europa há quase 200 anos.
O governo destina 0,6% de seu Produto Interno Bruto (PIB) para a educação e 20% das crianças estão em um estado de desnutrição profundo.
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